Brasil
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Por — São Paulo

Desde os ataques terroristas do Hamas, que mataram cerca de 1200 pessoas e sequestraram mais 250 em Israel, em 7 de outubro, cinco estados brasileiros (Goiás, Rio de Janeiro, Rondônia, Roraima e São Paulo) e duas capitais (a fluminense e a paulista) aderiram à definição de antissemitismo da Aliança Internacional para a Lembrança do Holocausto (IHRA, na sigla em inglês). A organização afirma que “o antissemitismo é uma determinada percepção dos judeus, que se pode exprimir como ódio” e ter como alvo “o Estado de Israel, encarado como coletividade judaica”, com a ressalva de que críticas “semelhantes às dirigidas contra qualquer outro país” não são antissemitas.

A definição já foi adotada por 31 países e não tem força de lei. No entanto, intelectuais judeus e movimentos sociais alegam que ela vem sendo instrumentalizada para calar críticos de Israel, em especial após o início da guerra em Gaza, que já matou mais de 35 mil pessoas. Em abril, mais de 100 organizações internacionais pediram às Nações Unidas para rejeitar a definição da IHRA, que, segundo elas, “tem sido usada erroneamente para rotular críticas a Israel como antissemitas” e “suprimir protestos não violentos, ativismos e discursos críticos a Israel”.

Dos 11 exemplos de antissemitismo listados pela definição, sete mencionam Israel. A IHRA considera antissemitismo associar a política israelense ao nazismo (o presidente Lula comparou os ataques a Gaza ao Holocausto), e afirmar que o “Estado de Israel é um empreendimento racista” (a Anistia Internacional já chamou de “apartheid” a política para os palestinos).

Pesquisador da UFRJ e do Centro de Estudos do Antissemitismo da Universidade de Jerusalém, o historiador Michel Gherman vê “com preocupação a sistematização de uma definição antissemitismo sem discussão aprofundada”. Ele lembra que, no exterior, a adesão à IHRA tem produzido “a criminalização de críticas a Isreal” e atingido inclusive intelectuais judeus.

Um relatório do European Legal Support Center (ELSC), organização em defesa dos palestinos, informou que, entre 2017 e 2022, 53 ativistas pró-Palestina ou críticos de Israel foram acusados de antissemitismo (conforme a definição da IHRA) na Alemanha, na Áustria e no Reino Unido. Segundo a Diaspora Alliance, organização de combate ao antissemitismo, a maioria das pessoas enquadradas na Alemanha são árabes, muçulmanas ou de minorias étnicas — e 25% são judeus. Os casos se concentram sobretudo no setor cultural e incluem demissões e cancelamento de convites.

Para Gherman, o texto da IHRA vincula excessivamente o judaísmo a Israel. A proibição de comparar políticas de Tel Aviv ao nazismo, diz ele, “dá um salvo-coduto à extrema direita israelense, que pode fazer os maiores absurdos sabendo que de nazista não será chamada”.

— Acredito que crítica à soberania nacional judaica é equivocada, mas quem aponta as graves injustiças que estão na formação do Estado de Israel não deve ser tratado como antissemita — diz o autor de “O não judeu judeu: A tentativa de colonização do judaísmo pelo bolsonarismo” (Fósforo”), que se declara sionista. — Uma definição tão larga e tão vinculada a Israel esvazia a noção de antissemitismo.

Gherman apoia a Declaração de Jerusalém, que se propõe como alternativa à da IHRA. O texto afirma que a definição da IHRA “gerou polêmica, enfraquecendo a luta contra o antissemitismo” e que “não é antissemita apontar a discriminação racial sistemática em Israel” nem acusar o país de “colonialismo” ou “apartheid”.

Para a alemã Emily Dische-Becker, da Diaspora Alliance, a IHRA protege Israel de críticas duras ao combinar uma definição “vaga” de antissemitismo com “exemplos muito específicos”.

— A IHRA associa críticas ao deslocamento de populações e à limpeza étnica promovidos por Israel, uma realidade documentada por historiadores palestinos e israelenses, ao antissemitismo. Ou seja: nomear a realidade em termos duros é antissemitismo — diz ela. — A definição está em conflito a liberdade de expressão.

Acadêmicos brasileiros comparam a adesão à IHRA ao projeto Escola Sem Partido, que também não virou lei, mas forçou professores a evitarem certos temas para não serem acusados de doutrinação.

— Mesmo sem caráter punitivo, a adesão à IHRA fomenta o vigilantismo e a autocensura e coíbe a liberdade de expressão. Estudiosos da questão israelo-palestina já tem medo se posicionar politicamente, porque há uma intenção clara de calar críticas a Israel com acusações de antissemitismo — afirma Bruno Huberman, professor de Relações Internacionais na PUC-SP e membro do coletivo Vozes Judaicas por Libertação. — A consequência nefasta disso é que quando o antissemitismo de fato ocorre, ele não é reconhecido. O antissemitismo tem que ser combatido conjuntamente com todas as formas de racismo.

Antissemitismo em alta

No Brasil, os casos de antissemitismo cresceram 913% entre outubro e dezembro de 2023 e 642% entre janeiro e abril deste ano, segundo dados da Confederação Israelita do Brasil (Conib), que lançou uma plataforma de monitoramento. Secretário da Conib, Rony Vainzof defende que a adesão ao texto da IHRA contribui para a “conscientização dos efeitos maléficos no antissemitismo para a sociedade brasileira” e não inibe a liberdade de expressão nem protege Israel.

— Críticas duríssimas são feitas por intelectuais israelenses. Isso nem de longe se confunde com o antissemitismo moderno, que se utiliza do antissionismo para legitimar discursos antijudaicos. O antissemita do século XIX, na Europa, defendia que os judeus voltassem para a sua terra. O antissemita da atualidade, defende que o judeu saia dela ou que ela não deve existir — diz Vainzof, acrescentando que a guerra em Gaza resultou na “exteriorização de um ódio já existente contra os judeus”.

Presidente da StandWithUs Brasil, organização que trabalha pela adoção da IHRA por estados e municípios, André Lajst afirma que “a demonização de Israel é o novo tipo de antissemitismo”.

— A definição da IHRA protege Israel da deslegitimação. Acusar Israel de nazismo é dizer que, assim como aquele regime nefasto, o Estado judeu não tem direiro de existir nem de se defender. Por que Bashar al-Assad e Muammar al-Gaddafi (ditadores da Síria e da Líbia, respectivamente) nunca foram comparados com Hitler? — questiona ele.

Lajst afirma que a StandWithUS trabalha para que mais estados e municípios adotem a definição da IHRA, mas não informa quais, “para que o processo ocorra sem pressão”.

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