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Por — Rio de Janeiro

RESUMO

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GERADO EM: 04/07/2024 - 04:30

Menores na direção: riscos e debates

Menores na direção expõem riscos: morte de criança argentina em corrida de motos e vídeos de filhos de famosos dirigindo levantam debate sobre prática perigosa, infringindo leis de trânsito e comprometendo desenvolvimento dos jovens. Redes sociais também são questionadas quanto à divulgação dessas infrações.

Há duas semanas, o menino argentino Lorenzo Somaschini, de 9 anos, morreu ao sofrer um acidente em um treino livre no Autódromo de Interlagos para uma corrida de motocicletas de 160 cilindradas com participantes entre 8 e 18 anos. Nesta semana, a modelo Andressa Suita, mulher do cantor sertanejo Gusttavo Lima, publicou um vídeo no Instagram em que o filho dos dois, de 7 anos, dirige um automóvel. Outra estrela sertaneja, Simone Mendes também exibiu o filho de 9 anos dirigindo, em outro vídeo nas redes sociais.

A morte de Lorenzo e a exposição dos filhos das duas estrelas musicais chamou a atenção para um perigo frequente a que crianças são expostas por pais que não seguem as leis de trânsito e não avaliam os riscos do que incentivam: deixar menores de idade dirigirem veículos que deveriam ser guiados apenas por adultos. Especialistas ouvidos pelo GLOBO ressaltam que esta introdução prematura compromete o desenvolvimento do menor.

Lorenzo era um dos participantes do campeonato SuperBike Brasil na categoria de 8 a 18 anos, com motocicletas de 160 cilindradas. O filho de Andressa e Gusttavo apareceu no vídeo sem cinto de segurança, assim como o irmão de 5 anos, que pôs a cabeça para fora do teto solar e ficou em pé no assento. No registro, Andressa escreveu “7 ou 18?!”.

Andressa Suita mostrou filho de 7 anos dirigindo carro com irmão ao lado — Foto: Reprodução Instagram
Andressa Suita mostrou filho de 7 anos dirigindo carro com irmão ao lado — Foto: Reprodução Instagram

No vídeo de Simone, o filho dirigiu um carro de pequeno porte no condomínio em que a família mora. A artista ficou na carona e o pai, no banco de trás.

— Graças a Deus o meu filho dirige o carrinho dele — disse a cantora no vídeo. — Estaciona direitinho, aí! Muito bem — mandou em seguida.

Derrapagens com Porsche

A prática é estimulada também por pais que querem projetar os filhos desta maneira. O perfil “felipinhoradical” mostra uma criança de 9 que se define como o “piloto de manobras mais novo do Brasil”. Com mais de 70 mil seguidores, o perfil administrado pelo pai compartilha vídeos em que o garoto aparece sozinho fazendo derrapagens com um Porsche em uma pista automobilística e pilotando uma moto aquática sem mesmo um responsável na garupa.

Vídeo de criança pilotando uma moto aquática em perfil social mantido pelo pai — Foto: Reprodução/Redes sociais
Vídeo de criança pilotando uma moto aquática em perfil social mantido pelo pai — Foto: Reprodução/Redes sociais

Em uma das postagens, o menino exibe a primeira vez em que “dirigiu sozinho”. O vídeo mostra a criança, então com 5 anos, acelerando um carro e pilotando o volante em uma rua à noite, enquanto o responsável está no banco do passageiro.

— Autorizar um menor de idade a conduzir um veículo é crime. O caso deste perfil é diferente do jovem que participava de uma formação esportiva, prevista na legislação, que determina a impossibilidade de treinamento e competições em via pública — alerta o advogado criminalista Rafael Paiva, diferenciando o caso de “felipinhoradical” do de Lorenzo. — Esta é uma irresponsabilidade sem tamanho e que não pode ser banalizada.

Os comentários nas publicações mostram que a prática divide opiniões. Enquanto parte dos internautas alega que o pai do menino é “irresponsável” e deve “ser preso” por deixá-lo dirigir, uma outra parcela do público faz piada com a situação. “Quero dar essa vida para o meu filho”, escreveu um seguidor. “Ele precisa me adotar”, publicou outro.

A psicopedagoga Márcia Tavares aponta que o incentivo à prática e os vídeos expõem a criança a uma experiência que ela ainda não tem condições físicas e emocionais de viver. Márcia avalia que esta atitude dos responsáveis pode causar um dano grave no desenvolvimento do menor, configurando uma antecipação de conquistas e de valores incompatíveis com a idade do filho.

— É comum que crianças tenham desejo de dirigir. Por isso, existe uma construção simbólica com brinquedos ou jogos, por exemplo, antes de se chegar ao real. Ao permitir e incentivar que o filho dirija e ainda poste nas redes, os pais estão ensinando o filho a transgredir regras legais e sociais — reprova.

Para o perito de trânsito Rodrigo Kleinubing, este comportamento “irresponsável e criminoso” traz consequências perigosas “a curto e longo prazo”. Não só para as crianças, mas para todos os impactados pela logística de trânsito, alerta:

— Me pergunto como serão estes motoristas quando crescerem e se tornarem adultos. Elas são treinadas e incentivadas pelos responsáveis ou amigos a perpetuar a impunidade. Estes valores passados principalmente por familiares contribuem para a não obediência às regras de trânsito observadas no país

Papel das redes

A discussão sobre a responsabilização das redes sociais pela divulgação de imagens de infração de trânsito no ambiente virtual vem ocorrendo nos últimos anos. Em 2022, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) esvaziou um projeto de lei que proibia a prática e manteve apenas dois dispositivos sem relação com o tema. Bolsonaro alegou “contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade” porque a norma restringiria a liberdade de expressão e de imprensa. Os vetos foram mantidos pelo Congresso Nacional.

Professor e pesquisador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito, Filipe Medon avalia que, apesar de sancionar parcialmente a proposta, o Executivo vetou trechos essenciais para a real efetividade do combate a divulgação de crimes de trânsito no ambiente digital.

— A medida vetada criava para as plataformas a obrigação de retirada destes conteúdos após notificação judicial. Seria um avanço diante do Marco Civil, que tem entraves que dificultam a remoção de conteúdos que retratam ou fazem apologia a ilicitudes. Como regra, as plataformas não têm o dever de moderação de conteúdo, apesar de eventualmente lucrarem com a monetização de publicações — detalha Medon.

O GLOBO procurou o TikTok e a Meta, grupo que engloba redes sociais como o Facebook e Instagram, e apresentou exemplos de postagens com menores na direção. O TikTok respondeu que os vídeos foram analisados e receberam a moderação adequada de acordo com as diretrizes da plataforma. A publicação passou, então, a aparecer como indisponível. Já a Meta não respondeu aos questionamentos.

O que manda a lei

O Código de Trânsito brasileiro fixa a idade mínima de 18 anos para a obtenção da habilitação e estabelece que apenas crianças maiores de 10 anos podem andar no banco da frente do carro. No caso da prática esportiva, a lei diz que ela tem de ser em ambientes apropriados e sob supervisão autorizada pelos responsáveis do menor.

A Confederação Brasileira de Automobilismo é responsável pela organização das competições, que possuem regras baseadas no Código Desportivo do Automobilismo. Em entrevista à Rádio CBN, a advogada Marina Chamelette, especializada em Direito Desportivo, ressaltou que o torneio em que Lourenzo morreu foi organizado por uma empresa independente, não homologada pela Confederação.

O advogado criminalista Rafael Paiva diz que o responsável que deixa um menor dirigir pratica crime de trânsito e infração administrativa. A lei estabelece pena de até um ano ou multa para o dono do automóvel ou quem tem a posse do carro.

— É uma grande irresponsabilidade, um descaso com as regras de trânsito, as leis e a vida das pessoas. Mas, infelizmente, é uma prática comum no Brasil — afirma Rafael Paiva.

Os menores flagrados dirigindo estão sujeitos ao cumprimento de medidas socioeducativas. O proprietário do veículo, por sua vez, tem multa prevista de R$ 880,41 a R$ 1.173,88 e sete pontos na carteira. Foram emitidas 73.294 multas pela permissão da condução de um veículo a uma pessoa sem habilitação no país nos cinco primeiros meses deste ano, segundo dados do Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran).

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