Toffoli atende a pedido da defesa de Flávio Bolsonaro e suspende investigações com dados do Coaf
Decisão se refere a processos judiciais em que dados bancários tenham sido compartilhados sem aval prévio do Judiciário e pode beneficiar senador em ações na Justiça do Rio
Leandro Prazeres e André de Souza
16/07/2019 - 11:52
/ Atualizado em 17/07/2019 - 08:46
BRASÍLIA — O presidente do Supremo Tribunal Federal (
STF
), ministro
Dias Toffoli
, determinou nesta terça-feira a suspensão de todos os processos judiciais em que dados bancários de investigados tenham sido compartilhados por órgãos de controle sem autorização prévia do Poder Judiciário. A decisão foi dada em resposta a um pedido do senador
Flávio Bolsonaro
(PSL-RJ) e pode beneficiá-lo
em investigações
que tramitam contra ele na Justiça do Rio de Janeiro.
Além de paralisar processos judiciais em andamento, Toffoli mandou suspender inquéritos e procedimentos de investigação criminais (PICs) em tramitação tanto no Ministério Público Federal quanto nos ministérios públicos estaduais e no Distrito Federal. O presidente do STF classificou como “temerária” a atuação do MP em casos envolvendo o compartilhamento de informações fiscais sem a supervisão da Justiça.
Flávio Bolsonaro é investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) no inquérito que apura o
suposto desvio de dinheiro em seu antigo gabinete
na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). O desvio, segundo as investigações, ocorreria a partir da arrecadação ilícita de parte dos salários de servidores lotados no gabinete do então deputado estadual. Flávio Bolsonaro nega seu envolvimento no caso.
A suposta arrecadação teria sido detectada em relatórios do Conselho de Administração de Atividades Financeiras (Coaf). A defesa de Flávio argumentou ao STF que a investigação conduzida pelo MPRJ teria irregularidades porque o repasse de dados do Coaf ao MPRJ não teria sido intermediado pela Justiça.
No fim de 2018, o Coaf apontou “movimentação atípica” de R$ 1,2 milhão, em 2016 e 2017, nas contas de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio. Oito assessores do ex-deputado estadual transferiram recursos a Queiroz em datas próximas ao pagamento de servidores da Alerj. Segundo o Coaf, Flávio recebeu 48 depósitos no valor de R$ 2 mil. (
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Queiroz e Flávio faltam a depoimentos
Após faltar a quatro depoimentos ao MP, alegando problemas de saúde, Queiroz afirmou, em dezembro, que a “movimentação atípica” revelada pelo Coaf teve origem na compra e venda de veículos. Em janeiro, Flávio Bolsonaro também não prestou depoimento, argumentando que iria marcar uma nova data após ter acesso ao caso. (
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Ministro nega pedido de Flávio contra investigação
Em janeiro, no recesso do STF, o ministro Luiz Fux suspendeu as investigações temporariamente, a pedido de Flávio. Em fevereiro, Marco Aurélio revogou a decisão e autorizou o MPRJ a continuar com a apuração. Flávio havia pedido a transferência do caso para o STF e a anulação de provas. (
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Flávio e mais 26 são investigados na área cível
Em entrevista coletiva, o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, afirmou que Flávio Bolsonaro e os outros 26 deputados estaduais com assessores citados em relatório do Coaf são
alvo de investigações na área cível
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Queiroz reconhece devolução de salários
Em março, Queiroz admitiu, em depoimento, que os valores recebidos por servidores do gabinete eram usados para “multiplicar a base eleitoral” de Flávio. Um ex-funcionário afirmou que repassava quase 60% do salário. O MP não encontrou evidências de que o fluxo bancário de Queiroz teve origem no comércio de carros. (
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A pedido do MP, o Tribunal de Justiça do Rio autorizou, em abril, a quebra de sigilo bancário de Flávio e de Queiroz para o período de janeiro de 2007 a dezembro de 2018. A medida se estende a seus respectivos familiares e a outros 88 ex-funcionários do gabinete do ex-deputado estadual, seus familiares e empresas relacionadas a eles. (
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Pagamento de R$ 64 mil em dinheiro vivo por cirurgia a hospital em SP é revelado
Em fevereiro, Queiroz pagou em espécie R$ 64,58 mil por uma cirurgia ao hospital israelita Albert Einstein , em São Paulo. Ele foi internado na unidade em janeiro, quando retirou um câncer no cólon. Desde que recebeu alta, nunca se soube o valor das despesas pagas pelo procedimento(
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Empresa e sócio têm quebra de sigilo suspensa
Em 20 de junho, a Justiça do Rio decidiu suspender a quebra de sigilo da empresa MCA Participação e Exportações e de um de seus sócios, Marcelo Cattaneo Adorno. Ambos integravam a lista dos 95 alvos da investigação do Caso Queiroz. (
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Justiça do Rio nega liminar para suspender quebra de sigilo
Em 26 de junho, o desembargador Antônio Carlos Nascimento Amado, do Tribunal de Justiça do Rio, negou pedido de Flávio para suspender a quebra de sigilo feita a pedido do MP-RJ. (
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Oito novos alvos com sigilo quebrado
Em 28 de junho, a 27ª Vara Criminal do Rio autorizou a quebra dos sigilos de mais oito pessoas ligadas ao antigo gabinete de Flávio. A decisão ocorreu dois meses após a quebra dos silgilos de outras 86 pessoas e nove empresas ligadas ao antigo gabinete do filho do presidente. (
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Em 16 de julho, o ministro Dias Toffoli, do STF, suspendeu processos judiciais em que dados bancários de investigados tenham sido compartilhados por órgãos de controle sem autorização da Justiça. Trata-se de resposta a um pedido de Flávio que pode beneficiá-lo no Caso Queiroz. (
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"Considerando que o Ministério Público vem promovendo procedimentos de investigação criminal (PIC), sem supervisão judicial, o que é de todo temerário do ponto de vista das garantias constitucionais que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, revela-se prudente ainda suspender esses procedimentos", disse Toffoli, em sua decisão.
O ministro embasou sua decisão no fato de que a legalidade do compartilhamento de informações nesses moldes é tema de um processo, cujo julgamento de mérito está marcado para novembro, que tem "repercussão geral" na Corte. Isso significa que a decisão do Supremo valerá para todo o Judiciário. Nesses casos, é de praxe que todas as matérias que tratam do assunto fiquem suspensas.
A decisão de Toffoli acontece após diversas tentativas da defesa de Flávio Bolsonaro para alterar o curso das investigações que tramitam contra ele no Rio de Janeiro. Em fevereiro deste ano, ele recorreu ao STF argumentando que, por ser senador da República e ter foro privilegiado, o caso deveria ser investigado junto ao Supremo. O ministro do STF, Marco Aurélio Mello, negou o pedido. Em junho, o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Antônio Carlos Nascimento Amado negou um pedido da defesa de Flávio que pedia a suspensão da
quebra de seu sigilo fiscal e bancário, decretada em abril
.
Em nota, a defesa de Flávio Bolsonaro diz que a medida alcança não apenas o caso do senador, mas todos os processos nos quais houve quebra de sigilo sem autorização da Justiça.
"Confiamos na Justiça e na sabedoria dos ministros do STF para avaliar se os limites legais foram rompidos neste caso e em tantos outros. A decisão não impede a continuidade de investigações e apurações de corrupção, crimes colarinho branco, e outros assemelhados. De modo diverso, todas elas poderão continuar em trâmite. Obriga-se apenas que, preventivamente, as autoridades de persecução penal façam cumprir a Constituição da República, solicitando a quebra do sigilo bancário ao Poder Judiciário", diz.
Investigadores do caso junto ao Ministério Público do Rio explicaram ao GLOBO que a decisão de Toffoli se refere a um processo de 2017, cujo recurso será julgado em novembro. O MP diz não ter recebido nenhuma notificação oficial do STF ainda sobre o alcance da decisão diante das investigações sobre Flávio Bolsonaro.
— Nunca vi nada parecido antes. Nunca vi uma decisão de repercussão geral para suspender investigações de forma generalizada em todo o país. Acredito que, como já temos decisão judicial no caso, é difícil que a decisão alcance essa investigação — afirma um dos investigadores.
95 alvos
As quebras de sigilos bancário e fiscal no âmbito da investigação tiveram como alvos 95 personagens, dentre ex-funcionários do gabinete de Flávio e
pessoas que participaram de transações imobiliárias com ele
. As suspeitas do Ministério Público no caso são do crime de peculato, por meio da devolução dos salários dos funcionários do seu gabinete, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
As investigações do MPRJ apontaram que o esquema de desvio de recursos no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj seria operado pelo ex-assessor Fabrício Queiroz, que é policial militar reformado. Ao MPRJ, Queiroz admitiu que repassava parte dos salários de servidores lotados no gabinete de Flávio Bolsonaro a outras pessoas que trabalhassem, ainda que informalmente, para o parlamentar. A ideia, segundo ele, era ampliar a base de pessoas a serviço do então deputado. Queiroz disse que o parlamentar não tinha conhecimento do esquema.
O GLOBO mostrou que o senador empregou nove parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher de Jair Bolsonaro, no período em que foi deputado estadual. A maioria deles vive em Resende, no Sul do estado do Rio e todos
tiveram o sigilo fiscal e bancário quebrado
por decisão do Tribunal de Justiça do Rio. Ao menos quatro deles têm dificuldades para comprovar que, de fato, assessoraram Flávio. Eles recebiam salário, mas
não tinham crachá e ficavam longe da Alerj
. O senador disse, na ocasião, que os parentes de Ana Cristina foram nomeados porque eram “qualificados para as funções que exerciam”.