A organização Parto do Princípio , rede de mulheres pela maternidade ativa, apresentou uma denúncia formal contra as supostas irregularidades na concessão do auxílio emergencial do governo federal para mães provedoras de famílias monoparentais. O documento, que enumera as possíveis falhas no sistema e reúne mais de 60 casos concretos de mães solo que não conseguiram acessar o benefício, foi protocolado na última segunda-feira, dia 18, no Ministério Público Federal do Estado de São Paulo .
A denúncia foi acolhida e, na terça-feira (19), a procuradora Lisiane Braecher publicou um despacho determinando um prazo de 72 horas para que o Ministério da Cidadania, por meio de sua Secretaria Especial do Desenvolvimento Social, preste esclarecimentos sobre as alegações, informando, inclusive, eventuais providências e alterações promovidas para a correção e melhoria no acesso da população ao auxílio emergencial. O ministério foi procurado pela reportagem, mas não se manifestou até o momento.
— É um absurdo total um benefício que era pra ser emergencial demorar mais de 45 dias pra sair, colocando mulheres, muitas mães e crianças, em situação de completa humilhação, em filas, sem qualquer informação — afirma Polly do Amaral, ativista e integrante da Rede Parto do Princípio.
"Esses homens cadastram o CPF de seus filhos e filhas, com quem não coabitam, para diminuir a sua renda per capita (uma maneira de fraudar o sistema), ou mesmo para prejudicar a mulher, em uma atitude misógina que coloca em risco a dignidade, a subsistência e o direito à vida de seus próprios descendentes, ainda menores de idade; ou ainda por engano, já que a pergunta do aplicativo induz ao erro (pergunta das versões iniciais do aplicativo: 'Composição familiar: precisamos dos dados de todos os membros da sua família'). Como se isso não fosse suficiente, muitos genitores estão deixando de pagar a pensão alimentícia sob o argumento de que a mulher receberá o auxílio emergencial em valor dobrado, portanto eles estariam dispensados de cumprir com essa obrigação”, explica o documento apresentado ao MPF.
— Outra falha é no aplicativo Caixa Tem. Para fazer o saque do auxílio, é preciso um token gerado pelo app, que ficou dias sem funcionar. Outra questão é que o código só vale uma hora. Uma mãe que está sozinha, cuidando dos filhos, passando por muitas dificuldades, não consegue ir até uma agência nesse intervalo — explica a ativista da rede.
E continua:
— Quando o benefício é recusado, também falta clareza nas informações. Não existe nenhum lugar para solicitar informações e quanto ela tenta ligar para os números disponibilizados pela Caixa, não consegue falar. Aí parte em uma peregrinação em busca de informações.
"A gravidade do problema requer a adoção de medidas imediatas por parte dos órgãos responsáveis pelo cadastramento das solicitações, pela sua análise e pelo pagamento do Auxílio Emergencial (Ministério da Cidadania, Caixa Econômica Federal e Dataprev). É o que requeremos no presente documento, contando que a atuação do Ministério Público em muito reforçará a nossa luta na proteção e promoção dos direitos das mulheres", diz o documento do grupo.
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Entre as soluções propostas pela rede Parto do Princípio está a correção do formulário de forma que a mãe consiga inserir os CPFs dos seus dependentes, mesmo que estes já estejam inclusos no cadastro do pai, reforçando que o cadastro da mulher deve ser priorizado. Além disso, sugerem que se determine um prazo máximo para análise dos pedidos que o próprio aplicativo disponibilize uma opção para reportar erros.
Projeto de lei no Congresso
As falhas na concessão do auxílio-emergencial para mães solo também motivaram um projeto de lei na Câmara dos Deputados, protocolado em 8 de maio pela bancada do PSOL.
A proposta altera a Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, que dispõe sobre o auxílio-emergencial, determinando que para as autodeclarações na plataforma digital do benefício, será considerada a mulher provedora, na hipótese de indicação do mesmo dependente pelo pai, salvo se comprovada a guarda unilateral do homem.
A bancada do PSOL justifica a proposta de alteração na lei em função do surgimento de denúncias de que os pais têm tentado incluir os filhos nos seus cadastros, "mesmo que não tenham a guarda ou não sejam eles os principais responsáveis pela criação."