Celina

Seis mulheres com mais de 70 anos de idade que são fonte de inspiração por suas ideias

Jane Fonda, de 81, presa mais de uma vez em Washington por protestar contra a falta de ação de Trump sobre as mudanças climáticas, é uma delas
Atriz Jane Fonda é presa durante protesto Foto: Arte sobre foto de Sarah Silbiger/Reuters
Atriz Jane Fonda é presa durante protesto Foto: Arte sobre foto de Sarah Silbiger/Reuters

RIO - Essas mulheres têm origens, nacionalidades, cores de pele e profissões diferentes, mas estão unidas por uma escolha em comum: elas são ativistas e, ao fazer o que acreditam, rompem todos os dias com estereótipos relacionados aos papeis das mulheres na sociedade. Ah, e um detalhe: todas têm mais de 70 anos.

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CELINA listou seis ativistas que, a partir de seus lugares sociais, usam suas vozes para fazer diferença.

Jane Fonda, 81 anos

Jane Fonda defende o Green New Deal, em protestos em Washington D.C. Foto: MARK WILSON / AFP
Jane Fonda defende o Green New Deal, em protestos em Washington D.C. Foto: MARK WILSON / AFP

Aos 81 anos, atriz Jane Fonda foi presa três vezes em 2019 : ela é uma das ativistas à frente de protestos por políticas públicas mais duras contra as mudanças climáticas em Washignton DC. Este é, aliás, um lado da atriz que nem todos conhecem. Nos anos 60, ela já fazia ativismo político em apoio ao Movimento de Direitos Civis nos Estados Unidos, além de se posicionar contra a Guerra do Vietnã e participar de manifestações culturais contra a investida norte-americana.

Na última semana, quando ela não pôde receber seu prêmio Bafta por causa de sua prisão, a atriz gravou um vídeo em que explica sua ausência.

— Estou muito honrada. Eu nem acredito. Estou muito grata. É emocionante e lamento não estar aí, mas como vocês já devem ter ouvido falar, eu tenho sido presa. Decidi que precisava agir mais em relação às mudanças climáticas. Então, me mudei para Washington por quatro meses, para aumentar o senso de urgência em torno do que está acontecendo — disse Fonda, cuja mensagem foi exibida no telão durante a premiação.

Nas imagens de sua mais recente prisão, é possível ver a atriz erguendo as mãos, algemada: "Obrigada, Bafta", disse.

Obrigada, Jane!

Conceição Evaristo, 72 anos

Conceição Evaristo, autora Foto: Ana Branco / Agência O Globo
Conceição Evaristo, autora Foto: Ana Branco / Agência O Globo

"A nossa escrevivência não pode ser lida como história de ninar os da casa-grande, e sim para incomodá-los em seus sonos". A famosa frase de Conceição Evaristo ecoa pela obra da autora que, mesmo tendo começado a escrever na infância, só conseguiu publicar seus escritos aos 44 anos. Não à toa, a doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense costuma dizer que não apenas escrever, mas publicar é um ato político diante do racismo estrutural no Brasil e seus efeitos no mercado editorial, especialmente tratando-se de uma mulher.

Evaristo é considerada uma importante voz de denúncia das desigualdades e da vulnerabilidade das mulheres negras e, em sua obra, uma catalisadora de reflexões sobre preconceito na sociedade brasileira. Em 2019, uma campanha espontânea tentou emplacar a escritora na Academia Brasileira de Letras: seria a primeira mulher negra a ocupar um assento.

A comoção não rendeu o esperado pelo público, mas mostrou um alcance, ainda que tardio, da importância de Evaristo. Em 2015, ela recebeu o Prêmio Jabuti com o livro de contos Olhos d’água (Pallas). Em 2017, sua obra foi reeditada e a escritora passou  pela programação principal da Flip (Festa Literária Internacional) como um furacão: foi ovacionada do começo ao fim do encontro. "Esse momento significa a comprovação da força coletiva. Não estou aqui sozinha. E não podemos deixar de afirmar que não foi concessão. Este lugar é nosso por direito", disse, à época.

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Patricia Hill Collins, 71 anos

Patricia Hill Collins foi a primeira mulher negra a presidir a Associação Americana de Sociologia Foto: Divulgação
Patricia Hill Collins foi a primeira mulher negra a presidir a Associação Americana de Sociologia Foto: Divulgação

Expoente do feminismo negro, a socióloga americana Patricia Hill Collins se dedica a transmitir os conceitos que ajudou a criar há pelo menos três décadas e que continuam inspirando reflexões ao redor do planeta. Um exemplo é o conceito de interseccionalidade, que reforça que raça, gênero, classe e sexualidade são sistemas de opressão que se sobrepõem e que não podem ser analisados de forma isolada. Esse entendimento é descrito pela autora como uma das quatro ideias fundamentais do pensamento feminista negro. Ela enumera a esperança, a luta pela justiça social e a ação política como os outros três alicerces deste movimento.

Aos 71 anos,  a professora emérita da Universidade de Maryland esteve no Brasil em 2019 para divulgar o lançamento de sua principal obra, “Pensamento feminista negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento”, traduzida para o português quase 30 anos depois da publicação. Para ela, que também participou da 8ª edição da Festa Literária das Periferias (Flup), o feminismo negro é um projeto de justiça social diante da ameaça existencial, do medo da morte com que pessoas negras lidam desde a escravidão.

— Se houvesse justiça social, não haveria feminismo negro. Há mulheres que se tornam líderes e que sabem sobre tudo isso e dão voz a essas questões ou as transformam em um projeto político. Essa é a natureza do que eu penso ser uma política de empoderamento na vida cotidiana, feita por indivíduos e pessoas conectadas. De fato, o feminismo negro é um projeto de justiça social — disse, em entrevista à Celina.

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Silvia Federici, 77 anos

Autora feminista, Silvia Federici lançou dois livros no Brasil Foto: Wiki Commons / Reprodução
Autora feminista, Silvia Federici lançou dois livros no Brasil Foto: Wiki Commons / Reprodução

Uma das mais relevantes autoras feministas da atualidade, Silvia Federici consolidou sua carreira ao resgatar a história da caça às bruxas para mostrar como ela foi fundamental para a instituição do sistema de produção capitalista e do lugar da mulher na sociedade em  “Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva” (ed. Elefante).

Aos 77 anos, ela lançou dois livros no brasil em 2019 e tem percorrido outros países para alertar contra os perigos do avanço do conservadorismo no mund o.

— Nós temos governantes conservadores em vários lugares do mundo. Mas eles estão começando a perceber que o poder deles não é tão forte assim. Podem até ter instrumentos como armas, por exemplo, mas continuam criando pobreza e desigualdade. Mas as pessoas estão trabalhando por mudanças. É um sistema que mata mulheres porque sabe que elas mantêm as comunidades unidas. Destruir essas mulheres é destruir essas comunidades, é passar uma mensagem — disse, em entrevista à Celina.

Angela Davis, 75 anos

Angela Davis no Rio de Janeiro Foto: Antonio Scorza / Agência O Globo
Angela Davis no Rio de Janeiro Foto: Antonio Scorza / Agência O Globo

São tantas suas lutas que ela se recusa a escolher uma só: Angela Davis, de 75 anos, é feminista, antirracista, anticapitalista ou abolicionista. Ao passar como um furacão por São Paulo e Rio de Janeiro, onde recebeu a maior honraria do Estado do Rio, a Medalha Tiradentes , a filósofa americana lançou sua autobiografia e falou para multidões. No livro, a intelectual recorda as lutas sociais que sacudiram os Estados Unidos nas décadas de 1960 e 1970, quando ela militava no Partido dos Panteras Negras, organização revolucionária do movimento negro americano fundada em 1966 e atuante até 1982.

Por conta de suas relações com o grupo, Angela chegou a ser presa e enfrentou um julgamento acompanhado ansiosamente pelo mundo todo em 1970. Angela Davis se tornou, assim, um símbolo de comprometimento com a mudança social, o que defende de maneira prática, com seu ativismo, e teórica, com suas reflexões. Ao longo da carreira, a professora da Universidade da Califórnia  se dedicou ao estudo do feminismo interseccional — que aborda questões de raça, classe e gênero na luta por igualdade —, tornando-se um dos grandes nomes da área.

— Obrigada pela acolhida tão entusiasmada. Obrigada por trabalharem pelo futuro do Brasil, da região e do mundo. Obrigada a todos os que se identificam com movimentos contra o racismo, o capitalismo e o heteropatriarcado. A todos que reconhecem que, se não nos unirmos a nossos irmãos e irmãs indígenas na luta urgente para salvar o planeta, todos os nossos movimentos por justiça e liberdade terão sido em vão — disse, em conferência em São Paulo.

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Susan Sarandon, 72 anos

A atriz Susan Sarandon com outras ativistas contra a política anti-imigração de Trump marcham dentro do Capitólio, em Washington Foto: JONATHAN ERNST / REUTERS
A atriz Susan Sarandon com outras ativistas contra a política anti-imigração de Trump marcham dentro do Capitólio, em Washington Foto: JONATHAN ERNST / REUTERS

Em 2016, Susan Sarandon, então com 69 anos, incomodou muita gente ao desfilar pela premiação Screen Actors Guild Awards (SAG Awards) com um decote caprichado. Mal sabiam os críticos que, meses depois, já com 70 anos, ela voltaria a  exercer sua liberdade ao se declarar bissexual.

É um fato que Sarandon sempre dividiu seu tempo entre o ativismo e a carreira como atriz. No ano passado, aos 71 anos, ela foi presa, entre outras 500 mulheres, durante um ato na capital americana contra a política de "tolerância zero" do presidente Donald Trump contra imigrantes em situação ilegal. Sarandon disse que foi detida perto do Departamento de Justiça, onde também houve protesto. "Presa. Permaneçam fortes. Mantenham-se lutando. #WomenDisobey", escreveu, à época, no Twitter.

As causas de Sarandon são muitas. Ela se posicionou contra a guerra do Iraque, por exemplo, pediu o fim da pena de morte e já advogou em nome da aceitação de refugiados. Em entrevista ao "The Tonight Show", Sarandon chegou a dizer que o ativismo é sua prioridade.

— Eu vou ser mulher por muito mais tempo do que serei atriz. Vou ser mãe por muito mais tempo do que serei atriz — afirmou.