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Cultura

'Changes': Justin Bieber quer que você não tenha dúvidas do quanto ele ama a mulher

Em disco meloso, astro pop exagera nas crônicas do matrimônio e dá as costas para os acertos de 'Purpose'
Justin Bieber volta após cinco anos com o álbum 'Changes' Foto: Divulgação/Joe Termini
Justin Bieber volta após cinco anos com o álbum 'Changes' Foto: Divulgação/Joe Termini

RIO — “Eu estou passando por mudanças”, cantava Ozzy Osbourne em “Changes” , faixa do quarto disco do Black Sabbath , em 1972. A canção, que já foi adaptada ou regravada por nomes diversos como o rapper Eminem , o soulman Charles Bradley e o jovem cantor brasileiro Tim Bernardes , é agora apropriada por Justin Bieber tanto no nome quanto no refrão da faixa-título de seu quinto álbum de estúdio, lançado nesta sexta-feira, após um intervalo de cinco anos.

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A bem da verdade, Bieber passou por uma pá de mudanças ao longo de seus 25 anos bem vividos. Surgiu como menino de franjinha no hit “Baby” em 2010, virou astro mundial, namorou bastante (incluindo uma relação conturbada com a cantora Selena Gomez), passou por uma série de problemas com a sua imagem pública (e com a polícia), ressurgiu surpreendendo meio mundo com um grande álbum pop (“Purpose”, de 2015) e apresenta, agora, uma nova faceta: o do homem ainda jovem que está encantado com o matrimônio. Desde novembro de 2018, ele é casado com a modelo Hailey Baldwin , neta do pianista e produtor musical brasileiro Eumir Deodato.

As mudanças que Bieber mostra em sua nova fase incluem ainda a sobriedade — ele contou na série documental “Seasons” , do YouTube Original, que chegou ao ponto de usar tanta maconha, drogas sintéticas e remédios que seus seguranças precisavam checar seu pulso toda noite —, o encontro com a fé e a luta contra as crises de ansiedade.

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Essa parte do novo Bieber, porém, está limitada ao documentário fechado para assinantes. Aqueles que quiserem usar o álbum “Changes” para entender seu momento encontrarão apenas um Bieber muito apaixonado por Hailey. Assim, exageradamente apaixonado, meloso, com versos que beiram a obsessão. Veja bem, nada contra o amor declarado, o amor sentido ou qualquer forma de amor. Mas preparar um álbum com 17 músicas, 51 minutos, apenas sobre o mesmo tema, soa para lá de cansativo.

Esqueça os flertes precisos com a EDM de Diplo e Skrillex que fizeram de “Purpose” o álbum pop dançante de 2015, conquistando até um público mais maduro que torcia o nariz para o canadense. “Changes” carece de momentos para a pista, apresentando-se predominantemente como um disco de r&b contemporâneo, com intervenções quase sempre exageradas da produção capitaneada por Poo Bear (velho parceiro de Bieber e colaborador de Anitta na quase bossa “Will I see you”, de 2017).

Capa de 'Changes', de Justin Bieber Foto: Divulgação
Capa de 'Changes', de Justin Bieber Foto: Divulgação

Nas letras, ao ser autocentrado demais, Bieber vai encontrar problemas para engajar até o mais apaixonado dos ouvintes. Ele cria regra sobre a definição de amor em “That’s what love is” (“Eu posso senti-la/ Mesmo sem ainda ter tocado-a/ Isso que é amor/ Isso que é amor de verdade”), uma das poucas faixas em que o violão assume o protagonismo; em “E.T.A.”, que do ponto de vista instrumental é a mais minimalista e interessante do disco, centrada num bonito riff de guitarra, o cantor se mostra meio ansioso para o reencontro com a amada, e soa como se estivesse esperando um Uber (“Você está a menos de cinco minutos de distância de mim”); um amante impaciente surge em “Available” (“Eu fico frustrado quando você está ocupada/ Ultimamente, isso tem acontecido com mais frequência, querida, o que está pegando?”); e Bieber se oferece como desafogo para emoções extremas em “Take it out on me” (“Você pode descontar em mim/ Eu serei seu saco de pancadas, me bata com toda sua força”).

Até as participações especiais do disco entram na onda amorosa de Justin Bieber. O trapstar Travis Scott se junta ao canadense para pedirem reciprocidade das amadas em “Second emotion”; outro astro da era do streaming, Post Malone mostra certa rebeldia, mas também sabe amar em “Forever”; e a cantora de r&b Kehlani faz a melhor parceria do disco ao dialogar sobre o tema e dobrar vozes com Bieber na saborosa “Get me”.

Tirando um ou outro acerto na base da tentativa e erro, “Changes” é, por fim, longo demais, meloso demais e pouco propõe na consolidação artística que Bieber prometia em “Purpose”. Mas, bem, não há dúvidas de que está tudo lindo entre os pombinhos.

Cotação: regular.