Cultura

Jorge Du Peixe, amigo e sucessor de Chico Science nos vocais da Nação Zumbi, lança primeiro disco solo

Em 1º álbum solo, o cantor da Nação Zumbi se dedica ao repertório de Luiz Gonzaga e redescobre um artista multifacetado: 'Se você pode ir a vários lugares, porque vai num lugar só?'
O cantor Jorge Du Peixe Foto: José de Holanda / Divulgação
O cantor Jorge Du Peixe Foto: José de Holanda / Divulgação

RIO - Aos 22 anos, em 1989, Jorge José Carneiro de Lira trabalhava para a Vasp no Aeroporto Internacional do Recife-Guararapes, quando presenciou um inesquecível pandemônio.

— As pessoas estavam aguardando o corpo de Luiz Gonzaga desembarcar para ir pra Exu. Lembro como se fosse hoje, nunca tinha visto coisa igual — conta o cantor, conhecido como Jorge Du Peixe, que poucos anos depois formaria com o amigo Chico, vizinho do bairro de Rio Doce, o grupo Chico Science & Nação Zumbi. — Chico fez entrevista de emprego para a Vasp mas não foi selecionado, acho que viram nele um cara muito idealista, um líder sindical. Ele ia para o aeroporto de madrugada dar rolê, quando brigava com as namoradas. A gente voltava junto de manhã.

Em 1997, Chico Science morreu num acidente de carro e deixou de legado para o amigo percussionista o posto de vocalista da Nação Zumbi, banda que entraria pelos anos 2000 em posição de liderança da cena musical independente do Brasil. Jorge estava gravando mais um disco com a Nação quando a pandemia de Covid-19 chegou. Ilhado em São Paulo, tentando adaptar-se ao mundo novo “e à cobrança do povo para ser criativo”, ele acabou concebendo e realizando o seu primeiro álbum solo: “Baião Granfino”, todo dedicado ao repertório do Gonzagão, com lançamento marcado para o próximo dia 16.

— A gente nasceu, cresceu ouvindo e vive lembrando de Luiz Gonzaga. É importante mexer com ele nesse momento em que a cultura está escroteada e zoada nesse país — defende Du Peixe, que esta sexta-feira lança no streaming o segundo single do álbum, “O fole roncou”, composição que havia gravado com a Nação no começo dos anos 2000 e que agora é recriada com ao lado de Cátia de França, cantora redescoberta recentemente com o relançamento do álbum “Vinte palavras ao redor do sol”, de 1979. — Cátia é uma trovadora absurda, uma paraibana que passou muito tempo em Recife e foi parceira de palco de Jackson do Pandeiro.

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Aos 54 anos, com sua característica voz grave (que o obrigou a baixar os tons das composições), Jorge Du Peixe envereda por canções como o maracatu “Rei Bantu”, “Assum preto”, “Sanfona sentida”, “Sabiá”, o bolero “Acácia amarela” e, é claro, o “Baião Granfino”. A produção do disco ficou com Fabio Pinczowski, do estúdio 12 Dólares, em São Paulo. Os dois haviam trabalhado juntos em 2017 num episódio do programa “Clubversão”, da HBO, que Jorge dividiu com Wilson das Neves, três meses antes da morte do sambista.

— A gente não queria fazer uma coisa muito conhecida nem muito lado B. Sugeri algumas, o Fabio sugeriu outras. No fim de 2020, chegamos a um repertório, mas eu achei que ficou faltando uma música. E aí entrou “Cacimba nova” — revela o cantor.

Ao começar os trabalhos do “Baião Granfino”, Fabio Pinczowski optou por manter a banda com a qual gravara o “Clubversão”, com Joana Queiroz no clarinete, Serginho Machado na bateria, o cubano Yaniel Matos no piano e no violoncelo e Swami Jr. no violão de sete cordas.

— Eles têm uma sonoridade sofisticada, meio Buena Vista às quatro da manhã, que coloca o Jorge numa posição a que a gente não está acostumado, de crooner — conta o produtor, que logo depois criou uma segunda banda (com o baterista Pupillo, ex-Nação Zumbi, e o sanfoneiro Mestrinho) e de uma terceira (com Pupillo e Siba, este na rabeca e na guitarra). — Mas aí as bandas foram se fundindo.

Sem medo da diversidade

Artista que já fez participações em músicas de um time que vai de Marcelo D2 e Edi Rock (dos Racionais MCs) aos grupos Ponto de Equilíbro (de reggae) e Falamansa (de forró), Jorge não se deixou assustar pela diversidade d o “Baião Granfino”.

— Se você pode ir a vários lugares, porque vai num lugar só? — pergunta-se o cantor, que ainda costuma compor e gravar trilhas para filmes como “Piedade”, de Claudio Assis (“O Jorge é um cara fechado, introspectivo, mas tem ideias maravilhosas”, elogia o diretor).