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Cultura

Saiba quem é Leonardo Mouramateus, o cineasta cearense que disputa prêmio no Festival de Roterdã

Realizador de 29 anos exibe na mostra seus seis primeiros filmes e um curta inédito
O diretor cearense Leonardo Mouramateus Foto: Divulgação/Alexi Pelekanos
O diretor cearense Leonardo Mouramateus Foto: Divulgação/Alexi Pelekanos

ROTERDÃ (Holanda) — A inquietude é a marca de Leonardo Mouramateus , que divide seu tempo entre cinema, teatro e dança. Aos 29 anos, é dono de um currículo com 12 filmes e participações em diversos espetáculos cênicos dentro e fora do Brasil. Esse “desassossego” foi percebido pelo Festival de Roterdã e está espelhado nos curtas do cearense em cartaz na seção Deep Focus da 49ª edição da mostra holandesa. Como o título sugere, ela oferece um mergulho na obra de jovens e promissores cineastas.

Mouramateus participa do festival com seus seis primeiros filmes — entre eles, “A festa e os cães” (2015), premiado no festival francês Cinéma du Réel , e “História de uma pena” (2015), vencedor do troféu do júri no Festival de Brasília — e também na mostra competitiva de curtas com o inédito “A chuva acalenta a dor”.

Em Roterdã, o cineasta conta que tem mais dois curtas a caminho e finaliza “A vida são dois dias”, seu segundo longa — o primeiro, “António um dois três”, foi exibido em Roterdã em 2017. Ele recorda o início:

— Fiz meu primeiro curta no primeiro semestre do curso de Cinema na Universidade Federal do Ceará. Acho que meu ritmo tem mais relação com a necessidade de criar uma rotina de trabalho do que construir uma obra — explica Mouramateus, que foi fazer um mestrado em Lisboa em 2014 e “foi ficando”. — Estando em Fortaleza, cercado de pessoas com a mesma energia, foi possível fazer filmes de baixíssimo ou nenhum orçamento e expressar a sensação do momento.

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Os filmes do realizador cearense se alimentam de memórias afetivas e interpretações da realidade a sua volta, o que lhe dão um caráter emocional e político. Em “Mauro em Caiena” (2012), uma criança que brinca de Godzilla destruindo prédios imaginários remete às mudanças urbanas de Fortaleza. Já “Vando vulgo vedita” (2017) parte das lembranças de uma turma sobre um amigo ausente para abordar intolerância e ódio.

— Mouramateus conseguiu criar, em um curto espaço de tempo, uma obra excepcional e multifacetada. Seus filmes oferecem uma visão íntima da vida de jovens adultos, revelando o que significa crescer no Brasil de hoje — elogia Koen de Rooij, um dos programadores de curtas-metragens de Roterdã. — Seus temas-chave são o amor pela música, o papel do acaso na vida e personagens que não encontram seu lugar no mundo.

Para Mouramateus, é natural que tenha feitos muitos filmes envolvendo jovens de Fortaleza, porque era “a realidade em que estava inserido”. Acredita que seus filmes amadurecerão junto com ele, mas diz que sempre se interessará por pessoas com essa vibração da juventude — o mundo da “confusão, do descenso, das possibilidades, das escolhas estapafúrdias, da sensação de descoberta, ligado à vitalidade, à vontade de sair do quadro, do lugar”.

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O diretor observa que a inquietação não é prerrogativa de sua geração e tem “um fundo econômico”:

— Meus filmes não falam de jovens ricos, mas de jovens que vêm de famílias humildes, como a minha. A inquietude não nasce de um conforto, mas de um desconforto — analisa o diretor, que após Roterdã volta para Barcelona, onde continua a trabalhar na dramaturgia de “Ça va exploser” (algo como “Isto vai explodir”), espetáculo de dança dirigido pelo coreógrafo português João Fiadeiro e pela coreógrafa e bailarina brasileira Carolina Campos, que estreia 6 de fevereiro. — A dança e o teatro ainda pagam minhas contas (risos) .

Assim como seu longa anterior, “A vida são dois dias” foi rodado no Brasil e em Portugal. É uma história sobre dois irmãos gêmeos, protagonizada pelo português Mauro Soares (de “António um dois três”) e a brasileira Mariah Teixeira.

É um novo trabalho com dupla nacionalidade, mas Mouramateus diz que segue fazendo filmes brasileiros.

— Quando lancei “António um dois três”, os brasileiros diziam que era um filme português; os portugueses, que era um filme brasileiro. Mas o lugar onde ele é feito não é determinante na nacionalidade de uma produção. Ainda mais na situação em que o Brasil está agora, onde não há possibilidade de fazer cinema — analisa o diretor. — Busco um lugar para fazer meus filmes. Lutamos tanto por um modelo de produção, mas não fizemos o mesmo esforço quando esse modelo é ameaçado de ser retirado.