Cultura

A Tropicália por Fred Coelho: uma nova forma de pensar o Brasil

Pesquisador lembra que a união entre a arte de Hélio Oiticica e a canção de Caetano e Gil teve o cinema como ponte
Obra 'Tropicália', de Hélio Oiticica, montada na exposição 'Nova objetividade brasileira', em abril de 1967 Foto: DIVULGAÇÃO / DIVULGAÇÃO
Obra 'Tropicália', de Hélio Oiticica, montada na exposição 'Nova objetividade brasileira', em abril de 1967 Foto: DIVULGAÇÃO / DIVULGAÇÃO

RIO — Já é famosa a história de como ‘Tropicália”, nome da obra de Hélio Oiticica, tornou-se título da canção de Caetano Veloso. A conexão foi feita por Luiz Carlos Barreto, produtor e fotógrafo do Cinema Novo. Foi seu olhar (e seu ouvido) que relacionou a instalação de Oiticica exibida no MAM do Rio de Janeiro durante o primeiro semestre de 1967 e a letra cantada por Caetano em uma audição caseira durante um evento particular em São Paulo no início de 1968. Assim, a união entre as artes visuais e a canção popular teve como ponte o cinema.

Tropicália, de Hélio Oiticica, foi exibida na exposição “Nova objetividade brasileira”, realizada no MAM em abril de 1967. Ela é formada por três penetráveis, por poemas de Roberta Salgado (na época cunhada de Oiticica) e por elementos relacionados a representações dos trópicos — como plantas e araras. O trabalho é fruto de um percurso do artista voltado para os desdobramentos de seu abandono do plano bidimensional da pintura em direção ao “corpo da cor”.

“Tropicália, de Hélio Oiticica, foi exibida em abril de 1967. É formada por três penetráveis, por poemas de Roberta Salgado e por elementos relacionados aos trópicos — como plantas e araras”

Fred Coelho
Colunista do GLOBO, organizador de 'Tropicália', com Sergio Cohn, e autor de 'Eu, brasileiro, confesso minha culpa e meu pecado — cultura marginal no Brasil de 1960 e 1970'

Apesar de manter em 1968 posições críticas ao uso modista do termo que criou e seu vinculo ao sucesso do movimento que agregara um “ismo” em sua invenção, a obra "Tropicália" levava Oiticica a uma posição de destaque na arte de vanguarda brasileira daquele período. Sua relação com a estética do tropicalismo musical e seus participantes ocorreu aos poucos, a partir da sua identificação com a radicalidade das intervenções desses artistas e com a busca de uma nova linguagem visual e cultural para o país, fora dos padrões conservadores vigentes até então.

Os laços que foram criados entre Oiticica, os compositores e seus amigos (como Torquato Neto, Waly Salomão e Rogério Duarte) foram decisivos. Oiticica redigiu uma série de artigos dedicados ao trabalhos dos músicos. Neles, destaca seu aspecto performático e musical, indicando sua “manifestação ambiental”. Assim, propõe uma relação criativa entre seu trabalho e o trabalho dos baianos. Tal aproximação se dava através de práticas poéticas renovadoras e abertas, que possibilitavam uma nova forma de pensar o papel do Brasil e sua imagem na modernidade mundial.

Fred Coelho é colunista do GLOBO, organizador de “Tropicália”, com Sergio Cohn, e autor de “Eu, brasileiro, confesso minha culpa e meu pecado — cultura marginal no Brasil de 1960 e 1970”