Exclusivo para Assinantes
Cultura

Alvo de ação policial no Rio, legado de Renato Russo é disputado nos tribunais em Brasília

Dois processos no STJ contrapõem Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, companheiros do cantor na Legião Urbana, e seu herdeiro
Renato Rocha (à esquerda), Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá: a Legião Urbana de "Dois" e de "Que país é este" Foto: Divulgação
Renato Rocha (à esquerda), Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá: a Legião Urbana de "Dois" e de "Que país é este" Foto: Divulgação

BRASÍLIA - Enquanto uma operação no Rio de Janeiro levou o nome de Renato Russo às páginas policiais na semana passada, o legado do cantor é alvo de uma árdua disputa nos tribunais , em Brasília. O filho do músico, Giuliano Manfredini, e os antigos companheiros de banda, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, brigam pelo direito de uso do nome Legião Urbana em duas ações no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Atualmente, Dado e Bonfá podem utilizar a marca em seus trabalhos, mas devem pagar um terço do que ganham com isso ao herdeiro de Renato Russo.

Renato Russo: Ex-guitarrista da Legião tem disco engavetado com letras inéditas

As duas ações começaram na Justiça do Rio de Janeiro. Giuliano herdou do pai a empresa Legião Urbana Produções Artísticas, detentora da marca. Mas, a pedido de Dado e Bonfá, um juiz de primeira instância liberou o uso do nome "Legião Urbana" em seus trabalhos. Ele considerou que a marca foi construída e consolidada pelos três integrantes da banda, mesmo que tenha sido registrada apenas por Renato Russo.

Será: Fã da Legião é pivô da Operação; advogado diz que ele já esclareceu acusações

Um terço

Os advogados de Giuliano apresentaram uma nova ação, mas a Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) manteve a decisão. Em seu voto, o relator, desembargador Milton Fernandes de Souza, disse que, "independentemente de licenciamento do titular exclusivo, este terá que compartilhar o uso da marca com os demais ex-integrantes da banda sem que isso represente qualquer violação ao seu direito patrimonial".

Giuliano Manfredini, filho de Renato Russo, líder da Legião Urbana, em foto de 2006 Foto: Roberto Stuckert Filho/6-10-2006
Giuliano Manfredini, filho de Renato Russo, líder da Legião Urbana, em foto de 2006 Foto: Roberto Stuckert Filho/6-10-2006

Essa decisão foi levada em conta em outra ação, movida por Giuliano para ser indenizado pelo uso da marca por Dado e Bonfá. A Nona Câmara Cível do TJRJ destacou que os dois já tinham uma decisão autorizando a utilização do nome da banda, mas determinou que eles paguem um terço do retorno financeiro que tiverem ao filho de Renato Russo. O relator do processo no TJRJ, desembargador Adolpho Andrade Mello, disse que os dois antigos companheiros de banda não podem "fruir os lucros advindos pela utilização da marca em sua totalidade", uma vez que a decisão anterior "não reconheceu a exclusividade da exploração, mas tão-somente garantiu a utilização da marca conjuntamente com a sociedade apelante", ou seja, a empresa de Giuliano.

Recursos no STJ

Ambas as partes continuaram reclamando. Giuliano contra a decisão que permitiu o uso do nome Legião Urbana pelos outros integrantes da banda. Dado e Bonfá contra a outra decisão, que os obriga a pagar um terço do que ganharem. Esses recursos estão atualmente no STJ, mas com ministros relatores diferentes. O primeiro está com a ministra Maria Isabel Gallotti, da Quarta Turma. O segundo com Paulo de Tarso Sanseverino, da Terceira Turma.

O advogado Guilherme Silveira Coelho, que representa a Legião Urbana Produções Artísticas, destacou que a empresa detentora do registro da marca era apenas de Renato Russo quando ele morreu, sendo herdada por Giuliano, na época menor de idade. Ele também explicou que, se o STJ autorizar o uso da marca por Dado e Bonfá, a outra ação continuará tramitando para saber se eles têm que pagar ou não um terço.

Se, ao contrário, o STJ não permitir que utilizem mais o nome da banda sem autorização de Giuliano, a segunda ação servirá para definir quanto eles devem pagar pelo período em que puderam usar a marca. Nesse cenário, explicou o advogado, os dois não terão que devolver todos os lucros, porque eles exploraram o nome "Legião Urbana" quando ainda havia uma decisão judicial autorizando-os. Mas, por enquanto, não há previsão de quando o STJ vai julgar as ações.

— Havia sim essa notícia até no próprio site do STJ de que esse seria um dos processos relevantes julgados neste semestre, mas o fato é que não há sinalização de pauta para esse julgamento nos próximos dias — disse o advogado.

Disputa também com a tia

O GLOBO procurou a defesa de Bonfá e Dado, mas um de seus advogados disse que precisaria de autorização dos clientes para poder falar sobre o assunto.

Nos dois processos, não é Giuliano a parte envolvida, mas a empresa dele, Legião Urbana Produções Artísticas. Como pessoa física, ele move uma outra ação contra sua tia, Carmem Manfredini, irmã de Renato Russo. Ela divulgou uma carta aberta em que reclamou da decisão do sobrinho de doar alguns objetos do dia a dia do músico, como CDs, roupas, livros e móveis, ao Retiro dos Artistas. A instituição, que abriga e ajuda profissionais idosos do mundo das artes, fez um bazar com os bens recebidos para arrecadar recursos.

Na carta aberta, a tia escreveu que o sobrinho estaria se desfazendo do patrimônio de Renato Russo "como se não significasse nada". Giuliano alegou que foi alvo de ofensas inverídicas e pediu uma indenização, negada pela Justiça do Distrito Federal. Ele recorreu e o caso também está na Quarta Turma do STJ, sob a relatoria do ministro Marco Buzzi.

"A carta escrita pela tia do recorrente [Giuliano] expressa tão somente sentimentos de lamentação, diante de notícia veiculada na internet em relação ao destino dos pertences do cantor Renato Russo. Dada a importância do artista no cenário pátrio, natural a repercussão havida entre o público, quanto aos acontecimentos", escreveu em seu voto a relatora do caso, a desembargadora Carmelita Brasil, da Segunda Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT).