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34ª Bienal de São Paulo anuncia lista final de artistas e confirma edição presencial em setembro

Curador diz que a presença de participantes, que virão mais de países onde a vacina avança, está acima das expectativas; adiado por um ano, evento busca equilíbrio entre gêneros, após críticas de falta de diversidade
Still do vídeo 'Hold hold fire' ( 2019), da inglesa Olivia Plender, um dos 35 últimos nomes anunciados pela Bienal de São Paulo Foto: Divulgação
Still do vídeo 'Hold hold fire' ( 2019), da inglesa Olivia Plender, um dos 35 últimos nomes anunciados pela Bienal de São Paulo Foto: Divulgação

Com sua exposição principal adiada em um ano por conta da pandemia de Covid-19 , a 34ª Bienal de São Paulo confirmou sua abertura em 4 de setembro, com dois cenários antagônicos à frente, mas que podem acontecer de forma concomitante. Por um lado, há a esperança do avanço da imunização nos quatro meses seguintes — na capital paulista, foi anunciada nesta quarta que pessoas entre 54 e 45 anos sem comorbidade serão vacinadas em agosto . Por outro, paira o temor de uma terceira onda de contaminação , já aventada por médicos e cientistas. Após abrir em novembro de 2020 a coletiva "Vento", com 21 artistas , que funcionou como prévia do evento principal, a curadoria anunciou a lista final dos 91 participantes (incluindo dois duos e um coletivo) e que a exposição será realizada de forma presencial no Pavilhão da Bienal, no Parque do Ibirapuera.

— Para inaugurar em setembro, essa decisão teria que ser tomada agora. Estamos no limite do prazo para fechar o transporte de obras, as publicações, as viagens dos convidados, a produção do evento em si  — explica o curador geral, Jacopo Crivelli Visconti, em entrevista por videoconferência com o curador adjunto, Paulo Miyada. — Além de acompanhar de perto a evolução da pandemia, estamos em contato com instituições parceiras, do país e de fora, para entender como oferecer uma experiência segura ao público. Ainda não sabemos como será a visitação, quantas pessoas poderão entrar no pavilhão ao mesmo tempo. Vamos seguir os protocolos definidos pelas autoridades na época. Para além dessa preocupação, vemos a necessidade das pessoas de estar num ambiente de troca como a Bienal. Isso nos levou a seguir adiante.

Outra questão que só será definida mais próximo da abertura é a dos artistas selecionados que participarão presencialmente da Bienal. O curador italiano radicado no Brasil avalia que o número de convidados não teria como ser similar ao de edições anteriores, mas diz ter se surpreendido com o número de confirmações.

— Essa decisão não tem a ver apenas com os números no Brasil,  é nítido como a situação no país de origem também influencia. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais gente está confirmando, enquanto a resposta de pessoas da América Latina ou de alguns países na Europa é mais cautelosa — comenta Visconti.

'Ũn te kuxak kuk top hemãhã (Ela tira gordura da capivara)' (2005), de Sueli Maxakali Foto: Divulgação
'Ũn te kuxak kuk top hemãhã (Ela tira gordura da capivara)' (2005), de Sueli Maxakali Foto: Divulgação

Com o título "Faz escuro mas eu canto", verso do poeta amazonense Thiago de Mello , a 34ª edição da Bienal absorveu questões evidenciadas na pandemia, embora muitas das inquietações levantadas pelos artistas e suas obras já fizessem parte do universo de intenções da curadoria antes de o coronavírus adiar a mostra principal.

— Mesmo com o adiamento, não houve um hiato no trabalho. Lidamos com muitas incertezas, mas também pudemos aprofundar as conversas que vinham desde a escolha do tema. Em 2019, não era preciso explicar para ninguém a razão de fazer uma Bienal com este título. A pandemia só reforçou a pertinência de discutir estas mesmas questões hoje — analisa Miyada. — A Bienal tem a importância também de trazer de volta essa imagem arquetípica do espaço público, da praça, do lugar do debate.

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Complementando os 56 nomes divulgados anteriormente, a Bienal anunciou agora outros 35 participantes, incluindo obras do pintor italiano Giorgio Griffa, da multiartista inglesa Olivia Plender, da escultora chinesa Guan Xiao, do produtor e DJ jamaicano Lee "Scratch" Perry e do pintor carioca Arjan Martins. A lista final, de acordo com o evento, inclui nomes de cinco continentes, maior equilíbrio entre homens e mulheres, 4% de artistas identificados como não-binários e 10% representantes de povos originários, de várias partes do mundo. A busca pela diversidade, diz Visconti, não intenciona responder às críticas surgidas no anúncio da curadoria, em janeiro de 2019 . Além dele e de Miyada, complementam a equipe os curadores convidados Carla Zaccagnini, Francesco Stocchi e Ruth Estévez.

Equipe curatorial da 34a Bienal de São Paulo: Jacopo Crivelli Visconti, curador-geral, Francesco Stocchi, curador convidado, Paulo Miyada, curador-adjunto, Ruth Estévez, curadora convidada e Carla Zaccagnini, curadora convidada Foto: Pedro Ivo Trasferetti / Fundação Bienal de São Paulo
Equipe curatorial da 34a Bienal de São Paulo: Jacopo Crivelli Visconti, curador-geral, Francesco Stocchi, curador convidado, Paulo Miyada, curador-adjunto, Ruth Estévez, curadora convidada e Carla Zaccagnini, curadora convidada Foto: Pedro Ivo Trasferetti / Fundação Bienal de São Paulo

— A vontade de ter um grupo de artistas o mais diverso possível sempre esteve no nosso horizonte. Vem muito mais do desejo de responder a questões sociais e históricas do que a algumas manifestações ou algum episódio específico — comenta Visconti. — A diversidade que almejamos não é só de números ou de cotas, mas que se refletisse no conjunto das obras. Que se possa estabelecer as relações de artistas não-binários da Ásia com uma obra da ( brasileira ) Carmela Gross e ao lado de um trabalho do Lasar Segall da época em que a Bienal foi fundada, há 70 anos. O desafio é buscar conexões que transcendam o imediato e se também comuniquem com a diversidade do público.

Contando com o apoio da União — o orçamento da 34ª edição está incluído no plano bianual 2020/2021 da Fundação Bienal de São Paulo, que captou R$ 26 milhões, segundo o site da Lei de Incentivo à Cultura — o evento será o primeiro realizado durante o governo Bolsonaro, num momento em que produtores e artistas travam batalhas judiciais contra a Secretaria Especial da Cultura pela liberação dos recursos da Rouanet. A possibilidade de protestos contra a agenda cultural do governo, entende Visconti, deve ser vista dentro de uma tradição de manifestações que marcam as sete décadas das bienais.

—  Historicamente,  a abertura da Bienal sempre propiciou choques de toda ordem. A gente vivenciou isso em edições recentes e nas mais históricas. É difícil imaginar o que vai acontecer na inauguração, até porque nem devemos ter uma abertura convencional este ano, pela pandemia. Mas até pela sua importância, ou pelo fato de não acontecer todo ano, há uma percepção que a Bienal é um espaço para que as pessoas se manifestem — diz Visconti. — É um orgulho e uma responsabilidade enormes ser o curador de uma Bienal num momento em que a sociedade precisa destas plataformas para debater política e socialmente.