Artes visuais
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Por Nelson Gobbi


A escultura de bronze 'Brick House' (2019), da artista americana Simone Leigh, fotografada na abertura para a imprensa da 59ª Bienal de Veneza AFP — Foto:
A escultura de bronze 'Brick House' (2019), da artista americana Simone Leigh, fotografada na abertura para a imprensa da 59ª Bienal de Veneza AFP — Foto:

Quando a Bienal de Veneza abriu as portas pela última vez, em 11 de maio de 2019, muitas questões presentes hoje na arte contemporânea já estavam em debate, mas não seria possível imaginar o mundo ao qual sua edição seguinte iria retornar. Neste sábado (23), o público volta finalmente ao principal evento de artes visuais no mundo, após um ano de adiamento causado pela pandemia de Covid-19, e sob a tensão das incertezas na economia global e da guerra na Ucrânia.

Com curadoria da italiana radicada em Nova York Cecilia Alemani, a 59ª edição da Bienal de Veneza tem seu título inspirado pela série de desenhos “The milk of dreams” (“O leite dos sonhos”), da artista surrealista inglesa Leonora Carrington (1917-2011), para abordar questões que envolvem o homem, o meio ambiente e a tecnologia. Com uma seleção mais diversa, tamto em relação à nacionalidades quanto à quantidade de artistas mulheres e não binários, a curadoria geral terá cinco brasileiros — Lenora de Barros, Rosana Paulino, Solange Pessoa, Luiz Roque e Jaider Esbell (1979-2021) — o maior número desde a Bienal de 2005.

A homenagem a Carrington durante um processo curatorial feito em sua maior parte remotamente busca novas formas de imaginar o mundo, não necessariamente por um olhar pós-apocalíptico, como defendeu Cecilia Alemani em entrevista ao GLOBO em fevereiro:

— A Bienal é inspirada no que os surrealistas chamavam de “marvelous,” um mergulho no inconsciente, no onírico. Como olhar a realidade através de uma nova perspectiva, de um possível reencantamento.

Ainda assim, as incertezas do presente disputam este imaginário a todo momento. Seja fora do evento principal, como na ação feita por voluntários próximo à Praça de São Marcos na semana passada, com a abertura da fotoinstalação de 40 metros com a imagem da menina ucraniana Valeriia, de cinco anos, projeto do artista e ativista francês JR que está correndo a Europa e estampou a capa da revista Time em março. Ou em meio às obras da Bienal, a exemplo da instalação “Fountain of exhaustion” (“Fonte da exaustão”), do artista Pavlo Makov, nascido em São Petesburgo mas que se considera um cidadão da Ucrânia, onde vive, em Kharkiv. Para montar a obra, constituída de vários funis de bronze, ao pavilhão ucraniano, a curadora Maria Lanko teve de levar todo o material em seu carro, de Kiev para Veneza, em meio à invasão russa.

— A Ucrânia tem a sua cultura e tem de estar ainda mais representada a nível internacional durante a guerra. O sentido (da obra) não mudou, trata-se do esgotamento da humanidade no mundo da democracia — comenta Makov, por e-mail.

Entre os brasileiros, as questões atuais também encontram eco, a exemplo das vídeoinstalações de Luiz Roque, “Urubu” (2020) e “XXI”, recém-finalizada:

— Em certa medida, são trabalhos decorrentes da pandemia. Tive perdas na família para a Covid-19. Mas os trabalhos não têm um marcador temporal forte, acredito que vão gerar novas leituras.

Entre os artistas brasileiros, Lenora de Barros vai apresentar a obra mais antiga, da série "Poema" (1979). A artista conta que Cecilia conheceu o trabalho na coletiva “Mulheres radicais: arte latino-americana 1960 — 1985”, que foi exibida na Pinacoteca de São Paulo em 2018 após passar por Los Angeles e Nova York. Para a brasileira, é possível perceber a presença de mais artistas mulheres e não binários na exposição principal:

— Não acredito em algo que possa ser chamado de "arte feminina", mas de algum modo a opção por uma curadoria mais diversa é perceptível. Não saberia explicar exatamente por que, mas existe um diferencial.

Obras da série 'Sonhiferas' (2020), de Solange Pessoa, que está entre os cinco artistas brasileiros na curadoria principal  AFP — Foto:
Obras da série 'Sonhiferas' (2020), de Solange Pessoa, que está entre os cinco artistas brasileiros na curadoria principal AFP — Foto:

Rosana Paulino irá apresentar 25 desenhos da série “Jatobá”, remetendo a relações do homem com elementos da natureza e representações de cosmogonias de origem africanas. A artista paulistana irá para Veneza em junho, aproveitando a abertura de uma individual na Mendes Woods de Bruxelas, na Bélgica. Antes, ela terá um compromisso no Rio: Rosana foi convidada para desfilar nesta sexta-feira pela Beija-Flor de Nilópolis, que levará um enredo anti-racista à Sapucaí.

— Espero que a Bienal realmente apresente outras visões de mundo, até porque esta hegemônica, Ocidental, vai nos levar à extinção — destaca Rosana. — A sabedoria dos povos periféricos, seja com ascendência indígena ou africana, traz um outro tipo de relação com a natureza.

Elementos naturais também estão na obra da mineira Solange Pessoa, que, além da série de pinturas “Sonhíferas”, traz uma grande instalação feita com 55 peças de pedra sabão, “Nehil novi sub sole”.

— Meu trabalho tem uma relação com a arte póvera italiana. A instalação ficou num grande espaço ao ar livre, e a pedra sabão tem uma textura, uma reação à luz diferente com a que estão acostumados aqui.

A presença de Jaider Esbell, que morreu em meio à 34ª Bienal de São Paulo, da qual era uma das estrelas, reforça o alcance da arte indígena contemporânea, como ele denominava.

— Além de um artista incrível, o Jaider era um grande articulador, muito consciente do que o sistema de arte queria para poder ocupar estes espaços — enaltece Jacopo Crivelli Visconti, curador da última Bienal de São Paulo, que assina o pavilhão brasileiro em Veneza.

A representação brasileira é ocupada por obras desenvolvidas pelo artista alogoano radicado no Recife Jonathas Andrade, que criou uma série de instalações e esculturas que reproduzem expressões idiomáticas, como “Fura-olho” ou “Com o coração saindo pela boca”, nome do grande trabalho inflável que dá título ao Pavilhão.

— Várias dessas expressões carregam um pouco da temperatura do Brasil atual. As obras criam também uma polifonia que traduz um pouco este estarrecimento com o que vem acontecendo no país nso últimos anos.

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