Cultura Artes visuais

Bienal Videobrasil, em São Paulo, investiga impactos da colonização

Evento no Sesc 24 de Maio tem obras de 55 artistas brasileiros e estrangeiros que refletem sobre novos nacionalismos, diásporas e sexualidades
SC São Paulo ( SP ) 07/10/2019 - 21° Bienal de Arte Contemporanea VideoBrasil. Na foto, Obra de No Martins - #jábasta. Foto : Edilson Dantas / Agencia O Globo Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
SC São Paulo ( SP ) 07/10/2019 - 21° Bienal de Arte Contemporanea VideoBrasil. Na foto, Obra de No Martins - #jábasta. Foto : Edilson Dantas / Agencia O Globo Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

SÃO Paulo - Desde 1983, ano de criação do Videobrasil, o suporte do vídeo se transformou não só em aspectos técnicos, mas também ganhou um espaço quase onipresente na produção contemporânea. Tais mudanças também se refletiram no evento, que passou a incorporar outras práticas artísticas, levando, por fim, a uma alteração no nome. Até 2017 chamada de festival, a Bienal de Arte Contemporânea Videobrasil ganha sua 21ª edição a partir de hoje, no Sesc 24 de Maio, em São Paulo.

Sob o tema “Comunidades imaginadas”, a Bienal reúne mais de 60 obras de 55 artistas (50 selecionados após convocatória internacional e cinco comissionados), mantendo o diálogo entre produções do chamado Sul Global: países da América Latina, África, Ásia, Oriente Médio e Oceania.

— Começamos como um festival para mapear a produção local de vídeo, depois abrimos para artistas estrangeiros e para outros formatos. O vídeo saiu da salinha escura e se entendeu bem com o espaço do cubo branco. E também com outras práticas, por sua agilidade para abordar questões urgentes — observa Solange Farkas, diretora artística e idealizadora da Bienal. — A mudança de nome foi consequência natural, até porque a gente já operava numa lógica de bienal.

Dividida em três plataformas, a curadoria ficou a cargo de Gabriel Bogossian (exposição), Luisa Duarte (programa público) e Miguel López (publicações). A proposta é abordar questões como os novos nacionalismos, diásporas e sexualidades.

— A localização do Sesc 24 de Maio contribui neste sentido. Estamos cercados por muitas dessas comunidades imaginadas, como os imigrantes de várias nacionalidades e os grupos LGBT — ressalta Bogossian. — Isso se reflete na exposição, porque muitas dessas questões estão no centro da produção dos artistas.

Banners de Monica Nador na Bienal Videobrasil Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Banners de Monica Nador na Bienal Videobrasil Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

A pressão crescente sobre artistas também se traduz no corpo de obras selecionado para a exposição.

— Este momento sufocante também é resultado de uma crise de imaginação, em que padrões voltam a ser impostos. Destacar essas poéticas críticas nos faz ver que podemos imaginar outro futuro — analisa Luisa.

Uma das obras que reimaginam passado e presente é a do beninense residente na Holanda Thierry Oussou. Em diálogo com de “Impossible is nothing” — performance de 2016 na qual uma réplica do trono do rei Béhanzin, levado da antiga Daomé para a França, é desenterrado — Oussou foi ao Rio investigar as ruínas do Museu Nacional e o Instituto de Pesquisa e Memória dos Pretos Novos, para a videoinstalação “What is left of the sugar cubes?”.

— As imagens do incêndio me impressionaram. Há um apagamento da história, como também existe na região onde desembarcaram os africanos escravizados — comenta Oussou. — O papel do artista é lutar contra os novos apagamentos.

Também propondo um novo espaço para a tradição, a peruana Claudia Martínez Garay revê a cerâmica pré-colombiana combinada a referências contemporâneas na instalação “¡Somos aún!”.

A peruana Claudia Martínez Garay na instalação “¡Somos aún!” Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
A peruana Claudia Martínez Garay na instalação “¡Somos aún!” Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

— Vivendo na Holanda, quis trabalhar com questões de nostalgia e identidade — diz Claudia, que cresceu em Lima mas nasceu em Ayacucho, ao Sul do país. — Questiono também por que uma cerâmica moche entra no museu como arte étnica e não no mesmo patamar de uma pintura europeia.

Já o recifense Jonathas de Andrade levou para a Jordânia uma busca histórica fictícia, em “Procurando Jesus”. O artista fotografou 20 homens em Aman e depois fez uma pesquisa nas ruas da cidade, perguntando qual seria mais parecido com Jesus.

A performance/instalação se conecta ao projeto original de Andrade, o Museu do Homem do Nordeste.

— Tanto no caso da imagem eurocêntrica de Jesus quanto na visão sobre o Nordeste, falamos de estereótipos que passam pela colonização cultural.

Nelson Gobbi viajou a convite da Bienal