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Cultura Artes visuais

Ernesto Neto cria instalação gigante para estação de trem de Zurique

'GaiaMotherTree' propõe transformar espaço de passagem em lugar de encontro
Projeto de Ernesto Neto para 'GaiaMotherTree', que será montada em Zurique em junho Foto: Reprodução
Projeto de Ernesto Neto para 'GaiaMotherTree', que será montada em Zurique em junho Foto: Reprodução

RIO — Projetada para ocupar a principal estação ferroviária de Zurique, a instalação “GaiaMotherTree” terá 20 metros de altura, ligando o espaço do chão ao teto, inteiramente confeccionada à mão com tiras de algodão. A proposta nasceu da vontade de Sam Keller de comissionar, por meio da Fondation Beyeler, uma obra em grande escala de Ernesto Neto no país. Amigo de longa data e admirador do trabalho do brasileiro, o diretor do museu lembra do encontro que tiveram no local, há dois anos, quando o artista começou a desenvolver o projeto.

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— Mesmo antes de conhecê-lo, já acompanhava o trabalho do Ernesto Neto em feiras de arte, instituições ou eventos como a Bienal de Veneza. Depois passei também a admirá-lo como o grande ser humano que é. Há algum tempo pensávamos na possibilidade de ele desenvolver um trabalho em grande escala, inicialmente em Basel, mas depois surgiu a oportunidade de fazer em Zurique — comenta Keller. — Nos encontramos em Zurique, lembro que estava muito frio e tomávamos café e chocolate quente, e ele começou a desenhar o projeto na hora, em um guardanapo. Já tinha esse aspecto monumental, de uma grande árvore, que ia até o teto da estação.

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Imaginada como uma árvore da vida, a instalação será confeccionada em crochê de voile de algodão e terá elementos como cestos de palha, especiarias, terra, plantas e cascalho, com bancos e almofadas para que o público fique em seu interior.

— A ideia começou a surgir na hora em que eu e o Sam estávamos na estação. A criação passa por um caminho muito menos racional do que as pessoas creem. É preciso estar no ambiente, sentir a atmosfera, a respiração, as tensões. O racional entra depois, no desenvolvimento do projeto, na hora de colocar de pé — destaca Neto.

Ernesto Neto, no Guggenheim Bilbao, em 2014 Foto: Divulgação
Ernesto Neto, no Guggenheim Bilbao, em 2014 Foto: Divulgação

O artista salienta a proposta de transformar um espaço de passagem em um lugar de encontros.

— A instalação foi pensada em uma característica forte do Brasil, a interatividade. Ela aparece numa roda de samba, num ambiente de conversa ou numa roda indígena — explica Neto, que começará a executar a montagem da obra em 24 de junho. — Sempre quis que meus trabalhos fossem além das paredes das galerias ou dos textos especializados. Ali é um lugar de passagem, mas onde as pessoas podem se encontrar, ter um momento de pausa.

Neto espera que o público suíço aproveite o ambiente imaginado por ele como uma forma de reencontro com a natureza, como ocorreu em outras instalações montadas na Europa, como “Leviathan Thot”, que ocupou o Panthéon de Paris, em 2006, ou “Um sagrado lugar”, desenvolvido para a Bienal de Veneza do ano passado:

— Pensamos muito em outros povos a partir das diferenças, quando as semelhanças são maiores. Os suíços ficam alegres, tristes, vão ao banheiro como nós. Espero que eles se sintam à vontade na instalação.

O debate de hoje faz parte do “Artist talks”, programa internacional da Fondation Beyeler no qual artistas contemporâneos falam sobre os seus trabalhos, e é produzido na EAV pelo Instituto Inclusartiz. Presidido pela colecionadora argentina radicada no Rio Frances Reynolds, o Inclusartiz mantém um programa de residências que já recebeu no Rio nomes como o britânico Christopher Page e a polonesa Joanna Piotrowska.

— A nossa proposta é de promover encontros e compartilhar conhecimento. Seja quando um artista ou intelectual de fora vem nos visitar, ou apresentando o trabalho de um criador brasileiro de uma forma diferente. O debate é uma chance de o público daqui saber mais sobre uma obra que será executada na Suíça, a difusão da arte brasileira no exterior — ressalta Frances.