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MoMA compra a tela 'A lua', de Tarsila do Amaral; profissionais do mercado falam em US$ 20 milhões

Se confirmado o valor, obra é a mais cara já vendida de um artista brasileiro, superando 'Vaso de flores', de Guignard
Detalhe da tela 'A lua', adquirida pelo Museu de Arte Moderna de Nova York Foto: Divulgação MoMA
Detalhe da tela 'A lua', adquirida pelo Museu de Arte Moderna de Nova York Foto: Divulgação MoMA

RIO — Após sediar uma grande retrospectiva de Tarsila do Amaral, de fevereiro a junho do ano passado, o Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York anunciou nesta quarta-feira a aquisição da tela “A lua”, de 1928. A obra pertencia, desde a década de 1950, à coleção Feffer, família fundadora da fábrica de papel Suzano. A informação foi antecipada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”.

Profissionais do mercado de arte citam um valor aproximado de US$ 20 milhões, algo em torno de R$ 74 milhões, para a venda. O galerista Paulo Kuczynski, que intermediou a negociação, não confirma esse número. Ele diz que há um acordo de sigilo do museu.

— Vai ter um monte de palpites e suposições, mas o valor não será divulgado — garante ele.

Se forem confirmados os US$ 20 milhões, Tarsila passaria a ser a artista brasileira com a obra mais cara já vendida, superando “Vaso de flores”, de Guignard, arrematado em um leilão em 2015 por R$ 5,7 milhões. Obra-símbolo do modernismo brasileiro, “Abaporu” foi adquirida pelo Museu de Arte Latinoamericano de Buenos Aires (Malba) por US$ 1,4 milhão em 1995, em um leilão da Christie’s. Hoje, devido à valorização da pintora no mercado internacional e da pouca oferta de obras, além do reconhecimento da importância do modernismo brasileiro, especula-se que o valor da tela poderia estar próximo de R$ 100 milhões.

— Desde a exposição que o MoMA já mostrava interesse em adquirir uma obra da Tarsila. Para a família é fantástico ver esse reconhecimento crescente, com uma tela chegando a volores próximos a de grandes pintores do século XX — celebra Tarsila do Amaral, sobrinha-neta e administradora do espólio da artista, conhecida como Tarsilinha. — Hoje as instituições reconhecem para para abordar as vanguardas do século passado é preciso tratar do modernismo brasileiro, e minha tia vem como uma figura central neste processo. Mesmo não participando da Semana de 1922, a proximidade do centenário também ajuda a reverberar a importância dela para a arte brasileira.

Museu possui várias obras de brasileiros

O MoMA possui várias obras de artistas brasileiros em seu acervo. Parte delas integra a grande doação realizada em 2016 pela colecionadora venezuelana Patricia Phelps de Cisneros: Waldemar Cordeiro, Alfredo Volpi, Lygia Clark, Helio Oiticica, Beatriz Milhazes, Adriana Varejão, Abraham Palatnik, Jac Leirner são alguns dos nomes. Mas o museu também adquire peças. Em 2015, comprou a instalação "Ão", uma das obras mais emblemáticas do pernambucano  Tunga (1952-2016).

A compra de "A lua" foi anunciada pelo museu nesta quarta-feira, em comunicado no qual o museu diz que sua coleção passa a contar com a "primeira pintura da mais importante modernista da primeira geração". "A exposição do ano passado, co-organizada por Luis Pérez-Oramas e Stephanie D'Alessandro, confirmou nossa crença de que uma pintura de Tarsila seria essencial para a coleção do MoMA. Sabíamos, contudo, que encontrar uma obra sua seria o principal desafio. Nos sentimos extremamente felizes em acrescentar seu trabalho à história que contamos em nossas galeriasdo quinto andar", destaca Ann Temkin, curadora-chefe de pintura e escultura da instituição nova-iorquina.

Paulo Kuczynski  destaca a importância de o MoMA adquirir, pela primeira vez, uma obra modernista brasileira, da primeira metade do século XX.

— É uma obra cara, vai estar ao lado de Picasso, Bracque, da melhor exposição de arte moderna do mundo. Tarsila, que é do modernismo brasileiro, passa a um outro patamar, o do modernismo universal.

Antes da tela , o museu tinha na coleção o "Estudo de composição (Figura só) III", desenho em tinta e lápis sobre papel, datado de 1930, doado pelo marchand Max Perlingeiro à instituição no ano passado.

— O "Estudo" integrou as exposições do MoMA e do Instituto de Artes de Chicago, em 2017. O interesse do museu em adquirir mais uma obra dela demosntra sua importância em nível internacional — destaca Perlingeiro, dono da Pinakotheke Cultural. — Até pela alta demanda e a inexistencia de oferta, esta venda pode valorizar obras de outras fases de Tarsila, como a neoantropofagia dos anos 1940 e as paisagens tardias, dos anos 1950. E, claro, jogar luz na produção de outros artistas contemporâneos.

Obra é da melhor fase, a antropofágica

"A lua" pertence à fase mais celebrada de Tarsila (1886–1973), chamada Antropofágica, que compreende obras entre 1928 e 1930. São dela também algumas das obras mais conhecidas da pintora, que pertencem a acervos de instituições e coleções renomadas. São desta fase o já citado "Abaporu" (1928), em exibição no Malba; "Urutu" (1928),  da Coleção Chateaubriand-MAM RJ; "Antropofagia" (1929), da Coleção Nemirovsky, em comodato na Pinacoteca do Estado de São Paulo; "Floresta" (1929), do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP; e "Sol poente" (1929), da Coleção Boghici.

Após ter mais de 130 obras reunidas na restrospectiva  “Tarsila do Amaral: inventando a arte moderna no Brasil”, no MoMA, a pintora ganhará uma grande exposição no Masp a partir de abril. "Tarsila popular" vai reunir mais de 160 obras da modernista (incluindo "Abaporu") no ano em que o museu vai destacar a produção das mulheres, em individuais de Djanira (1914 - 1979) e Anna Bella Geiger, e a coletiva "Histórias das mulheres, histórias feministas", em agosto.