Artes visuais
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Por — Madri

O museu suíço Langmatt vendeu recentemente três quadros do pintor impressionista Paul Cézanne (1839-1906) para não fechar as portas definitivamente. O anúncio do leilão na Christie's reabriu um debate no mundo da arte que envolve questões complexas como a proteção do patrimônio artístico, a necessidade de salvar os empregos de centenas de pessoas e garantir sobrevivência de um centro cultural, a possibilidade de museus venderem obras para ampliar ou renovar as suas coleções e o papel dos Estados no meio disso tudo.

“Era o fim”, disse ao El Pais Markus Stegmann, diretor do museu Langmatt, na cidade suíça de Baden, que abriga uma das mais importantes coleções de arte impressionista da Europa. “A fundação que gere o museu já não tinha capital”, explicou Stegmann. “Precisávamos de 40 milhões de francos suíços (43 milhões de euros) e depois de anos tentando encontrar outra solução optamos por vender três quadros de uma coleção de cerca de 50”. No fim, conseguiram mais do que precisavam: 48 milhões de euros pelas três telas no leilão da Christie's em setembro passado. Museu salvo.

Mas esse é só o final dessa história.

"La mer à l'Estaque", obra de Paul Cézanne. — Foto: Christie's/ Divulgação
"La mer à l'Estaque", obra de Paul Cézanne. — Foto: Christie's/ Divulgação

O quadro da família Goldsmith

O Langmatt escolheu vender “Quatre pommes et un couteau” (Quatro maças e uma faca), “La mer à l'Estaque” (O mar em Estaque) e “Fruits et pot de gingembre” (Frutas e pote de gengibre). Nesta última pintura, o museu depositou suas maiores esperanças, que se concretizaram quando a Christie's estimou seu valor entre 35 e 55 milhões de dólares. A tela, a mais cara das três, foi vendida por 39 milhões de dólares.

Sidney e Jenny Brown, o casal que fundou o Langmatt, compraram “Fruits et pot de gingembre” em 1933, em Lucerna, Suíça, dos Goldsmith, família de judeus alemães mercadores de arte, por 57.750 francos suíços. Um valor que Stegmann considera dentro da média dos preços praticados na época, embora não saiba o quanto desse montante foi parar nos bolsos dos proprietários originais. Até então, parecia uma típica transação comercial entre duas galerias de arte.

No entanto, já de posse do quadro de Cézanne, a Christie descobriu que a família Goldsmith não escapou da perseguição nazista e Jacob, o primeiro dono da obra, se viu obrigado (e coagido) a se desfazer de parte de sua coleção. “Em janeiro de 2022, iniciamos uma investigação com especialistas de fora do museu sobre 13 obras adquiridas entre 1933 e 1941, ano da morte de Sidney Brown”, explicou o diretor do Langmatt. “No caso desta pintura, não encontramos evidências claras até o anúncio do leilão.”

Diante disso, os herdeiros de Jacob Goldsmith foram contatados. Mara Wantuch-Thole, advogada que representa o neto do negociante judeu, explicou ao jornal The New York Times que seu cliente não sabia que o avô fora dono da pintura de Cézanne até ser procurado pelo museu. “Chegamos a um acordo”, disse a advogada ao jornal americano. O diretor do Langmatt, porém, recusou-se a dar mais detalhes do que chama de “uma solução justa e equitativa”. “É confidencial”, concluiu.

Vender três quadros para pagar boletos

A venda de quadros de Cézanne em território europeu suscitou um debate mais comum em países como os Estados Unidos, onde a gestão de grandes galerias de arte é assunto de pessoas jurídicas e filantropos, com pouca participação dos governos (isto é, financiamento público).

O Icom, Conselho Internacional de Museus, através do seu representante suíço, Tobia Bezzola, foi o primeiro a alertar para o perigo da venda, que qualificou de “escandalosa e míope”, além de denunciar violações do Código de Ética da organização. “Obras são doadas aos museus porque as pessoas acreditam que lá elas estarão seguras”, disse Bezzola à imprensa suíça. Ele exigiu que o leilão não acontecesse. “Todas as coleções importantes da Suíça vêm de doações. Esse leilão envia um recado terrível aos doadores”, afirmou.

“Estas críticas se baseiam em diretrizes que devem ser renovadas e adaptadas ao nosso tempo”, insistiu o diretor do Langmatt. “O Código de Ética não prevê uma emergência existencial em um museu. Há 40 anos as coisas eram diferentes”, sublinhou ele, acrescentando que “na Europa os museus recebem cada vez menos dinheiro público”.

Nos EUA, vários casos semelhantes aconteceram recentemente. Durante a pandemia, o Museu do Brooklyn, em Nova York, colocou à venda, também na Christie's, 12 pinturas, entre as quais estavam obras de nomes importantes como Cranach, o Velho, e Courbet, para arrecadar 40 milhões de dólares e amortecer a crise econômica resultante da queda acentuada do número de visitantes devido ao colapso do turismo. Esse exemplo levou Associação de Diretores de Museus dos EUA (AAMD) a determinar que, até abril de 2022, não fossem penalizadas “vendas que sirvam para pagar despesas associadas ao cuidado das coleções”.

Em outras palavras, foram estabelecidas novas diretrizes que permitiam algumas transações comerciais. “Não foi estabelecido nenhum tipo de precedente porque essa decisão terminou em 2022”, disse a AAMD ao El Pais. “Na verdade, apenas alguns museus venderam obras para dar conta de necessidades financeiras.” Quantos? “Não temos essa informação”, afirma a associação.

‘Museus não são supermercados’

Quando o martelo do leiloeiro soou na Christie's, em setembro, os funcionários no Langmatt suspiraram aliviados. Foi a solução mais extrema que encontraram e, exclamou o diretor, “isso não significa que os museus tenham que vender suas coleções”. “Isso seria extremamente perigoso. Museus não são supermercados!”

Stegmann rejeita que sua decisão estabeleça um precedente na Europa. “Foi uma situação absolutamente atípica e deve ser considerado dessa forma”, disse ele. “A existência do Langmatt estava ameaçada. Conseguimos superar a crise sem destruir nosso acervo e nossa identidade.”

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