Em sua quarta edição, a Bienalsur (Bienal Internacional de Arte Contemporáneo del Sur) voltou a itinerar pelo Rio, em exposição inaugurada na semana passada no Centro Cultural Banco do Brasil, após passar pelos CCBBs de Brasília e São Paulo. Iniciado em 2017 (ano em que a cidade recebeu, na Fundação Getúlio Vargas, a instalação da série “Notatorio”, da argentina Marcolina Dipierro), o evento tem origem em um projeto do Museu da Universidade Nacional Tres de Febrero (Muntref), de Buenos Aires, com a proposta de viajar por várias cidades do mundo, a partir de propostas artísticas de curadores e artistas de diferentes países. A edição de 2023 encerra sua itinerância no Rio, tendo passado por 70 cidades e 28 países, com a participação de mais de 700 artistas e 64 curadores.
Com o título de “Signos na paisagem”, a mostra no CCBB do Rio reúne trabalhos das argentinas Gabriela Golder e Matilde Marín; da uruguaia Alejandra González Soca; da espanhola Gabriela Bettini; da francesa Stephanie Pommeret; dos sauditas Sara Abdu, Zhara Al Ghamdi e Hatem Al Ahmad — o Brasil está representado pela dupla Dias & Riedweg e Rochelle Costi (1961-2022).
A partir do recorte proposto para esta edição, os artistas desenvolveram obras com as mais amplas abordagens sobre o tema, sejam elas a visão de um ponto específico no espaço, como as fotografias da série “Temas sobre a paisagem”, de Matilde Marín, ou um horizonte criado por uma perspectiva pessoal e interior, como as 16 imagens digitais da série “Silêncio”, feitas por Dias & Riedweg em 2020, durante o confinamento na pandemia de Covid-19.
— Sou uma artista que trabalha com documentação e memória, essa é uma grande série que desenvolvi com vários horizontes, a maioria deles do sul da Patagônia argentina — comenta Matilde, uma das artistas presentes à inauguração da mostra, na semana passada. — Uma das fotos é de um radal, árvore típica da região, que tinha 150 anos. No ano passado, voltei ao local e a árvore não estava mais lá, foi partida ao meio por um raio numa tempestade elétrica. Vou à Patagônia com frequência há quase 40 anos e vejo as mudanças, as geleiras derretendo, um calor que não existia, assim como as tempestades elétricas.
![A diretora artística da Bienalsur, Diana Wechsler — Foto: Guito Moreto](https://s2-oglobo.glbimg.com/XY04rNbVAP_bkKSEI2ISLE50I58=/0x0:3360x5040/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/j/Q/qKmKbeRXA46AfrX79Oew/106290301-rio-de-janeiro-rj-19032024-segundo-caderno-artes-pasticas-exposicao-signos-na-paisagem.jpg)
Suíço radicado no Brasil, Walter Riedweg formou em 1993 com o carioca Mauricio Dias a dupla artística que leva seus sobrenomes. As fotos da série “Silêncio” passam por intervenções digitais para retirar, pixel por pixel, partes das imagens, o que confere a elas uma aparência de gravura.
— Depois de decretada a pandemia, o Mauricio estava no Rio e eu na Suíça, não pude voltar nos primeiros cinco primeiros meses. Então começamos a trabalhar à distância, percebendo o silêncio que tomou conta do mundo que nos cercava —destaca Riedweg. — Apesar de falar de um período específico, essa série traz muitos elementos presentes nos nossos trabalhos anteriores, como a questão da memória, o lado político-social e a fragmentação do contemporâneo.
Levado pela argentina Gabriela Golder à mostra, o vídeo “Tierra quemada” (2015) também registra uma paisagem em transformação na tensa relação entre natureza e ação humana. Gravado após um incêndio em Cerro Mariposa, na região de Valparaíso, no Chile, a obra capta uma paradoxal placidez da área de vegetação e casas devastada pelas chamas.
— A versão oficial era de que um pássaro pousou num fio de alta tensão e causou o incêndio, mas a suspeita era de uma ação criminosa, por especulação imobiliária. Isso vemos acontecer em todos os nossos países, no Chile, na Argentina, na Amazônia brasileira — compara Gabriela. — Sem contar com os efeitos das mudanças no clima agravados por governos negacionistas, como vocês tinham aqui e que temos agora na Argentina. O nosso papel como artistas é resistir, contra quem odeia a arte, a terra, a troca de ideias.
Veja obras da Bienalsur no CCBB do Rio
![Obra da série 'Casa & jardim', de Rochelle Costi — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/5zdLw6MP1ujMFMO1APMbZEy1ua8=/0x0:2629x1181/648x248/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/y/8/J6f7AlS3W6N1YpcUmh8A/rochelle-costi-casa-e-jardim-paisagem-5.jpg)
![Obra da série 'Casa & jardim', de Rochelle Costi — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/JTD4g88y8TDaENDC4X_2qGy-LIQ=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/y/8/J6f7AlS3W6N1YpcUmh8A/rochelle-costi-casa-e-jardim-paisagem-5.jpg)
Obra da série 'Casa & jardim', de Rochelle Costi — Foto: Divulgação
![Obra da série 'Casa & jardim', de Rochelle Costi — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/49GA2hcg6MjiGhJnYFHw_JPYJfI=/0x0:2665x1191/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/N/w/ey1GYLTU2TBwsuaidSDQ/rochelle-costi-casa-e-jardim-paisagem-9.jpg)
![Obra da série 'Casa & jardim', de Rochelle Costi — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/4HPHQinnLepJ2z_PR5RCQs7HfRI=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/N/w/ey1GYLTU2TBwsuaidSDQ/rochelle-costi-casa-e-jardim-paisagem-9.jpg)
Obra da série 'Casa & jardim', de Rochelle Costi — Foto: Divulgação
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![Visão geral da exposição — Foto: Guito Moreto](https://s2-oglobo.glbimg.com/msayPkRL7yGqjvalp3UIz70OtxA=/0x0:5040x3360/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/X/1/8uecGpRLSJK2MmDoZGXw/106290285-rio-de-janeiro-rj-19032024-segundo-caderno-artes-pasticas-exposicao-signos-na-paisagem.jpg)
![Visão geral da exposição — Foto: Guito Moreto](https://s2-oglobo.glbimg.com/Lna-DQlaSVceeyrZAdpihXRZwFg=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/X/1/8uecGpRLSJK2MmDoZGXw/106290285-rio-de-janeiro-rj-19032024-segundo-caderno-artes-pasticas-exposicao-signos-na-paisagem.jpg)
Visão geral da exposição — Foto: Guito Moreto
![Obra da série 'Silêncio', de Dias & Riedweg — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/dKPaekRNr2kEmoolhCN-z-_hPbs=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/C/h/y17GhcSsKeYCARBBfn9g/dias-riedweg-silence-5.jpg)
Obra da série 'Silêncio', de Dias & Riedweg — Foto: Divulgação
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![Instalação 'Moebius', da uruguaia Alejandra González Soca — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/IQ4fFL71wm2yVWgAmZix0iKIm2U=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/G/9/7NHBffQdi51ggEm1C9zg/alejandra-gonzalez-soca-moebius-2-foto-divulgacao.jpg)
Instalação 'Moebius', da uruguaia Alejandra González Soca — Foto: Divulgação
![Foto da série 'Temas sobre a paisagem', da argentina Matilde Marín — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/K-p2P08UNdw_m8XBSXZIPXnh3_c=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/t/a/u2TI6LTMa0qXp0HOJUaA/matilde-marin-temas-sobre-a-paisagem-1.jpg)
Foto da série 'Temas sobre a paisagem', da argentina Matilde Marín — Foto: Divulgação
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![Still do vídeo 'Tierra quemada', da argentina Gabriela Golder — Foto: Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/2paCv84RsF1q7zs0oEd3s2xyIL4=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/m/A/AiBcZqTt2zy3USWYAUuw/gabriela-golder-still-scorched-earth-3.jpg)
Still do vídeo 'Tierra quemada', da argentina Gabriela Golder — Foto: Divulgação
A terra e a vegetação também estão presentes na obra de Alejandra González Soca, a instalação “Moebius”, formada por uma plataforma de terra, moldada em alguns pontos com uma forma que reproduz o rosto da uruguaia, tendo ao centro uma tela de vídeo que exibe uma performance sua. Em toda a superfície foram plantadas sementes comestíveis, como chia e linhaça, que vão brotando ao longo da exposição, modificando o trabalho.
— O molde do meu rosto foi feito há dez anos, e o meu rosto no vídeo é de agora. É também um trabalho sobre a passagem do tempo, a efemeridade da vida — reflete Alejandra, que foi a cada cidade em que a obra foi exibida para preparar a terra. — Faz parte da essência da obra este cuidado com a terra, para que as sementes cresçam e a obra se modifique. Depois vou acompanhando a sua transformação pelo o que vejo nas redes sociais e nos registros que me mandam.
Diretora artística da Bienalsur, a argentina Diana Wechsler conta que a proposta do evento é ser a mais horizontal possível, com os artistas sugerindo obras por meio de uma chamada aberta, e os temas surgindo a partir dessa interação. Para a edição de 2025, a convocatória da Bienalsur recebe propostas até o dia 8 de abril.
— Queríamos uma bienal com outra lógica, que não fosse numa cidade fixa, com temas pré-determinados, centrada na figura de um curador. Trabalhamos então em parceria com instituições de vários lugares do mundo, adaptando o formato das exposições às possibilidades das cidades que vão recebê-las — explica Diana.
A argentina salienta a importância, para o público brasileiro, da mostra trazer um dos últimos trabalhos de Rochelle Costi, a série “Casa & jardim”, realizada no período de isolamento social, entre 2020 e 2021. Rochelle morreu aos 61 anos, após ser atropelada ao sair do Museu da Imagem e do Som, em São Paulo, em novembro de 2022:
— Quando Rochelle apresentou o projeto, todos nós nos interessamos em exibi-lo. Era uma artista que, como os outros da Bienalsur, acreditava em outras formas de trabalhar e levar as obras ao público. Infelizmente veio o acidente, e a mostra se transformou em uma pequena homenagem, a sua memória e trajetória.