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'Tunga: conjunções magnéticas': exposição em São Paulo revê as cinco décadas de trajetória do artista

Mostra no Itaú Cultural com 300 obras abrange desde trabalhos do início da carreira, nos anos 1970, até algumas de suas últimas criações, de 2015
Mostra 'Tunga: Conjunções magnéticas' abre no Itaú Cultural e no Instituto Tomie Ohtake Foto: Divulgação/Gabi Carrera
Mostra 'Tunga: Conjunções magnéticas' abre no Itaú Cultural e no Instituto Tomie Ohtake Foto: Divulgação/Gabi Carrera

As 300 obras da exposição “Tunga: conjunções magnéticas”, que o Itaú Cultural e o Instituto Tomie Ohtake abrem em conjunto hoje, abrangem desde trabalhos do início da carreira, nos anos 1970, até algumas de suas últimas criações, datadas de 2015 — o pernambucano que passou a maior parte da vida no Rio morreu em 2016, aos 64 anos, em decorrência de um câncer.

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A maior exposição já dedicada no país ao artista, nome central da cena contemporânea brasileira, revela tanto a pluralidade de sua pesquisa em diferentes áreas do conhecimento quanto o caráter irrequieto de sua produção, dos desenhos às instalações que o projetaram no exterior, justapondo materiais como cristais, líquidos, resinas, metais, tecidos, papéis e fios.

Os trabalhos de Tunga — nascido Antônio José de Barros Carvalho e Mello Mourão, na cidade de Palmares, em 1952 — se espalham nos três pavimentos do Itaú Cultural, na Avenida Paulista, sem um apontamento retrospectivo, com obras de diferentes épocas expostas lado a lado. No Tomie Ohtake, em Pinheiros, estão alguns desenhos e duas instalações de grande porte, incluindo a “Gravitação magnética” que dá nome à mostra.

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Corpo e sexualidade

Para Paulo Venâncio Filho, curador da exposição, apesar de sua projeção no exterior, onde expôs em algumas das maiores instituições do mundo — a exemplo do MoMA, em Nova York, e do Louvre, em Paris —, a mostra busca jogar luz sobre a produção de Tunga para o próprio público brasileiro.

— As obras não envelheceram. Embora tenha peças em grandes museus, ele não foi descoberto no plano que merecia. Tunga tem uma importância única na arte brasileira. Não é [o produtor de] um trabalho conceitual, pop, minimal. Ele se desloca das tendências contemporâneas recentes. Parece até algo antigo, que poderia ter sido feito há 200 anos — afirma o curador.

Instalação na mostra 'Tunga: Conjunções magnéticas' Foto: Divulgação/Rômulo Fialdini
Instalação na mostra 'Tunga: Conjunções magnéticas' Foto: Divulgação/Rômulo Fialdini

Venâncio conheceu Tunga antes de sua primeira exposição individual, em 1974. Ambos estudaram Arquitetura na mesma Universidade Santa Úrsula, em Botafogo, no Rio. Foram amigos e, da proximidade, o curador diz lembrar do “esplendor” com o qual o artista lidava com sua produção artística. Havia claro cuidado com a escolha de materiais e o rigor para executá-las.

— Ele não via a obra de arte como uma coisa qualquer. Sempre teve esse caráter de [considerar a obra artística como] algo mais elevado que as coisas comuns. Há algo poético nas relações que ele faz, é intrigante — explica Venâncio.

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No Itaú Cultural é possível ver obras que representam dois temas recorrentes na obra do artista: o corpo e a sexualidade. Há, nesse cenário, os mais diferentes tamanhos e versões de dedos, ossos e fios de cabelo. O corpo feminino surge em desenhos guardados em cadernetas de artistas e em versões maiores, enquadradas e expostas nas paredes.

Há também a visão de dentes em variadas versões. Em resina, preparados em tamanhos semelhantes aos naturais e em uma cascata metálica de alumínio, agigantados. O motivo para essa obsessão, o artista explicou em uma entrevista em 2010: “Eu acredito que a boca seja uma bela galeria de ossos, onde os ossos humanos são expostos. Quando você sorri, você está mostrando seus ossos, é a coisa mais interna que você tem”.

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’Gravitação magnética’

Reunindo itens de ateliê, mais de 30 obras de coleções privadas e seis de acervos públicos, a exposição oferece ao público, no Tomie Ohtake, a oportunidade de ver a remontagem de “Gravitação magnética”: o espigão metálico de 10 metros de altura, de onde sai uma cascata de 300 quilômetros de fios de metal, foi instalado uma única vez na 19ª Bienal de São Paulo, em 1987. O espaço também exibe o filme-instalação “ÃO” (1981), que atualmente só pode ser visto na galeria dedicada a Tunga em Inhotim (MG). “Gravitação magnética” será uma descoberta inclusive para Antônio Mourão, filho do artista e presidente do instituto que preserva o legado de Tunga:

— Eu não vi [essa obra] . Terei essa emoção pela primeira vez agora e quero que todos que não tiveram essa oportunidade possam experimentá-la. E quem, porventura, esteve na Bienal em que foi exibida, que sinta essa emoção mais uma vez.