RIO - Um pedaço considerável da música brasileira de sucesso foi esta quinta-feira ao Palácio do Planalto para participar de uma cerimônia de homenagem ao presidente Jair Bolsonaro, na qual também foram feitas algumas reivindicações. Sozinhos, Henrique & Juliano, Cristiano (da dupla Zé Neto & Cristiano ), Matheus & Kauan e João Neto & Frederico respondem por dezenas de músicas que ocuparam as posições mais altas das paradas do rádio e do streaming nos últimos dois anos.
ATUALIZAÇÃO : O artigo foi escrito com base na lista de presença divulgada pelo Palácio do Planalto. Vários artistas, como Cristiano, Matheus & Kauan, Bruno & Marrone e Cesar Menoti & Fabiano, no entanto, porteriormente negaram participação no evento, e o próprio Planalto divulgou uma nova lista corrigindo de 56 para 28 o número de artistas presentes. Leia a atualização aqui: Matheus & Kauan e outros sertanejos negam participação em evento com Jair Bolsonaro
"Liberdade provisória" (Henrique e Juliano) e "Bebi minha bicicleta" (Zé Neto & Cristiano) estão no 3º e no 4º lugares do mais recente Top 100 Brasil das rádios levantado pela Crowley Broadcast Analysis . E no Top Brasil do Spotify (a principal plataforma de streaming) desta semana, as mesmas faixas ocupam o 6º e o 9º lugar.
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Essas duplas masculinas são uma boa expressão da primazia do sertanejo (encabeçado hoje, no entanto, por mulheres como Marilia Mendonça e Maiara e Maraisa , que não foram ao encontro com Bolsonaro) na composição de estilos que faz os hits brasileiros de 2020.
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E a presença na cerimônia de demais astros, todos homens, mas da música sertaneja de outras épocas — Bruno e Marrone , Cesar Menotti e Fabiano , Teodoro e Sampaio , Duduca e Dalvan (autores de "Massa falida" , a música citada por Lula ao sair da prisão, em novembro do ano passado ), Gian e Giovani — só evidencia o quanto o estilo ainda está preso a velhos padrões.
Veio a revolução feminina no sertanejo mas as letras das músicas continuam a falar de família, de álcool e de amores ruins (sob o rótulo da "sofrência"), numa perspectiva moralista, heterossexual e branca que os outros donos do sucesso do Brasil (o pop, o funk e os ritmos regionais do Nordeste) há muito cuidaram de dinamitar.
![O presidente Fernando Collor de Mello, em 1992, comemorando seu aniversário na casa da Dinda com os sertanejos Chitãozinho e Leandro Foto: Ricardo Stuckert / Agência O Globo](https://ogimg.infoglobo.com.br/in/24217951-570-4c4/FT1086A/33076364_Brasilia-DF08-08-1992Fernando-Collor-de-Mello-Presidente-da-RepublicaFernando-Coll.jpg)
Involuntariamente ou não, o bloco majoritariamente sertanejo que foi ao encontro de Bolsonaro (um presidente que costuma revelar suas preferências musicais comparecendo à Feira do Peão de Barretos e à Marcha para Jesus ) ecoa as festas na Casa da Dinda, do presidente Fernando Collor de Mello , animadas por duplas como Chitãozinho & Xororó, Zezé di Camargo & Luciano e Leandro & Leonardo .
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![O candidato do PT à Presidência da República, Luís Inácio Lula da Silva, em 2002, acompanhado pela dupla sertaneja Zezé di Camargo e Luciano Foto: Carlos Casaes / Agência A Tarde](https://ogimg.infoglobo.com.br/in/24217976-72c-541/FT1086A/39527121_paO-candidato-do-PT-a-Presidencia-da-Republica-Luis-Inacio-Lula-da-Silva-acompanhado-de.jpg)
Os governos mudam e os sertanejos, a bem da verdade, também mudam — Zezé di Camargo, por exemplo, apoiou o PT durante a presidência de Lula e depois declarou sua simpatia por Bolsonaro. O que parece não mudar é a opção de boa parte desses artistas populares pela conservação dos valores e sinecuras de um país idílico, interiorano e religioso, puxando o freio em tempos de acelerada transformação urbana e comportamental.