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Cultura

Cinemas do Rio reabrem com pipoca e regras rígidas para despertar confiança no público

Enquanto mercados como China e EUA têm mais de 70% de salas funcionando, Brasil sofre pela dependência do retorno de São Paulo, estado que representa 32% do parque exibidor no país
Cinemas do Rio estão prontos para a reabertura com novas normas de segurança Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Cinemas do Rio estão prontos para a reabertura com novas normas de segurança Foto: Leo Martins / Agência O Globo

RIO – Foram mais de seis meses de angústia e portas fechadas até o martelo ser batido para a reabertura dos cinemas no Rio. Semana passada, após reunião entre o prefeito Marcelo Crivella e representantes do mercado exibidor , foi decidido que as 220 salas da cidade voltam a funcionar a partir de quinta-feira (1º).

As principais redes já retomam suas atividades esta semana, como Kinoplex, UCI, Cinesystem, Cinépolis e Estação. A Cinemark, por enquanto, fica de fora. Em cartaz estarão lançamentos (“Scooby – O filme”, “A ilha da fantasia”) e também longas que estavam em exibição antes da pandemia, como “A maldição do espelho” e “Bloodshot”. E o mais importante: tudo isso com direito a pipoca.

O consumo de bebidas e alimentos, no entanto, é restrito às salas de exibição durante as sessões, sendo proibido em quaisquer outros espaços. O tema, que já havia sido motivo de celeuma entre prefeitura e exibidores , também desperta a desconfiança do público. Como garantir que os espectadores voltarão a usar a máscara quando terminar de comer sua pipoca?

Espaçamento entre poltronas no escuro da sala. A não ser que o espectador esteja acompanhado de familiares ou amigos Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Espaçamento entre poltronas no escuro da sala. A não ser que o espectador esteja acompanhado de familiares ou amigos Foto: Leo Martins / Agência O Globo

Diretor da Abraplex (Associação Brasileira das Empresas Cinematográficas Operadoras de Cinema Multiplex), Caio Silva garante que as redes estão preparadas para qualquer incidente.

– Os funcionários estão treinados para chamar a atenção de quem se recusar a recolocar a máscara e até interromper a sessão, se for o caso – conta o executivo – Mas acredito que o próprio comportamento consciente das outras pessoas vai acabar constrangendo possíveis rebeldes.

Outro ponto importante do protocolo de reabertura das salas cariocas é o distanciamento social entre os espectadores, que é de, pelo menos, 1,5 metros – duas poltronas. Familiares, casais ou amigos que comprarem juntos seus ingressos podem sentar próximos em lugares pré-marcados. Lembrando que as salas vão operar com capacidade máxima de 50% de lotação.

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Também estão no pacote de medidas o fechamento de bebedouros públicos, totens de álcool gel instalados em diversos pontos dos estabelecimentos e adesivos no chão marcando o distanciamento no momento da compra do ingresso na bilheteria ou de artigos da bomboniere.

Além da fiscalização para o uso de máscara dentro das salas, funcionários medirão a temperatura dos espectadores no momento de sua chegada. Membros do staff também estarão na porta dos banheiros para controle de entrada e organizarão a saída das sessões, fila por fila.

Totens de álcool gel estarão disponíveis em diversos pontos dos cinemas cariocas Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Totens de álcool gel estarão disponíveis em diversos pontos dos cinemas cariocas Foto: Leo Martins / Agência O Globo

O retorno das salas do Rio representa um alívio, segundo o diretor da Abraplex, mas ainda está longe de solucionar o drama do setor, que tem dívidas acumuladas de cerca de R$ 400 milhões, o que representa mais de 20% do total de faturamento médio com bilheterias num ano.

Caio argumenta que o reaquecimento do mercado só ocorrerá, de fato, quando São Paulo voltar à ativa. O estado representa uma fatia de 32% do parque exibidor do país e ainda está com suas salas fechadas .

– Nenhum distribuidor grande vai lançar filme sem as salas paulistas. E isso vem afetando quem já abriu, porque você tem uma escassez de produtos a oferecer para o cliente.

O "efeito São Paulo" se reflete no constante adiamento de títulos de peso, como “Tenet” (Warner) , cujo lançamento foi novamente postergado, agora para o dia 29 de outubro. Semana passada, a Disney decidiu empurrar para 2021 seu “Viúva Negra”. O filme da Marvel era uma das apostas para amenizar a situação dos exibidores este ano.

Segundo o site Filme B, pouco mais de 400 salas já reabriram em todo o país, com destaque para Fortaleza (38), Manaus (31) e Belém (27). No fim de semana passado, os cinemas brasileiros acumularam R$ 435 mil em bilheteria, maior montante desde março. As salas tradicionais representam 81% deste valor, enquanto os drive-in são donos dos outros 19%. No topo ficou "Scooby – O filme" (Warner), com pouco mais de R$ 136 mil de renda.

Adesivos no chão do Kinoplex Tijuca marcam o distanciamento na fila da bilheteria Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Adesivos no chão do Kinoplex Tijuca marcam o distanciamento na fila da bilheteria Foto: Leo Martins / Agência O Globo

A rede Cinépolis tem complexos abertos nas três capitais que lideram o ranking da retomada: Manaus Plaza e Millenium (Manaus), RioMar Fortaleza, RioMar Kennedy e North Shopping Jóquei (Fortaleza), Parque Belém e Boulevard Belém, na capital do Pará.

Diretor de marketing e comercial da empresa exibidora, Juliano Russo diz que ainda não é possível fazer um balanço financeiro muito preciso sobre o retorno. Mas ratifica que a reabertura no resto do país é uma necessidade.

– Com os protocolos devidamente obedecidos, somos um ambiente com baixíssimo risco, principalmente se comparado a outros setores já liberados como restaurantes, academias e praias.

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E por falar em comparação, é possível analisar a reabertura das salas brasileiras paralelamente ao cenário internacional. Com a inclusão do Rio, o parque exibidor do país chega a 17% de salas em funcionamento. Trata-se de um número bem distante dos dois maiores mercados do planeta.

A China, que iniciou sua retomada em julho, já tem 75% de seus cinemas abertos e, neste fim de semana, aumentou para 75% a capacidade máxima de lotação de suas salas. Os Estados Unidos, que também já ultrapassam a marca de 70% dos complexos em funcionamento, vêm sofrendo para atrair seu público.

John David Washington em 'Tenet': filme é considerado um símbolo da reabertura dos cinemas Foto: Melinda Sue Gordon / Melinda Sue Gordon
John David Washington em 'Tenet': filme é considerado um símbolo da reabertura dos cinemas Foto: Melinda Sue Gordon / Melinda Sue Gordon

Por lá, praças importantes como Nova York, São Francisco e Los Angeles ainda não voltaram a operar e a fraca atuação do governo federal na luta contra a Covid não transmite segurança à população. No fim de semana passado, o país registrou US$ 36,1 milhões em suas bilheterias, lideradas por "Tenet" (Warner), que arrecadou US$ 4,7 milhões por lá.

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Para Paulo Sérgio Almeida, diretor do Filme B, a reabertura brasileira carrega muitas similaridades em relação à americana. E não é à toa.

– Quem cuidou bem da pandemia, como China e Coreia do Sul, está tendo bons resultados nesse retorno dos cinemas. Quem combateu a Covid, ainda que tenha sido com falhas, está colhendo números satisfatórios. É o caso de Espanha, França e Reino Unido. Agora, quem fracassou diante do coronavírus, como EUA e Brasil, está sofrendo e ainda vai sofrer por um bom tempo.