Cultura

Claude Troisgros sobre restaurantes pós-pandemia: 'Menu em chip para colocar no celular e garçons de máscara'

Em entrevista feita por drone, chef fala da adequação de suas casas ao 'novo normal' e conta de prato feito com galo dado por Batista
Claude dá entrevista de sua janela Foto: Agência O Globo
Claude dá entrevista de sua janela Foto: Agência O Globo

RIO — Nunca cozinhou-se tanto quanto nessa quarentena e, com Claude Troisgros não tem sido diferente. Como único cozinheiro da casa, o chef passa cerca de seis horas diárias com a barriga no fogão, preparando as refeições diárias de sua família de cinco pessoas. Ele recorre à sua vasta biblioteca gastronômica e se inspira no que encontra na geladeira.

Tem feito pratos que não cozinhava há tempos, como a tradicional receita francesa de coq au vin. Detalhe: usando como ingrediente principal um galo que ganhou de presente de seu fiel escudeiro, Batista. Com ele, aliás, Claude lançou, na quarentena, um serviço de entrega, o Delivery do Batista ("está vendendo tanto que pensamos em abrir uma segunda operação na Barra e no Jardim Botânico", conta). Mas sucesso mesmo em seu cafofo fizeram o pernil de cordeiro com curry e um bolo de chocolate recheado. Ainda assim, ele não está satisfeito.

— Tento acertar a receita desse bolo há dois meses. Já estou na 11ª, mas não estou feliz — assume. — Da pequisa à cozinha, passando pelo tempo de comer, mato o meu dia inteiro.

O Chef Claude Troisgros disse de sua casa, no sétimo episódio para o Entrevista na Janela, como será a reabertura dos restaurantes após a pandemia. Em conversa por telefone com Maria Fortuna, enquanto era filmado por um drone, Claude contou que, com o isolamento social, tem tentado desenvolver, nos últimos dois meses, uma receita de bolo de chocolate. E ainda não deu certo
O Chef Claude Troisgros disse de sua casa, no sétimo episódio para o Entrevista na Janela, como será a reabertura dos restaurantes após a pandemia. Em conversa por telefone com Maria Fortuna, enquanto era filmado por um drone, Claude contou que, com o isolamento social, tem tentado desenvolver, nos últimos dois meses, uma receita de bolo de chocolate. E ainda não deu certo

Claude participou da “Entrevista na janela”, série em vídeo produzida pelo GLOBO para esse período em que se recomenda o distanciamento social — o humorista Fábio Porchat , e os atores Antonio Fagundes , Maitê Proença e Deborah Secco , além dos cantores Anitta e Lulu Santos foram outros convidados. A conversa foi feita por telefone e gravada com um drone.

O chef de cozinha também arranjou um tempinho para fazer as lives "Sal e som", uma mistura tudo a ver de comida e música, que ele transmite, geralmente às terças-feiras, pelo Instagram. Já passaram por lá as cantoras Roberta Sá e Fafá de Belém, além do violonista Luís Felipe de Lima. Foi após saber que Lima, sem trabalho, pretendia vender seu violão para sobreviver que Claude teve a ideia da live.

— Ele estava com dificuldade, assim como a toda arte atualmente no Brasil. Aquilo me tocou, e eu quis ajudar de alguma maneira. É o violão está com ele há 20 anos! Seria como se eu vendesse a minha faca, entende? — compara. — No mais, há muito em comum entre música e gastronomia. O sentimento que a gente passa para a comida, esses artistas passam à canção. Vou cozinhando, eles vão cantando e tocando.

Claude Troisgros cozinha em sua casa Foto: Divulgação / Denise Barros
Claude Troisgros cozinha em sua casa Foto: Divulgação / Denise Barros

No início do isolamento, quando o presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores defenderam a reabertura do comércio, alegando que a economia não podia parar, Claude juntou-se à vários chefs de cozinha, que abraçaram, nas redes sociais, a campanha "fiqueemcasa.

— Todos nós precisamos de dinheiro, mas sem saúde não há dinheiro — afirma. — Tenho 300 famílias envolvidas nos meus negócios. Minha posição, desde o início é cuidar dos funcionários e dos pequenos produtores, pagar a essas pessoas para que possam sobreviver. Agora, se começa a falar em reabertura ( a prefeitura do Rio estipulou o próximo dia 2 como data para os restaurantes de rua abrirem as portas ), mas a curva da doença ainda está ascendente. É difícil entender, vamos com calma. Está tudo confuso.

O francês enxerga diferenças muito nítidas no combate à doença em seu país de origem, que praticou um isolamento bastante rígido e já iniciou a reabertura, e no Brasil.

— São dois continentes diferentes, com culturas diferentes. Lá é frio, aqui é quente, contexto que faz o povo ser distinto — compara. — O brasileiro tem a coisa de abraçar, beijar, rir, dançar. A França passou por várias guerras, as pessoas entendem o que é ficar em casa, respeitam esse momento.

A retomada dos serviços, segundo o chef, deve se dar com o maior cuidado. A expectativa dele, se tudo correr dentro dos conformes, é reabrir o Chez Claude, o CT Boucherie do Leblon e o Le Blond nos primeiros dias de julho. Já o CT Brasserie do VillageMall não tem previsão de reabertura. A CT Boucherie do Rio Design Barra ainda vai mudar de conceito (provavelmente, dará lugar ao Do Batista Delivery), e o restaurante Do Batista do NorteShopping aguarda a finalização da obra. O Olympe migra do Jardim Botânico para o Leblon (na Rainha Guilhermina, no ponto onde funcionava um banco). O Chez Claude, que ele vai inaugurar em São Paulo, deve abrir as portas no fim de julho.

Bastante popular graças a programas de televisão (atualmente, está no ar no reality show "Mestre do Sabor", cuja temporada está toda gravada e a final acontece em 23 de julho), Claude diz que não tem medo de uma certa maldição paulista, que impede restaurantes cariocas de vingarem por lá.

— Não sou uma pessoa que tem medo. Já tive restaurante em São Paulo, com o querido Emmanuel Bassoleil, nos anos 1990. Chamava-se chamava Roanne e deu muito certo. Ficamos 20 anos e, depois, vendi minha parte para ele - recorda-se. — São Paulo tem uma demanda muito maior, mas tenho um sócio que já faz sucesso com outros restaurantes. Já está tudo pronto para abrir, só falta acabar a pandemia.

Quando o momento chegar, Claude conta, suas casas irão respeitar as novas restrições para se adequar ao "novo normal". Isso significa funcionar com metade da capacidade, com os garçons usando máscara, e disponibilizar álcool gel e cardápio virtual aos clientes , evitando, assim, o manuseio.

— A ideia é ter um chip colado na mesa com o menu para o cliente colocar no celular. Haverá todo um aparato para as pessoas se sentirem seguras e confortáveis — garante.

Mas a crise econômica que se abateu sobre o país ainda é um dos principais obstáculos, segundo o chef.

— De três anos para cá, um restaurante de 80 lugares, mesmo estando cheio, não dava lucro. A dificuldade financeira por conta dos impostos, custos de mão de obra e aluguéis é grande — afirma. — Se a gente operar com metade do salão, sem nem a certeza de que teremos quarenta pessoas, me diga como um restaurante vai sobreviver? É uma incógnita.