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Cultura

Conheça cinco artistas indígenas para ficar de olho

Dia internacional dos povos indígenas é comemorado nesta sexta-feira
O artista visual Denilson Baniwa Foto: Divulgação
O artista visual Denilson Baniwa Foto: Divulgação

RIO — Descolonizar a arte se apropriando de suas técnicas, métodos e potências. É o que propõe artistas indígenas que vem produzindo novas estéticas e conteúdos com suas obras — e sendo premiados por isso. Seja na literatura, no cinema, artes plásticas ou música, mitos tradicionais e cosmovisões ameríndias se misturam com tecnologia ou denúncia política na busca por novas possibilidades criativas. No Dia Internacional dos Povos Índígenas, selecionamos alguns nomes de destaque para ficar de olho, e sair um pouco do modelo de "monocultura do pensamento ocidental", como diz líder indígena Ailton Krenak.

Denilson Baniwa, artista visual

Denilson Baniwa: vencedor do Prêmio Pipa Online de 2019 Foto: Divulgação
Denilson Baniwa: vencedor do Prêmio Pipa Online de 2019 Foto: Divulgação

Quem é:

Após viver em Manaus, onde trabalhou na Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Denilson mudou-se para Niterói em 2013. A partir de 2016, passou a se dedicar às artes visual em tempo integral. Também é e um dos coordenadores da Rádio Yandê, voltada à propagação da cultura indígena fora das aldeias.

O que já fez:

Além de seis exposições individuais, participou de 16 coletivas, como “Dja Guata Porã”, no Museu de Arte do Rio (MAR), em 2017, e “Vaivém”, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de São Paulo, em 2019. Em suas pinturas, seus vídeos e performances, representa o contato entre as diferentes culturas, muitas vezes através da tecnologia, como uma forma de manutenção dos saberes (“Quando pinto um indígena com um computador na mão ao lado de obras artesanais, quero mostrar que aquelas ferramentas também podem ser usadas para preservar nossa memória.”)

Se destaca por:

No mês passado, ganhou o Pipa Online, ao receber 1.474 votos em uma eleição aberta ao público na internet, dentro de uma das principais premiações das artes visuais brasileiras. Está em cartaz no Centro Cultural Hélio Oiticica com uma exposição individual até 28 de setembro.

Origem/ Etnia:

Os Baniwa integram um complexo cultural de 22 povos indígenas, estimados em 12 mil pessoas. Denilson morou até os 20 anos na aldeia Darí, em Barcelos (AM).

Citação:

“Se hoje podemos ocupar espaços na arte contemporânea, foi por muito esforço e conversa com curadores, para que não ficássemos restritos aos espaços étnicos. Quando as pessoas veem um protesto, tendem a ser mais reativas. Mas dentro de uma galeria ou museu, aquela informação te pega de outra forma.”

Saiba mais :

O artista posta suas obras em seu instagram ( @denilsonbaniwa ).

Katú Mirim, rapper

Katú Mirim Foto: Divulgação
Katú Mirim Foto: Divulgação

Quem é:

Nascida e criada na cidade (ou seja, uma indígena urbana), Katú Mirim é uma das vozes mais ativas pela causa indígena. Moradora de periferia, bissexual e rapper, ela é a responsável pela campanha #ÍndioNãoÉFantasia, que denuncia o racismo no uso de indumentária indígena no carnaval. Ela tem 32 anos e atualmente vive no interior de São Paulo.

O que já fez:

Desde 2017, a artista vem lançando singles como "Force", "Xondaria" (versão de "Borders", da cantora MIA) e "Vestido de hipocrisia" — na qual fala da questão das fantasias indígenas no carnaval. Prepara seu primeiro álbum, "Nós", com previsão de lançamento para 2020.

Se destaca por:

Sua atuação como liderança ativista e como rapper a levaram a participar de festivais como Órbita, Geração 501, RedBulk Amaphiko e Teko Porã.

Como virou rapper:

Na adolescência, conheceu o rap de artistas como Ndee Naldinho, Racionais MC's e SNJ e começou a escrever suas primeiras rimas. Mais tarde, participou de duas bandas de rock, uma como vocalista e outra como baixista, mas elas "não saíram da garagem", como diz Katú. Apenas em 2017 ela retomaria o hip hop — naquele ano, voltou a compor e lançou seu primeiro single, "Aguyjevete".

Origem/ Etnia:

Katú pertence ao povo Boe Bororo, que hoje conta com uma população de cerca de 2 mil pessoas.

Frase:

"Minhas músicas são políticas, hoje viver é um ato político. Os artistas indígenas na música são indígenas antes de serem artistas. Mas é importante lembrar que o artista indígena é artista e ele pode falar sobre o que quiser, pode fazer arte que os não-indigenas entendam ou fazer arte para que somente os indígenas entendam. O rap é meu arco e flecha."

Saiba mais:

As músicas de Katú Mirim podem ser ouvidas nas páginas da artista no Soundcloud e no Youtube .

Daniel Munduruku, escritor

Daniel Munduruku é autor de 'Vozes ancestrais: dez contos indígenas' Foto: Divulgação
Daniel Munduruku é autor de 'Vozes ancestrais: dez contos indígenas' Foto: Divulgação

Quem é:

Daniel Munduruku, de 55 anos, é do povo Munduruku do sul do estado do Pará. Atualmente mora em Lorena (SP). É tido como um dos maiores escritores indígenas do Brasil. Até os nove anos de idade falava somente Munduruku, até ir para a escola onde as crianças indígenas era obrigadas a falar português. Quando eram pegos falando em sua língua sofriam castigos como palmatória ou ficavam de joelho no milho.

O que já fez:

Mestre e doutor em educação na USP, é pós-doutor em Linguística pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). É autor de 52 livros pelos quais recebeu prêmios como o Jabuti e Prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras. É diretor-presidente do Instituto Uk´a — Casa dos Saberes Ancestrais, e membro da Academia de Letras de Lorena.

Se destaca por:

Como escritor, se destaca na área da literatura infantojuvenil. É autor de “Vozes ancestrais: dez contos indígenas”, Prêmio Jabuti de Livro Juvenil . É reconhecido por outros escritores indígenas como autor pioneiro e responsável pela formação de uma geração de novos escritores indígenas através sua sobra e de seus eventos voltados para a literatura indígena.

Como virou escritor:

Após anos estudando em escolas "que negavam seu ser indígena" e no seminário com padres salesianos, Daniel se mudou para São Paulo onde ingressou em um mestrado em antropologia social na USP. Foi quando teve um aprendizado novo sobre sua própria cultura e valorizou mais os ensinamentos do avô indígena. Após se tornar mestre e doutor em educação pela USP passou a se dedicar a formação de professores e à literatura indígena. Afirma que a escrita lhe fez debruçar mais sobre seu povo.

Origem/ Etnia:

Os mundurukus estão localizados em partes dos estados do Pará, Amazonas e Mato Grosso. Atualmente lutam para garantir a integridade de seu território, ameaçados por garimpos ilegais de ouro e projetos hidrelétricos.

Frase:

“Não é o indígena que tem que aprender o ocidente, é o ocidente que tem que aprender com o indígena. Os saberes indígenas são conhecimentos circulares. As histórias são narradas no sentido de atualizar as coisas do presente. As pessoas acham que ser indígena é estar preso ao passado, mas na verdade é estar preso ao presente, a contemporaneidade”.

Saiba mais:

Em seu Blog ( http://danielmunduruku.blogspot.com/ ) o escritor escreve resenhas e reúne entrevistas e mais detalhes de sua obra.

Cristino Wapichana, escritor

Cristino Wapichana já foi traduzido para o sueco e norueguês Foto: Divulgação
Cristino Wapichana já foi traduzido para o sueco e norueguês Foto: Divulgação

Quem é:

Escritor, compositor e músico, é do povo wapichana, do norte de Roraima. De família de indígenas evangélicos, estudou em escolas no sul do estado de Roraima e em Boa Vista. Afirma que depois dos estudos “Jesus o libertou da igreja”. Tem 48 anos e atualmente mora em São Paulo (SP).

O que já fez:

Seu conto “Wató, a pedra do fogo” está saindo no livro “Nós – uma antologia da literatura indígena", organizada por Mauricio Negro, que sai em agosto pela Companhia das Letras. É autor de seis obras, entre elas os livros “Sapatos Trocados ", “A Oncinha Lili” e “A Boca da Noite”. Já foi traduzido para o sueco e o dinamarquês.

Se destaca por:

É reconhecido por livros infantojuvenis como “A Boca da Noite”, que foi premiado na categoria infantil do Jabuti de 2017 e recebeu a Estrela de Prata do Prêmio Peter Pan, do International Board on Books for Young People, da Suécia.

Como virou escritor:

Ao conhecer Daniel Munduruku começou a produzir com ele eventos de literatura indígena e passou a ter uma vida mais ativa nos circuitos de pensadores indígenas. Participou do concurso Tamoios, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, em 2007 e venceu com o conto “A onça e o fogo”.

Origem/ Etnia:

O povo wapichana habita o estado de Roraima e também está espalhado pela Guiana. Atualmente formam uma população total de cerca de 13 mil indivíduos. Enfrentam em muitos territórios uma situação de confinamento, em terras cercadas ou invadidas por fazendas de gado.

Frase:

“A partir dessa produção literária o Brasil começa a ter contato com essas novas falas, a visão de mundo do Outro. E a universidade vem produzindo cada vez mais teses sobre a literatura indígena, algo que não existia antes. Isso quebra a ideia que os índios estão parados no tempo. Não. Nós estamos em movimento o tempo inteiro, cada povo a sua maneira.”

Saiba mais:

Quem quer saber mais sobre lançamentos e shows de Cristino Wapichana pode seguir seu perfil no Facebook.

Djuena Tikuna, cantora

Djuena Tikuna Foto: Divulgação
Djuena Tikuna Foto: Divulgação

Quem é:

Djuena Tikuna (seu nome significa "a onça que pula no rio", em língua tikuna") viveu em sua aldeia natal até os 8 anos, quando se mudou para Manaus. Devido ao preconceito que sofria na faculdade ("As pessoas, inclusive professores, diziam que indígenas eram incapazes de estar lá", conta), abandonou o curso, que só retomou em 2014. Foi a primeira indígena a se formar em Jornalismo no Amazonas. Em paralelo, desenvolveu uma carreira de cantora e compositora. Tem 35 anos e hoje vive em São Luís (MA).

O que já fez:

Em 2017, ela lançou seu primeiro disco, "Tchautchiuãne" (que significa "Minha aldeia").  Atualmente, está em turnê nacional com Marlui Miranda e Magda Pucci pelo projeto Sesc Sonora Brasil (o tema desta edição é "música dos povos originários"). Produz seu segundo disco, "Torü wiyae" ("Nosso canto"), com participação de anciãs e crianças de sua aldeia.

Se destaca por:

Ela foi indicada, em 2018, ao Indigenous Music Awards, maior premiação da música indígena do mundo — realizada em Winnipeg, no Canadá. É conhecida também por sua interpretação do Hino Nacional em língua tikuna, que apresentou na abertura dos Jogos Olímpicos de 2016. Tem atuação importante como jornalista na difusão da cultura indígena.

Como virou cantora:

Seu povo é muito musical, e sempre houve a tradição das mulheres cantoras — como sua mãe e sua avó. Na adolescência, ela se aproximou da cena artística de Manaus — inicialmente pelo teatro, mas o apelo da música acabou sendo maior ("estava no sangue"). Djuena começou a escrever suas próprias canções, sempre em língua tikuna.

Origem/  Etnia:

De etnia tikuna, ela nasceu Umariaçu 2, aldeia amazonense que fica no encontro entre Brasil, Peru e Colômbia.

Frase:

"Minhas canções falam sobre a luta, a história do povo tikuna, nossa mitologia, nossa tradição. Há 519 anos somos resistência. Nós somos filhos daqueles que cantaram a canção da morte no tempo das caravelas. E hoje nós continuamos vivos pra dizer quem somos, resitindo aos invasores das nossas terras, a quem quer nos exterminar."

Saiba mais:

No site djuenatikuna.com , pode-se ouvir sua música e conhecer seus outros trabalhos.