Cora Rónai
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Cora Rónai

Jornalista e escritora.

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Cora Rónai

Por — Rio de Janeiro

De forma enviesada, Lula tem razão em relação ao que está acontecendo na Palestina. É um horror indescritível, e não é, não pode ser, o que vejo algumas pessoas defendendo — que a guerra em Gaza seria a única resposta possível ao pogrom medieval do dia 7 de outubro. Eu entendo que o Hamas usa civis como escudo (basta ver os túneis percorrendo toda a extensão do território, com entradas em hospitais e escolas), eu entendo que alguma coisa tinha que ser feita diante do ataque mais cruento deste século, mas entendo também que há respostas e respostas, que pensar antes de agir é essencial e, sobretudo, que há limites morais na vida.

Infelizmente, Lula deixou de ser referência porque, cada vez mais, deixa clara a sua orientação antissemita.

"O que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar judeus."

Mais tarde, no antigo Twitter, Janja esclareceu:

“A fala se referiu ao governo genocida e não ao povo judeu. Sejamos honestos nas análises.”

Para ser honesta na análise, Janja deveria, em primeiro lugar, lembrar que Hitler “resolveu matar judeus”, e não “matar israelenses”.

Comparar as ações de Israel com o Holocausto não é uma crítica como qualquer outra; é uma perversidade ultrajante e um desrespeito com a memória dos mortos, que atinge não só israelenses como judeus de todas as ideologias ao redor do mundo, inclusive aqueles que, como eu, discordam frontalmente do atual governo de Israel e da sua política bélica.

No entorno de Lula, porém, falta quem entenda isso. Pior: no entorno de Lula, sobretudo na esquerda acadêmica que divide o mundo entre bons (eles) e maus (os outros), ser antissemita — com a desculpa do “antissionismo” — é uma sinalização de virtude.

Não faltariam exemplos contemporâneos para Lula, que afirma que o que acontece em Gaza “não existe em nenhum outro momento histórico”: da invasão da Ucrânia à guerra por procuração que Irã e Arábia Saudita travam no Iêmen, passando pela própria Etiópia, onde ele proferiu o seu insulto, e onde, na região do Tigray, ocorreram até o ano passado atrocidades de todos os tipos, de massacres a estupros em massa.

Um presidente da República não pode — não tem o direito — de ser tão ignorante ou sectário.

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O governo de Israel está, sob qualquer aspecto que se olhe, abaixo da crítica. O tratamento dispensado ao embaixador Frederico Meyer, levado ao Museu do Holocausto, foi o oposto do que se espera de uma diplomacia digna do nome: um ato de cafajestes mal-intencionados, que não hesitaram em instrumentalizar o Holocausto. Em Lula ainda se pode (com muito boa vontade) suspeitar de ignorância; o chanceler Israel Katz, porém, não conta com o benefício dessa dúvida.

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