Cultura

Deborah Evelyn: 'Sou mais livre sexualmente aos 50 do que era aos 20'

No ar como uma mulher pegadora em 'Verdades secretas 2', atriz fala como personagem ajuda a quebrar paradigmas sobre o prazer feminino na idade madura, conta que desejo permanece intenso na menopausa e que casamento à distância ajuda a manter o frescor da relação
Deborah Evelyn: 'Por que, para a mulher, orgasmo, gozo e masturbação são tabus?' Foto: Guilheme Lima/ Divulgação
Deborah Evelyn: 'Por que, para a mulher, orgasmo, gozo e masturbação são tabus?' Foto: Guilheme Lima/ Divulgação

Na contramão de muitas atrizes que veem as ofertas de personagens interessantes diminuírem à medida em que a idade aumenta, Deborah Evelyn vive uma virada interessante em sua carreira aos 57 anos. A atriz, que construiu uma trajetória dentro de papéis densos, dramáticos e passou também pelas vilãs, podia estar encarnando o clichê da "mulher madura infeliz no casamento". Só que não. Seus mais recentes trabalhos retratam lobas pegadoras, donas de seus desejos, que vão à luta para realizá-los.

Carol Castro : Atriz explora loucura em ‘Insânia’, série de terror psicológico: ‘Era tudo que buscava’

Primeiro veio a ninfomaníaca Lyris de "A dona do pedaço" (2019). Agora, a estilista Betty de "Verdade secretas 2" (o penúltimo bloco de capítulos estreia nesta quarta, 1, no Globoplay), uma devoradora de modelos que fazem o tal book azul (um catálogo de rapazes que fazem programa). Vivendo símbolos da independência emocional feminina e da sexualidade depois dos 50, Deborah tem ajudado a quebrar certos paradigmas sobre o prazer na maturidade feminina por meio da dramaturgia. O que ela tem mostrado na tela dialoga com sua vida pessoal.

Veja fotos de Deborah Evelyn

Casada com o arquiteto alemão Detlev Schneider, Deborah desfruta de uma ótima fase na cama dentro de uma relação madura. Tem mais conhecimento do próprio corpo e do lhe dá prazer. Sente-se mais livre sexualmente do que aos 20 anos. De Nuremberg, onde curte a folga ao lado do companheiro após concluir sua participação na novela do Globoplay, a atriz conversou com OGLOBO. Ela, que tem planos de voltar ao teatro com uma peça de Yasmina Reza (autora de "Deus da carnificina", que Deborah encenou de 2011 a 2013) diz que falar de masturbação liberta, conta como lida com a menopausa e revela encarar a traição de maneira diferente hoje.

Lin-Manuel Miranda : 'Compor é um trabalho de palavras cruzadas'

Qual a importância de interpretar uma mulher empoderada, que fala sem rodeios sobre sexo e masturbação?

Além do aspecto feminista, de a gente estar conseguindo cada vez mais se colocar, é a de entender que nosso desejo é importante, que precisamos falar dele sem vergonha. Por que, para a mulher, orgasmo, gozo e masturbação são tabus? Homens começam a aprender a se masturbar meninos, o pai ensina. Junto com isso, entra a questão da idade, de a mulher mais velha não só ter uma vida sexual ativa, como proativa.

Betty é bem-sucedida e sabe o poder sexual que tem, não tem pudores de ir atrás do que quer, nem medo de julgamento ou rejeição. Isso é muito forte. Acho importantíssima a vontade dela de realizar seus desejos e de estar bem consigo mesma, com seu corpo. Além de poderoso, é muito sexual e dá um poder maior ainda. Essa postura alimenta a sexualidade dela e essa sexualidade alimenta o poder que ela tem. Assim, vai se transformando em uma grande mulher.

A diretora artística Amora Mautner disse que buscou representar o desejo sexual sob a ótica feminina. Você identifica esse olhar nas cenas?

Sim. Mesmo quando era um diretor homem a informação era a partir dessa perspectiva. Isso muda tudo, a câmera, a nossa posição... As narrativas sempre foram muito pelo olhar do homem, mostrando a mulher como objeto. Por que não o homem como objeto de desejo? Acho que Amora e o Walcyr ( Carrasco, autor da novela ) usaram a série para quebrar alguns tabus. E que esse ponto de vista fez com que as cenas ficassem maravilhosas, tesudas.

Vejo homens falando isso também, o meu marido falou... Isso não quer dizer cenas com mais pudor... Pelo contrário! São fortíssimas. Lembro da minha sensação quando vi a primeira cena do primeiro capítulo, da Agatha ( Moreira ) com o Romulo ( Estrela ). Falei: "Caralho, que tesão essa cena".

Que cena daria como exemplo de que, na novela, o sexo é retratado da perspectiva feminina?

Todas as minhas cenas de sexo da Betty, que são com o Matheus ( Bruno Montaleone ), um menino bem mais jovem, partem do desejo dela. É ele quem faz um strip-tease para ela e não o contrário, que é o estereótipo, a mulher gostosona fazendo para o homem. Ela está no comando.

Não quero dizer comando de um jeito masculino, porque acho que a mulher comanda também de um jeito diferente. Não tem nada a ver com o uso da força, seja de natureza física ou psicológica, mas nesse sentido feminino das realizações dos desejos.

As posições utilizadas... É sempre ela recebendo estímulo sexual, só fiz uma cena de sexo oral nele, algo que há muito em cena de sexo de mulher com homem. E olha que fiz 21 cenas de sexo! Fiz questão de contar junto com o Bruno ( risos ). Haja criatividade!

Enderson Cobra: 'Parece que o Brasil todo precisava ouvir shalom', diz influencer que viralizou com bordão motivacional

Pesquisando sobre sua personagem, vi em várias chamadas de notícias o seguinte título: "Deborah Evelyn terá amante garotão em 'Verdades secretas 2". Destacavam a idade dele. Acha que essa informação teria o mesmo destaque se fosse um homem no lugar da Betty?

Claro que não! Essas chamadas foram totalmente machistas. Porque é muito mais normal ver um homem namorar uma mulher mais nova, né? Eu, particularmente, não tenho tesão especial por homens mais novos. Pelo contrário. Sempre tive pelos homens mais velhos. Mas e se tivesse? O caminho é o da aceitação das sexualidades diferentes.

Betty paga por sexo. É um papel em que a sociedade não está acostumada a ver a mulher...

Sim. E não é que não aconteça, só que é mais escondido. Mulher que faz isso, talvez, ainda seja um pouco ridicularizada. Homem, não. Homem desde garoto é incentivado a transar com prostituta, a começar logo. Não sei se ainda é, mas sempre foi assim. Mulher é incentivada a se poupar. Aí entra todo o machismo de que estamos ali só para gerar, procriar e dar prazer ao homem, que pode sair trepando, tendo filho com todo mundo. E a mulher, ali, esperando pelos filhos que deve ter na vida.

Já entrevistei muitos homens entre 50 e 70 anos que disseram: "Ainda quero ter muitos filhos". Isso significa procurar uma mulher bem mais nova, né? Como os homens, realmente, ocupam um lugar muito confortável...

Exatamente! E acho que muitas mulheres também não se tocam sabe? Se a gente não falar "peraí, nesse lugar eu não te quero", eles também não vão sair. Porque têm tudo do jeito que querem. Estão realmente muito confortáveis.

Uma pesquisa recente da USP mostrou que 19% das mulheres brasileiras não se masturbam. Outro dia, Angélica falou que tem vibrador e foi um auê danado...

É algo tão parte da vida, né? As próprias mulheres têm tabu com isso, então, é importante falar. É uma maneira de a gente ir se libertando, tomar as rédeas da nossa vida sexual e não ficar só à mercê do desejo do homem. Muitas mulheres ainda esperam que eles tomem a iniciativa para ter uma relação sexual. Mesmo no casamento, no namoro. Já ouvi muito: "Não transo há uma semana. Ele não tomou a iniciativa". Gente! É como se a mulher não pudesse tomar, tivesse que esperar o desejo do homem.

Tem tentado se libertar também desses pudores?

Muito. São centenas de anos com a mulher tendo que ficar quieta no canto dela. Essa é uma das vantagens da idade madura: a gente vai se libertando. Acho que melhorei muito em relação à minha vida sexual porque fui me conhecendo, questionando, falando sobre, acabando com meus pudores.

Me sinto melhor sexualmente, mais livre hoje do que quando tinha 20, 25 anos. Muito mais! Sei do que gosto, como gosto, do que não gosto. Se a gente não falar o que é bom pra gente, como o cara vai saber? Consigo falar numa boa, gosto de falar de sexo, nunca foi um problema para mim. Mas a gente vai amadurecendo. Acho que as novas gerações já têm mais liberdade. Vejo a minha filha... Mesmo assim, acho que é algo que a gente amadurece. Uma mulher de 25 anos dessa geração que já é mais livre hoje, nossa senhora, imagina com 50? ( risos ).

Maria Flor: "Não dá mais pra trepar sem gozar"

Além de tudo, cada mulher é diferente. Não que os homens sejam iguais, mas são mais simples sexualmente. A mulher, pelo órgão sexual dela ser mais interno... Vejo isso conversando com minhas amigas, cada uma tem um tipo de prazer. O que é o máximo do prazer para mim, muitas vezes, não é para a minha melhor amiga. O legal é encontrar um cara que goste de descobrir qual é o seu grande tesão. Tem muito homem que ainda está ali só à procura do prazer dele. Mas há outros que têm grande prazer em dar prazer.

Esse é um dos motivos da grande ligação da Betty com o Matheus. Ela teve todos esses meninos de programa que batiam ponto ali, mas com ele, encontrou um cara que estava realmente com ela, que se preocupou com o prazer dela. Isso faz toda a diferença. Por isso, ela se apaixonou.

Suas personagens mais recentes, Betty e Lyris, estão ajudando a quebrar certos paradigmas sobre o prazer feminino na idade madura...

Totalmente. O que as diferencia é que Lyris começou a novela como uma mulher submissa, que fica esperando o desejo do marido e não entende por que ele não vem. Leva um choque quando descobre que ele é gay. Por conta disso, pega a sexualidade nas mãos dela, mas nunca se torna completamente independente do marido por causa da questão financeira. Brinco que Lyris talvez tenha sido o embrião da Betty, que já começa dona da história dela.

É muito bom poder estar fazendo esses trabalhos, porque é interessante quando quando a ficção traz algum tipo de questionamento. Sei que o público está ali para se divertir, e o que a gente faz é entretenimento mesmo. Mas se junto conseguirmos trazer algo que faça as pessoas se ligarem... Acho que funciona mais do que uma palestra. A pessoa se identifica ou acha horrível e aí questiona mesmo.

Me lembro de uma dondoca que eu fiz em uma novela do Gilberto Braga. Era uma mulher horrível, que queria subir na vida de qualquer maneira. Tudo para ela eram os ricos. Os pobres eram horríveis. E aí tiveram umas mulheres em São Paulo que não queriam que o metrô fosse para Higienópolis para que as pessoas pobres não chegassem no bairro. Aquilo me chocou tanto... E usaram a minha personagem como porta-bandeira para criticar essa história. A personagem estava ali mostrando uma coisa horrível.

Agatha Moreira: Atriz fala sobre cenas quentes de "Verdades secretas 2"

Betty e Lyris mostram que a gente deve ir quebrando tabus, tirando amarras nas questões femininas e sexuais. Mulheres da minha geração, de forma geral, ainda são muito reprimidas. Tive a sorte de não ter esse tipo de criação. Então, é incrível ter oportunidade de mostrar um personagem desse. A gente entretém e dá um toquezinho: "Opa, dá uma olhadinha nisso, vê se está tudo ok com você". E tem essa coisa de que a menopausa, outro tabu, acaba com o desejo... Não é assim.

A menopausa não impactou o seu desejo?

Não, porque faço reposição. Estou muito no comecinho e comecei a reposição antes. Amigas começaram a falar, e eu pensava: "Não quero passar por isso". É muito cedo! As coisas começam a acontecer, e você ainda tem muito tempo de vida pela frente. Comecei a conversar com meu médico, fiz aquele teste para saber se eu tinha algum gene que pudesse dar algum tipo de câncer. Deu que não, que eu teria os mesmos riscos que todo mundo que faz reposição. Para mim, isso foi muito importante, porque, além da questão sexual, tem algo a ver com a postura de vida, sabe? De ser mais pró-ativa mesmo.

Esses hormônios são tirados muito cedo da mulher. Também sempre tive um pouco de medo de depressão, acho que tenho uma tendência. Não quis arriscar, então me adiantei. Os 50 hoje são o que eram os 80. E não dá para a gente com 50 viver como alguém de 80. Não é porque fiz 50 que não vou continuar com uma vida ativa sexualmente, profissionalmete e socialmente. Então, vou fazer fazer tudo que me ajude a continuar me sentindo da melhor maneira possível.

Muitas atrizes reclamam que os bons papéis somem depois dos 50 anos. Contigo aconteceu o contrário. Você passou bastante tempo fazendo papéis densos, dramáticos, depois, as vilãs. E agora está tendo oportunidade de experimentar mais, não?

Verdade. Fiz todos esses papéis muito densos com o Gilberrto Braga, Maria Adelaide Amaral, depois as vilãs com o Walcyr Carrasco. Na minha idade, poderia estar fazendo a mulher madura infeliz no casamento, mas estou sendo "usada" para viver a mulher da minha idade que vai à luta seja onde for. Acho que tem uma coisa também de cumplicidade, de empatia e parceria com autor. Sempre tive sorte de eles escreverem papéis muito bons para mim. A gente também vai amadurecendo profissionalmente, não tem mais aquela coisa de abraçar o mundo com as mãos, de fazer tudo que aparece. Seleciona um pouco mais.

Catfishing: Entenda o golpe que levou atleta italiano a acreditar que namorava Alessandra Ambrosio por 15 anos

Foi tranquilo fazer tanta cena de sexo, lidou bem com essa exposição?

Amora conversou muito com a gente antes, principalmente comigo, Camila ( Queiroz ) e Agatha, que fazíamos a maioria das cenas. Esse olhar feminino ajudou muito. A equipe também. Em nenhum momento me senti desrespeitada. Era tudo cuidadoso, só estava no set quem precisava estar, ficávamos nuas só quando tínhamos que estar e tudo tinha o tamanho que devia, era um normal cuidadoso. Não era nem um "olha, está nua" e nem um "dane-se que está nua". De qualquer maneira, é muita exposição. Foram cenas de sexo como eu jamais tinha feito, muito realistas.

Não tenho problema com nudez, mas quando é assim, tão exposto, é  um pouco diferente. Nessas horas, ou você relaxa ou não vai ficar direito. Eu não pensava muito, gravava e pronto. Quando começou a ir ao ar... Tipo, meu marido viu.. ( risos ). Ele não teve problema nenhum, achou bonito, forte. Mas passou pela minha cabeça que minha filha, meus enteados, pessoas jovens mais próximas estavam vendo. Mas é isso, são cenas lindas que estão ali. Não são cenas fáceis e nem as que mais amo fazer na vida. Gosto de cenas com história, drama, briga. Cena de sexo é muito mais técnica do que qualquer outra coisa.

Ítala Nandi: "Eu era o único símbolo sexual que não transava"

Você e bruno tiveram que construir uma cumplicidade, descobrir os limites de cada um, né?

A gente se conheceu no primeiro dia de gravação de cena de sexo ( risos ). Imagina: "Prazer, vamos ali fazer uma cena de sexo". Uma coisa é fazer cena de sexo com alguém que você conhece ou já contracenou. Mas nos demos muito bem, ele é ótimo ator e super boa pessoa. Deu muito certo. Quando eu aceitei fazer a novela, eu sabia das cenas. Vi que faziam parte do contexto da novela, não eram gratuitas, inclusive eram um dado muito  importante da história da minha personagem. Era muito cansativo, sete, oito horas daquela coreografia, se preocupando para não aparecer o tapa sexo... Você sai esgotado fisicamente.

A relação com seu corpo sempre foi confortável? Há muitos elogios sobre sua forma física...

Venho de uma família em que nudez não é problema. E também nunca tive. Luisa, minha filha, brinca que, se deixar, tiro a roupa no meio da loja para experimentar algo. Não que vá sair pelada num shopping ou no carnaval. Mas, se estou bem com meu corpo, não tenho problema em expor. Mas acho que é outra coisa que fui melhorando com a idade. Primeiro, fui aprendendo a expor o corpo de uma maneira melhor; depois, fui trabalhando mais ele. Não tenho problema em trocar de roupa no camarim na frente de colegas homens.

Na pandemia, passei a malhar todo dia. Meu corpo mudou. Nunca fumei, me alimento de forma saudável, mas como de tudo, batata frita, carne... Não faço dieta porque tenho tendência a emagrecer. Tem coisa de constituição física mesmo, uma sorte aí. Mas eu realmente me cuido. Porque meu corpo é meu instrumento de trabalho e porque gosto de me sentir bem para minha vida mesmo.

Mas tem uma coisa que não dá para para mim... Meu marido é alemão e, aqui, todo mundo fica pelado em tudo quanto é lugar. No lago, na sauna. Falei para o meu marido, que tem uma sauna em casa: "Não tenho vontade de ficar pelada para os seus amigos e nem tenho vontade de vê-los pelados". Fico pelada para quem me interessa! No camarim, tudo bem, é trabalho. Mas, para mim, a nudez tem significado.

Comentamos aqui sobre muitos avanços que tivemos nesses últimos anos, mas ainda vivemos numa sociedade que não deixa a mulher envelhecer em paz. Como é ter 57 anos nesse contexto? Sente muita diferença entre Brasil e Alemanha nesse aspecto?

Sinto. No Brasil, há uma preocupação maior em se cuidar, o que é bom para envelhecer melhor, mas também vira neurose. Mulheres jovens fazem botox... Isso não tem na Alemanha. Elas até se cuidam um pouco, mas é diferente. Todas  as mulheres que conheci, amiga, ex-mulheres do meu marido que têm mais ou menos a minha idade, estão menos cuidadas do que eu.

Vou ao dermatologista desde os 20 anos. Quando engravidei, minha pele ficou muito ruim. E acho que pele tem que cuidar sempre. Faço várias coisas, passo ácido. Mas é difícil entender um ator que faz botox. Como você vai paralisar suas expressões? A gente deveria conseguir um certo limite, mas muitas pessoas não conseguem. Um amigo alemão foi ao Brasil e ficou impressionado como o físico, a estética e a jovialidade para a gente é importante.

Enrique Diaz: "Estava lendo sobre o clitóris e fiquei super curioso"

Você nunca fez plástica?

Nunca. Teve uma época em que eu combinava com a minha irmã que a gente ia fazer junta, lá pelos 40, 45. Foi chegando esse momento e a gente não teve coragem. Não sou contra, mas fico com medo de mexer na minha cara e algo dar errado. Sei lá, um olho torto. Porque, literalmente, está na cara, né? E também é o meu objeto de trabalho. Botox acho estranho ator fazer, mas plástica, não.

No meu prédio, no Rio, tem um cirurgião plástico maravilhoso. Sempre que pego o elevador com ele, pergunto: "Está na hora de eu fazer alguma coisa?". Ele diz: "Não, Deborah, ainda não". Se um dia ele falar que sim, não sei se vou ter coragem. Acho que o importante é se cuidar, assim como fazer análise, que sempre fiz a vida inteira. Importante fazer esporte, estar saudável, feliz, namorando, gozar, fazer sexo. Tudo isso traz beleza.

E se libertar das cobranças por padrões...

Até porque os padrões mudam, né? Cento e cinquenta anos atrás, o padrão era ser gordinha. Eu estaria ferrada com o meu biotipo. A gente tem que aprender a ser feliz do jeito que é. Isso também melhora com a idade. Quando a gente é jovem, sofre com umas bobagens, olha uma foto e pensa: "Nossa, eu era tão bonitinha, por que sofria tanto?" ( risos ).

O que muda no casamento na idade madura?

Primeiro, achei que ia ser complicado casamento comigo no Brasil e ele na Alemanha. Quando ele falou vamos casar, pensei: "Como assim?". Tinha uma vida profissional construída, amigos. É diferente começar uma vida fora jovem. Acabou que a gente fica muito próximo. Quando estou trabalhando, ele vai para o Brasil. É arquiteto, mas tem um escritório próprio. Quando não estou trabalhando, venho pra cá. Comecei a pandemia aqui, e depois fui para o Brasil trabalhar e ficamos 8 meses sem nos ver. O máximo que tínhamos ficado longe era 4 semanas.

Aí fui percebendo isso, é um casamento mais maduro. Não tem filho pra criar junto, aí seria complicado. Com a distância, a gente fica sempre com saudade, não cai na rotina. Quando a gente é mais jovem, é mais ciumento. Pelo menos eu. E aí a gente vai entendendo que não precisa ser tudo tão a ferro e fogo. Não estou dizendo que temos um casamento aberto. Não vou achar ok se ele tiver algo com outra pessoa. Nem ele, eu. Mas a gente não fica mais tão paranóica com essas coisas. Quando se tem 25 anos, ser traído é o pior dos mundos. Aos, 50... Claro que vai ser bem ruim, mas não é a pior coisa do mundo. A gente sabe que não morre disso, que não arranca pedaço. Então, fica mais fácil.

Claro que vai ser chato, vai criar uma briga. Talvez, inclusive, me separe, mas não tenho mais a sensação de que vou morrer se me separar. Talvez nem me separe por causa disso. Eu era muito mais briguenta jovem, melhorei muito ( risos ). Talvez, se eu falar isso, meu marido não vai acreditar ( risos )...

Claudia Ohana: "As mulheres voltaram com cabelo embaixo do braço porque o mundo encaretou"

A vida sexual é menos intensa?

Olha, não diria isso ( risos ). Meu marido é ( do signo de ) escorpião. Não que acredite nisso, nunca fiz um mapa... Mas não dizem que escorpião é uma loucura sexualmente? Estou comprovando. O  sexo é diferente no sentido de eu ser mais livre, estar mais aberta, usufruindo mais. Tem mais qualidade e continua tento bastante quantidade, viu? Agora, acho que tem a ver com a gente viver em países separados. Temos sempre o reencontro, um frescor.

Você foi casada com o Dennis Carvalho quando ele ocupava um lugar de bastante poder como diretor e numa época em que o machismo era pior ainda. Aguentou muita coisa?

O Dennis é um grande diretor e sempre tive atração por homens mais velhos, que eu sabia terem o que me dar, me ensinar. Na escola, fui apaixonada por um professor de geografia meio comunista, que me dava uns livros para ler. Eu adorava.

Eu já tinha trabalhado com  Dennis em "Selva de pedra", quando eu tinha 21 anos. A gente foi começar a namorar algum tempo depois. Ele fazendo "Vale tudo" e eu, "Vida nova". Ele começou a me procurar, era 20 anos mais velho que eu, fora que já tinha uma fama ali...

De que?

Ah é, de galinha. O Dennis tinha se casado seis vezes, fui a sétima mulher dele! Pensei: "Ele está querendo só mais uma". Teve que penar atrás de mim, a gente até brincou muito com isso. Era bem o tipo de homem que eu gosto, alto, tinha essa coisa do conhecimento que me fascina.

Era um momento dessa coisa bem machista, sim, mas o Dennis é um homem muito pouco machista. É muito feminino em vários aspectos. No nosso dia a dia não tinha muito isso. E não chegava para mim essa coisa de "ah, é mulher do diretor" de uma maneira forte, que me atingisse. Às vezes, quando estávamos trabalhando juntos, surgia a pergunta numa entrevista: "Como é ser a mulher do diretor?". Mas sempre me senti muito gostada, acarinhada.

No mais, acho que a gente teve uma parceria muito legal, trabalhamos juntos antes e depois de sermos casados, o admiro como diretor, ele me admira como atriz. Acho que teria sido diferente se eu não tivesse casado com ele, mas não necessaramente melhor ou pior.

Tinham um casamento monogâmico? Você disse que aos 20 anos, achava que ia morrer se fosse traída. Isso aconteceu na sua vida?

A combinação era essa ( risos )... Claro que, com o tempo, a gente vai tendo outros desejos. Aí, entram as escolhas diárias. Vale a pena machucar alguém com quem estou construindo algo por conta do meu desejo? Para mim, nunca valeu. Relação aberta não é para mim. Teria ciúme, medo de me apaixonar ou que se apaixonassem também. Já aconteceu ( de ser traída ). Eu, realmente, achei que fosse morrer.

Mas não morre e passa. Quando vive a situação, acha que nunca mais vai encontrar outra pessoa. Quando me separei do Dennis, achei que ia ser muito difícil me apaixonar de novo, encontrar alguém interessante dentro dos meus padrões. Mas, me apaixonei. Não foi no Brasil, encontrei um amor na Alemanha.

Amora Mautner sobre "Verdades secretas 2": "Erótica até em cena de duas pessoas tomando cafezinho"

Você começou a carreira aos 17 anos, estudando na Escola de Arte Dramática da USP. Walter Avancini te viu numa banca de apresentação e te convidou a fazer "Moinhos de vento", em 1983. Aí não parou mais. Você é filha de um economista e uma socióloga e a única referência que tinha no meio artístico era Renata Sorrah, sua tia. O que de mais importante aprendeu com ela?

Minha tararavó foi uma grande cantora de ópera. Eu não a conheci, nem a Renata. Mas quem começou isso para a gente foi a Renata mesmo. A seriedade com que ela leva a profissão é um ensinamento. Muita gente entra na profissão com outros objetivos, ser famoso, ganhar dinheiro. Sempre vi Renata trabalhando muito, é realmente uma operária de seu ofício. Tenho lembranças de eu pequenininha indo ver ela em "Vagas para moças de fino trato". Era ela, Glória Menezes e a Yoná Magalhães. Eu ficava na coxia.

Achava aquilo incrível! Aquelas três mulheres independentes, fazendo teatro, se concentrando no camarim, encenando a peça. Renata é minha madrinha, a gente tem uma ligação muito forte. Tenho uma lembrança antiga de quando ela me levou para a gravação de "Brilhante" ( novela ). Renata foi uma das primeiras atrizes a começar a produzir para fazer o que queria em teatro e sempre me incentivou a fazer isso. Ela me dirigiu para esse teste em que o Avancini me viu fazendo "A gaivota", do Tchecov.

Fora que ela sempre fez escolhas muito coerentes. Textos incríveis que sempre admirei também, Shakespeare, Tchecov, autores brasileiros maravilhosos. Nunca vi Renata fazer uma peça comercial, no sentido de só para ganhar dinheiro. Isso eu aprendi com ela. Acho que aprendi a ser atriz com ela, nesse sentido. A gente não é amador. Claro que ganha com isso, mas o objetivo primeiro não é o dinheiro. Procuro estar em projetos em que acredito, em que possa falar alguma coisa.

Tem o talento e tem a vocação, acho que essa vocação, o modo como ela leva a profissão, aprendi com ela. É uma das pessoas mais vocacionadas que conheço. Fora que é maravilhosa de trabalhar. É engraçadíssima.E lLeva muito a sério a profissão. Porque, caramba é, uma profissão, né? Hoje em dia, está uma loucura o que é ser ator no Brasil. Na verdade, coisa em relação à arte...

Você tem uma posição política crítica em relação ao atual governo, deixa isso claro nas suas redes. Pinta muito hater? Como lida?

Pinta. Costumo dizer que depende do meu ciclo hormonal ( risos ). Tem dia em que me dá uma raiva e saio respondendo. Minha filha fala: "Mãe, para com isso, não leva a nada". Eu sei, devem ser 50% robô. Ás vezes, consigo ignorar. Se estou na minha TPM "menopáusica", fico respondendo feito uma idiota.

É que acho uma burrice as coisas que falam, me irrita demais quando começa aquele "para de mimimi, a fonte secou, não pode mais mamar nas tetas". Como assim? Trabalho desde os 17 anos, um trabalho duro, horas gravando. As pessoas nem sabem o que é Lei Rouanet. Vai estudar! Nem mais Ministério da Cultura tem e botam na secretaria uma pessoa que deveria gostar de cultura, mas claramente não gosta.