Cultura

Deborah Secco: 'Tenho botado para fora emoções, sentimentos e coisas que não entendo muito bem'

Entrevistada de sua janela, atriz abre rotina com o marido e a filha na quarentena, revela que entrou em pânico ao descobrir que implante contraceptivo havia vencido e diz que tem pensado em novos projetos para cinema e teatro
Deborah Secco no "Entrevista na janela" Foto: Reprodução
Deborah Secco no "Entrevista na janela" Foto: Reprodução

A chegada do drone na varanda da casa de Deborah Secco , na Barra, animou a filha da atriz, Maria Flor.

— Ela está aqui fazendo caras e bocas — contava Deborah, por telefone. — Olha a careta, agora manda beijinho, filha.

Antes da pandemia, Deborah estava num ritmo intenso de trabalho, protagonizando a novela "Salve-se quem puder", e mal parava em casa. As gravações foram interrompidas por conta da Covid-19 , e os cuidados com a pequena, de 4 anos, passaram a ser a sua principal ocupação nessa quarentena, como ela conta na entrevista abaixo.

A atriz Deborah Secco é a quarta personalidade a estrelar a série Entrevista na Janela, do GLOBO. Na conversa com a repórter Maria Fortuna, Deborah falou sobre a relação com filha e marido em período de quarentena, do abandono das ações para fomento da cultura pelo governo Bolsonaro e da falta de perspectiva para a retomada das gravações da novela 'Salve-se quem puder'
A atriz Deborah Secco é a quarta personalidade a estrelar a série Entrevista na Janela, do GLOBO. Na conversa com a repórter Maria Fortuna, Deborah falou sobre a relação com filha e marido em período de quarentena, do abandono das ações para fomento da cultura pelo governo Bolsonaro e da falta de perspectiva para a retomada das gravações da novela 'Salve-se quem puder'

Deborah é a quarta participante do "Entrevista na janela", série em vídeo produzida pelo GLOBO, para este período em que cientistas e autoridades médicas recomendam o distanciamento social — o primeiro, foi o humorista Fábio Porchat , o segundo, o ator Antonio Fagundes , a terceira, Maitê Proença . A entrevista foi realizada pela repórter Maria Fortuna por telefone e gravada
por um drone.

Como tem se sentido durante a quarentena?

No começo, oscilei entre a euforia de poder estar com a minha filha e descansar, porque a batida estava grande, e uma tristeza absoluta por tudo que a pandemia representa. Mas com o passar do tempo, a gente vai perdendo a força, desmoronando mesmo. Antes, eu tinha a esperança de que não duraria muito, de que não teríamos tantas mortes... Tô aqui olhando o mar e tem 50 pessoas pegando onda ( a entrevista foi realizada antes das regras que flexibilizaram a quarentena no Rio ).

No início do isolamento, você chegou a comentar que Maria Flor estava feliz em ter os pais só para ela, postou fotos de várias brincadeiras, tudo uma alegria. Mas vamos combinar que quarentena com criança é fácil, né?

Nossa! Maria exige 24 horas por dia só para ela. Na verdade, ela dorme 10 horas, por isso não são 24 joras. Mas ela solicita o tempo inteiro, atenção, brincadeira. Às vezes, me perguntam: "Você não viu o WhatsApp?". Amooor! Eu não consigo nem pegar no telefone, tô com a Maria o dia inteiro. Quando eu preciso fazer algo, o Hugo ( Moura, marido da atriz ) fica, quando ele precisa, eu fico mais. Mas um de nós sempre tem que estar com ela. Isso é muito cansativo. Principalmente para mim, que sou intensa. Quero arrumar o cabelo dela... Hoje,  por exemplo, o drone está mostrando que ela foi arrumada pelo pai, com uma roupa que não combina muito ( risos ), cabelo meio desarrumado, o que me aflige. Me estresso mais.

Ser pai e mãe é padecer na pandemia?

Eu e Hugo somos muito pacientes. Há momentos estressantes, ela também está cansada. Não está fácil para ela também, longe da escola, dos amigos, da rotina, tudo é muito estressante: "poxa, mamãe, eu tento fazer tudo certo".... Mas aqui, um salva o outro. Quando Hugo está prestes a estourar, eu dou uma salvada e quando sou eu, ele salva. Nunca tivemos um estresse grande com a Maria.

Antes do coronavírus, a gente estava se questionando sobre quanto tempo deixávamos as crianças diante das telas. Veio a pandemia e agora tudo é virtual. Você libera geral?

Nunca fui uma mãe que não permitia eletrônico. Penso: O mundo tem eletrônico, então, ela não pode não ter contato. A preocupação era que não ficasse  o dia inteiro.  Mas como ela tinha uma rotina de escola, balé, natação e voltava para casa para jantar e dormir, deixava ficar meia hora no iPad para dormir. Mas nunca foi uma rotina excessiva. Não tinha que proibir, porque ela era muito ocupada. No fim de semana, era parquinho no nosso condomínio, praia, piscina, casa de amigos. Agora, na quarentena, acho que ela vê um pouco mais, mas não muito. Porque não está acostumada, então enjoa rapidamente.

Importante aprender lidar com o tédio, né?

Sim. Ela está aprendendo a brincar sozinha. Maria tem mania de falar sozinha, criar personagens imaginários, dançar sozinha, inventar histórias. Tem horas que a gente está sem fazer nada, mas nem interfere para ela poder viver no mundinho dela.

Como estão se dividindo na vida doméstica? Sei que o Hugo, seu companheiro, é mais de arrumar, passar pano na casa... E você, como tem contribuído?

A gente alterna. Eu tenho uma dificuldade de coordenação motora mesmo, de registrar que ali eu já limpei e preciso limpar o outro lado, fico meio perdida. Mas já estou bem melhor do que no começo. Basicamente, eu arrumo a cama, faço e dou comida para a Maria, dou banho nela... Ela fica mais comigo. Também faço a minha comida porque eu e Hugo acabamos comendo muito diferente. Ele é mais saudável; eu, mais "junk". Tô arrasando na massa gratinada, ousei a fazer massa com camarão e camarão com catupiry. Quando a gente faz bife à milanesa, que eu amo, o Hugo é que frita porque sou atolada, já tivemos pequenos acidentes. Minha cabeça faz diferente de como o  meu corpo age ( risos ). O Hugo passa aspirador, pano, varre, limpa vidro, bota as roupas para lavar, porque eu também não entendo de tecnologia, fico ali apertando os botões.

Pensadores e religiosos dizem que esse é um momento de fazer autoreflexões, de mergulhar em si mesmo. Mas como fazer isso com criança em casa, né? Tem encontrado tempo para você?

Eu, com uma criança em casa, não consigo. Fico imaginando quem tem três, quatro filhos. É uma dedicação constante, não consigo tirar o foco dela e colocar em mim. No tempo que tenho quando a coloco para dormir, escrevo. Boto para fora minhas emoções, sentimentos e coisas que não entendo muito bem. Tenho escrito muito. São argumentos para filmes, textos, possibilidades de peças. Vou escrevendo, porque e, talvez, um dia junte tudo isso e faça algo.

E a relação com marido na quarentena? Tem rolado sexo mesmo com toda essa dedicação à Maria?

Estava rolando, mas descobri que o meu implante hormonal estava vencido... E a gente ficou em pânico. Tivemos que repensar, saímos para comprar preservativo. Não posso engravidar, estou no meio de um trabalho. Mas, olha, está rolando. Não com aquela intensidade de casal sem filho ou de vida normal, mas sempre rola. Eu sou muito  apaixonada pelo meu marido, acho um homem interessante, delicioso, lindo, gostoso. Tenho muita admiração por ele e isso ajuda muito, né? Agradeço muito por ter escolhido ele. Nessa quarentena, dividir a vida dessa forma tão intensa com outra pessoa ia ser difícil, mas, com ele, é um privilégio, me ajuda a ser melhor a cada minuto.

Antes da pandemia você estava num ritmo de trabalho intenso, protagonizando a novela das sete, "Salve-se quem puder". Como foi quando tudo foi interrompido? Conversa-se sobre quando as gravações vão recomeçar, sobre o que vai acontecer?

Eu estava gravando seis dias por semana, 11 horas por dia. Chegava em casa e ainda tinha que decorar 30 cenas. Tentava dar atenção à Maria, botava para dormir toda noite, levava na escola de manhã. A gente se desdobra em mil para conseguir estar presente, né? De repente, tudo parou de forma abrupta, e a a gente nem consegue dar um abraço nos colegas, se despedir, fazer uma comemoração de pausa, como sempre fazemos. E a gente é tomado por uma incerteza... Conversamos bastante sobre como vai fazer, mas ninguém tem uma reposta ainda. Tem uma possibilidade de retorno em julho, agosto, setembro ou no ano que vem. Muito se diz que vamos retornar talvez sem maquiadores, cabeleireiros, fazendo a nossa própria caracterização, com a equipe usando aquela roupa de médico de UTI. Mas a grande verdade é que não sabemos. A gente nem sabe se está no auge da pandemia, se caminhamos para ele... Como é algo que nunca vivemos, ninguém consegue dar um parecer preciso. A gente fica tentando imaginar.

O que mais teve que interromper por causa da pandemia? Algum outro projeto?

Tinha uma viagem programada para Portugal quando acabasse a novela. Estava procurando um texto para o meu próximo filme. Quando faço cinema é de forma muito intensa, e eu tinha prometido, quando a Maria nasceu, que ficaria cinco anos sem fazer personagens que exigissem de mim essa ida embora de mim mesma por alguns meses. Queria ficar perto dela e fazê-la primeiro entender o que é a minha vida. Ela faz cinco anos no fim do ano, e eu estava me organizando para voltar ao cinema com uma grande personagem. Continuo querendo fazer uma temporada da peça que fiz com o Hamilton Vaz Pereira, comemorando meus 30 anos de carreira, em Portugal. As datas só foram prorrogadas.

No ano passado, o presidente Bolsonaro criticou o uso de dinheiro público para filmes como "Bruna Surfistinha", que você protagonizou. De lá para cá, muita coisa aconteceu, ou melhor, não aconteceu na pasta da Cultura... Como avalia o tratamento dado à arte por esse governo?

Acho que a cultura brasileira no momento é quase inexistente. O pouco que ainda resiste é um movimento de nós, artistas, de mãos dadas, lutando com empenho para não fazer tudo desandar de vez. É uma batalha. É um governo que não acredita na cultura, não acha que ter conhecimento e informação te torna mais preparado para a vida. A cultura te abre, joga luz em temas necessários. Acho que estamos num cenário atual bem ruim e preocupante. Mas nós artistas estamos cada vez mais unidos para resistir. O momento que estamos vivendo mostra o quanto a cultura é necessária para nossa saúde mental. Quando estamos sem muitas opções do que fazer, a música, a arte, os filmes, livros, a possibilidade de pintura salvam o ser humano. Ninguém conseguiria passar pela quarentena sem ouvir uma música, assistir a um filme, uma série, ler um livro.

O que anda vendo?

Vi a série "Todas as mulheres do mundo", que é leve, doce, sem grandes preocupações. Assisti ao flime "O poço", que é muito forte. Não sei de quem é, sou péssima de memória. Acho que gasto tudo decorando texto ( risos ). Mas meu livro preferido é "Um defeito de cor". É enlouquecedor de bom, chorei compulsivamente.

Qual é a primeira coisa que vai fazer quando tudo isso passar?

Abraçar minha família, minha mãe, minha irmão, meu sobrinho. Quero muito voltar a trabalhar. Amo o meu trabalho. Quero ir no mar, na cachoeira, tenho muita conexão com a água.