Exclusivo para Assinantes
Cultura

Escola de Cinema Darcy Ribeiro reage a ameaça de despejo

Direção diz que cursos continuarão mesmo com o pedido dos Correios para reaver o prédio onde funciona a sede da instituição
Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Centro do Rio, é ameaçada de despejo Foto: BRENNO CARVALHO / Agência O Globo
Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Centro do Rio, é ameaçada de despejo Foto: BRENNO CARVALHO / Agência O Globo

RIO — Ameaçada de despejo, a Escola de Cinema Darcy Ribeiro (ECDR) não vai alterar seus planos para 2020. Desde julho de 2019, a diretoria negociava a permanência no edifício que há 20 anos serve de sede para a escola, no Centro do Rio. Mas as tratativas tomaram um rumo inesperado na última sexta-feira. Responsáveis por ceder o imóvel, os Correios enviaram uma notificação extrajudicial pedindo a sua devolução. O tempo de cessão encerrou-se, mas ainda não há nenhuma solução para o destino da escola. A grade com os cursos deste ano está mantida, e a direção não trabalha com a hipótese de se mudar.

— Não vamos sair — afirma a produtora de cinema Renata Magalhães, presidente do Instituto Brasileiro de Audiovisual (IBAV), que gerencia a escola. — E, se a gente for obrigado, vai demorar para nos tirar. Vamos lutar juridicamente.

Na internet, o abaixo-assinado #ficadarcy já reúne mais de 7 mil assinaturas. Referência na formação e produção audiovisual, além da preservação de arquivos cinematográficos, a escola foi declarada Patrimônio Histórico Cultural Imaterial em 2018. Lá estão guardados acervos de personalidades como o diretor Joaquim Pedro de Andrade e o ator José Wilker . Nas últimas duas décadas, ela formou 20 mil alunos para a indústria do cinema e da televisão, entre roteiristas, diretores, produtores, montadores, editores e outras funções técnicas.

Secretaria Especial da Cultura: Cinco perguntas para Regina Duarte responder quando assumir

A notícia de um possível despejo mobilizou o setor. Alunos e professores se reuniram anteontem na escola.  A direção articulou um encontro com a superintendência dos Correios, marcado para hoje. Segundo informações de bastidores, os advogados da instituição já tentam sensibilizar autoridades do governo em Brasília. Até Regina Duarte, que pode ser confirmada a qualquer momento como a nova secretária da Cultura do governo Bolsonaro, já teria sido contatada, segundo fontes.

— Desde que soubemos da intenção dos Correios de reaver o prédio, vínhamos negociando normalmente antes da notificação. Até então, o órgão tinha sinalizado que havia interesse para que a escola permanecesse — conta Irene Ferraz, viúva de Darcy Ribeiro, e diretora da escola, que não trabalha com um plano B em caso de despejo. — Neste momento, a escola vai seguir funcionando regularmente. Estamos em plena atividade e não saíremos da sede.

Em nota à coluna de Guilherme Amado, na “Época” , os Correios responderam que estão avaliando “todo o seu patrimônio imobiliário” visando sua sustentabilidade financeira. O órgão, cuja privatização vem sendo discutida, também ressaltou que, desde 2000, cede o prédio sem contrapartidas para a ECDR.

Em um comunicado publicado em seu site, porém, a escola lembra que o espaço estava abandonado e se encontrava em “estágio avançado de deterioração” quando teve o seu uso cedido. Desde então, a instituição teria feito inúmeros investimentos para restaurar e adequar o edifício às funções educacionais. Atualmente, a escola funciona em cinco pavimentos, onde foram construídas diversas ilhas de edição, além de um estúdio, uma biblioteca, uma filmoteca e uma sala para exibição de filmes.

— Sair de lá representaria um prejuízo sem tamanho — diz Renata. — A ECDR é um instituto sem fins lucrativos, que faz trabalho social e oferece cursos a preços acessíveis, muitos deles subsidiados.

Ano perdido : Cineastas e produtores explicam a crise do setor

De acordo com Renata Magalhães, a antiga direção dos Correios chegou a planejar a doação da totalidade do prédio à ECDR durante o governo Temer. Procurada pelo jornal, a assessoria dos Correios não foi localizada até o fechamento desta edição.

— Pedir a devolução do imóvel é uma decisão burra do atual presidente dos Correios porque o espaço tem mais valor como uma escola funcionando do que vazio — diz Renata. — O órgão precisa entender a importância de uma instituição que abriga pessoas do Brasil inteiro.

Um dos nomes que apoiaram o tombamento da ECDR, o produtor de cinema Luiz Carlos Barreto acredita que o mercado do audiovisual “melhorou muito” desde a criação da escola.

— Ela é diferente de outros cursos universitários porque forma uma mão de obra de técnicos fundamentais para a indústria — diz Barreto, fundador da L.C. Barreto Produções. — Nossa produtora sempre contrata muitos profissionais saídos de lá.

Barreto, entretanto, vê a ameaça de despejo como uma questão técnica mais do que política.

— Pelo menos, é isso que eu espero — diz. — Não creio que seja parte de uma decisão do governo. Há uma certa precipitação em ver nisso um desmonte da cultura.