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Cultura

Festas Literárias da pandemia, em formato virtual, apostam em superproduções e atrações internacionais

Fliaraxá e Flup iniciam suas transmissões esta semana; Flip abrirá dia 3 de dezembro
Super produção: Flup viajou o mundo para entrevistar personalidades. Na foto, a jornalista Iman Rappetti entrevista o filósofo camaronês Achille Mbembe Foto: Divulgação
Super produção: Flup viajou o mundo para entrevistar personalidades. Na foto, a jornalista Iman Rappetti entrevista o filósofo camaronês Achille Mbembe Foto: Divulgação

RIO — Quando ficou claro que a maior parte das festas literárias não poderia acontecer presencialmente por causa da pandemia, os organizadores entraram em modo “reinvenção”, buscando oportunidades em meio à crise. Com os eventos agora voltados para as plataformas virtuais, as distâncias encurtaram, as estruturas e logísticas simplificaram.... e ficou mais fácil escalar nomes internacionais, tanto em lives quanto em vídeos pré-gravados. A IX Fliaraxá, por exemplo, que inicia hoje uma intensa programação de cinco dias, terá a sua maior participação de autores do mundo lusófono fora do Brasil entre todas as suas edições (21 no total, contra 5 em 2019). A programação reúne um total de cem autores de oito países, como o moçambicano Mia Couto , o angolano José Eduardo Agualusa e o cabo-verdiano Germano Almeida .

A Festa Literária das Periferias (Flup), que começa amanhã e vai até dia 8, é outra que terá destaques de fora, como o o renomado teórico pós-colonial camaronês Achille Mbembe. No caso da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), já acostumada a trazer autores internacionais ao Brasil, o desafio será mesmo mudar toda a dinâmica do evento, que também acontecerá apenas on-line (entre os dias 3 e 8 de dezembro). Agora com o nome Flip Virtual, aposta em atrações como a americana Eileen Myles e a inglesa Bernardine Evaristo, vencedora do Booker Prize em 2019.

Igualados pela mesma mídia de transmissão, os eventos tiveram que buscar novas formas de se diferenciar. A Flup, que desde 2012 traz autores para as comunidades, apostou numa espécie de turnê internacional. Graças a parcerias com o Goethe Institute, o Cervantes e a Embaixada da França, o idealizador do evento, Julio Ludemir, viajou a três continentes com sua equipe para gravar algumas das entrevistas que serão transmitidas ao longo do evento. O resultado foi uma superprodução, que contou com quatro câmeras de alta definição.

— Quando ficou claro que as transmissões on-line foram aceitas como a interlocução possível para os confinados, percebi que estava, pela primeira vez, em pé de igualdade com todos os festivais do planeta — conta Ludemir.

Na África do Sul, a equipe encontrou o camaronês Achille Mbembe, criador do termo “necropolítica”, que foi entrevistado pela jornalista sul-africana Iman Rappeti; na França, a militante antirracismo francesa Assa Traoré, nome importante do movimento de luta contra a violência policial; e, na Espanha, Rita Bosaho, primeira deputada negra de seu país. Os temas seguem a linha que norteia o evento, e trazem debates pautados pelo impacto recente da morte de George Floyd, que se tornou símbolo da violência policial contra a população negra este ano.

Além do conteúdo pré-gravado, a edição terá diversas atrações ao vivo, transmitidas virtualmente. E outras em um sistema híbrido, como o tradicional Rio Slam Poetry, presente desde 2014 na programação. Diferentemente dos anos anteriores, porém, a competição de poesia falada terá um grupo de 16 competidores e uma banca de jurados formada apenas por personalidades LGBTQIA+. As apresentações serão gravadas, mas avaliações e interações com poetas serão ao vivo.

Internacionalizar também foi um movimento natural para a Fliaraxá. A festa, contudo, manteve-se fiel ao seu lema “Não há uma língua portuguesa, há línguas em português” (frase de José Saramago), convidando apenas autores do mundo lusófono. Um dos mais aguardados encontros é o do escritor e biólogo moçambicano Mia Couto com o líder indígena, ambientalista e escritor Ailton Krenak , no domingo, às 18h, no encerramento da festa.

O QG da edição é o palco (sem público) do Teatro Tiradentes, no Grande Hotel de Araxá, em que o âncora e idealizador do evento Afonso Borges comandará as transmissões (algumas gravadas, outras ao vivo).

O evento fará transmissão 24 horas, com programação inédita durante todo o dia, de 8h às 22h, e depois depoimentos inéditos de escritores gravados em outras edições do evento, além de reprises de melhores momentos.

— A Fliaraxá se tornou possível graças ao trabalho árduo de um ano, tanto na logística quanto no conteúdo. Não são simples lives transmitidas de um quarto — diz Borges. — Nunca nomes tão importantes da literatura portuguesa foram reunidos em um mesmo festival como o deste ano.

O desafio da primeira Flip Virtual será encontrar uma linguagem própria, que esteja em consonância com o sentido original e o espírito da festa. Que é, nas palavras da organização: “estabelecer uma relação duradoura e permeável com Paraty”. Além das lives com convidados como Bernardine Evaristo e escritora colombiana Pilar Quintana, a Flip está produzindo uma série de vídeos com histórias e personagens da cidade.

— Estão sendo preparados encontros que qualificam a linguagem virtual em seu potencial artístico e poético, que, acreditamos, irão sensibilizar o público em toda a sua diversidade identitária — diz Mauro Munhoz, diretor artístico da Flip. — A pandemia mudou a relação de como o público consome arte. A linguagem virtual é um espaço muito amplo, que derruba as barreiras sociais e territoriais, mas deve ser utilizada de forma qualificada, como linguagem artística única.

Programações

IX Fliaraxá. De 28/10 a 1/11.Transmissão 24 horas pelos canais da festa. Informações no site www.fliaraxa.com.br . Gratuito.

Destaques: Lira Neto e Ignácio de Loyola Brandão (29/10, às 17h); Milton Hatoum, Teolinda Gersão e Ronaldo Correia de Brito (30/10, às 17h); Germano Almeida e Jeferson Tenório (31/11, às 16h); Ungulani Ba Ka Khosa e  Itamar Vieira Júnior (01/11, às 17h); Mia Couto e Ailton Krenak (01/11, às 18h)

Flup 2020. De 29/10 até 8/11.Transmissão ao vivo pelas redes sociais da festa. Informações: https://www.flup.net.br/programacao . Gratuito.

Destaques: Carla Akotirene e Djamila Ribeiro (31/10, às 17h); Mame Fatou Niang entrevista Maboula Soumahoro (6/11, às 16h45); Desmond Cole entrevista Grada Kilomba (7/11, às 20h);  Iman Rappetti entrevista Achille Mbembe (7/11, às 21h);

Flip Virtual. De 3 a 6 de dezembro de 2020. Entre os nomes confirmados estão Bernardine Evaristo, Itamar Vieira Junior, Eileen Myles, em datas e horários a serem confirmados. Transmissão ao vivo no site e nas redes do evento ( www.flip.org.br ) Gratuito.