A Justiça pode determinar nesta quarta-feira, dia 19 de outubro, o despejo de um dos cinemas de rua mais tradicionais da cidade, o Estação Net Rio, em Botafogo. A ação decorre de uma disputa entre o Grupo Severiano Ribeiro, proprietário do imóvel (o antigo Cine Star), e o Grupo Estação, locatário do espaço desde 1994 e que vem tentando desde 2019, sem sucesso, mais uma renovação de contrato.
A disputa, que envolve uma dívida de aluguel acumulada durante a pandemia de cerca de R$ 1,2 milhão (que os locatários dizem ter tentado negociar diretamente), virou um pedido de despejo em dezembro de 2020. Ano passado, a prefeitura incluiu os três complexos de salas do Estação (Botafogo, Rio e Ipanema) no Cadastro dos Negócios Tradicionais e Notáveis, e a tombou provisoriamente o imóvel do Estação Net Rio pelo valor “arquitetônico e cultural”.
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A decisão corre em segunda instância, e o julgamento será retomado quarta-feira, 19. Caso o Grupo Estação perca, terá que desocupar o imóvel, mesmo que decida recorrer.
— Neste caso, não seria o fim só do Estação Net Rio, mas de todos os cinemas do grupo. Ele é responsável por 40% do nosso faturamento, do ponto de vista econômico não daria para seguir — diz Adriana Rattes, cofundadora e sócia do Grupo Estação. — Significaria também o fim de uma história da resistência dos cinemas de rua da cidade, impactando outros negócios que cresceram na região atraídos pelo público cinéfilo.
Sócia do Estação e diretora executiva do Festival do Rio, Ilda Santiago avalia um possível fechamento do Net Rio como prejudicial a todo o cinema brasileiro:
— O Festival do Rio é realizado em vários circuitos, mas ele nasceu aqui. Assim como inúmeras estreias do cinema nacional aconteceram aqui. Não é uma questão só dessas salas ou de um grupo, mas de todo um segmento cultural. E da vida de uma cidade que ressoa como um tambor da identidade brasileira pelo mundo.
Como aconteceu no ano passado, artistas, realizadores, críticos e cinéfilos farão um ato simbólico às 19h de hoje, no saguão do Net Rio, apelando para uma solução negociada para a permanência do grupo que gerencia o local. No ano passado, o Grupo Severiano Ribeiro disse ter interesse de manter um cinema de rua no local, sob sua administração. Procurado agora, o GSR informou que “não comenta assuntos que já estão sendo tratados pela Justiça”.
Para o cineasta Walter Salles, o cinema Estação Net Rio "é um símbolo vital da cultura do Rio de Janeiro":
— Muitas gerações de cinéfilos e cineastas se formaram graças aos filmes que descobriram no Estação. Vendo esses filmes, entendemos melhor a complexidade do mundo que nos cerca. Se o cinema é antes de mais nada o lugar onde aflora o valor da tolerância, então perder o Estação seria perder uma parte de nossa sensibilidade coletiva — diz Salles, opinando que deveria haver uma ação do município neste momento. — A Prefeitura do Rio de Janeiro deveria, nesse momento tão crítico da vida brasileira, ajudar a preservar um dos lugares mais importantes da cultura na cidade. É urgente.