Cultura

Funarte deve definir, até a próxima semana, novo local para acolher acervo

Servidores alertam que transferência física de coleção histórica com mais de 1 milhão de itens não pode ser realizada com tanta agilidade; coordenadora foi exonerada por não colaborar com pressa do governo
Uma das salas do Cedoc da Funarte, em prédio interditado Foto: Maria Isabel Oliveira / Agência O Globo
Uma das salas do Cedoc da Funarte, em prédio interditado Foto: Maria Isabel Oliveira / Agência O Globo

O futuro do acervo da Funarte, que conserva mais de um milhão de relíquias da cultura brasileira, ainda é um mistério. A única certeza sustentada pela diretoria do órgão é que ele deve ser retirado, o mais rapidamente possível, do atual local onde se encontra — um prédio de 13 andares no Centro do Rio de Janeiro, interditado na última semana por apresentar graves problemas estruturais. A pressa com que o tema vem sendo tratado pelas autoridades, no entanto, tem gerado controvérsias.

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Após a repercussão do caso — e da publicaçao de uma matéria do GLOBO apresentando a situação do edifício —, o Ministério do Turismo exonerou a coordenadora do Centro de Documentação e Pesquisa (Cedoc) da Funarte, responsável pela manutenção do acervo, como noticiou a coluna de Lauro Jardim . Joelma Neris Ismael é servidora da Funarte desde 2006 e era coordenadora do Cedoc há três anos.

Funcionários da Funarte não receberam a notícia com surpresa. Joelma era vista por seus pares como uma servidora séria, defensora de fundamentos técnicos. Em reuniões internas, porém, representantes da diretoria reclamavam da postura da então coordenadora e achavam que ela impunha dificuldades para o processo de reestruturação em curso no órgão. O motivo da exoneração estaria aí.

— Ela era uma pessoa que trabalhava com calma, analisando laudos técnicos, sempre defendendo o acervo — conta um servidor ao GLOBO. — A direção considerava que ela não colaborava para a rapidez desejada na transferência do acervo. Se a ideia é tirar tudo do atual prédio e colocar rapidamente num depósito, acaba a pesquisa. E é como se o Cedoc perdesse sua função.

Uma das salas que armazena parte do acervo do Cedoc da Funarte, no Centro do Rio: prédio sera interditado Foto: Maria Isabel Oliveira / Agência O Globo
Uma das salas que armazena parte do acervo do Cedoc da Funarte, no Centro do Rio: prédio sera interditado Foto: Maria Isabel Oliveira / Agência O Globo

Internamente, circula a informação de que o acervo do Cedoc da Funarte será transferido para o Museu Casa da Moeda, também no Centro do Rio — a notícia não é confirmada oficialmente "para não atrapalhar negociações".  Haverá uma reunião, na próxima semana, para que o novo local seja enfim definido.

'Queremos estar no bonde certo'

A atual gestão da Funarte tem batido na tecla de que deseja, mais do que nunca, promover uma intensa difusão e divulgação de seu acervo. A intenção é popularizar as atividades da Funarte e conquistar jovens com conteúdos pensados para a internet, além de aumentar o número de seguidores em redes sociais — "Queremos estar no bonde certo", ressaltou ao GLOBO Marcelo Nery Costa, diretor executivo da instituição.

De fato, quando se fala em arquivo público, a regra básica é que ele tem que estar a serviço dos cidadãos ("Mas a garotada é mesmo o público-alvo da Funarte? A direção acha que um vídeo sobre Pixinguinha, por exemplo, vai dar 1 milhão de views no YouTube?", questiona um funcionário). Bibliotecários lembram que a preservação correta de um acervo público deve ser tratada sempre como principal prioridade.

— Existem situações que precisam de mais calma, até porque grande parte do acervo do Cedoc não está catalogada ou indexada — comenta um arquivista da Funarte. — E existe uma grande preocupação técnica com relação a essa mudança física do acervo, algo que pode acabar sendo feito de qualquer jeito. Não sabemos se o material será levado para depósitos... Esse é um processo muito delicado, que poderá gerar perdas de documentos dentro do próprio acervo.