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Cultura

Julia Louis-Dreyfus, de 'Veep', defende a 'comédia extrema para tempos extremos'

Atriz americana de 58 anos vive mais uma vez Selina Meyer, papel que lhe rendeu cinco Emmys seguidos
A sétima temporada de "Veep", com Julia Louis-Dreyfus Foto: Divulgação / Divulgação
A sétima temporada de "Veep", com Julia Louis-Dreyfus Foto: Divulgação / Divulgação

NOVA YORK — “Tempos extremos exigem medidas extremas; neste caso, comédia extrema.” É assim que a atriz Julia Louis-Dreyfus define o tom da série “Veep”, a sátira política que, para tristeza do mundo real, acabou se tornando uma expressão quase que constante da política não apenas nos Estados Unidos, mas em outros países, como o Brasil. A sétima e última temporada estreia neste domingo, na HBO (no Brasil, será exibida às 23h40m).

No lançamento no Lincoln Center, em Nova York, onde foram exibidos três episódios, foi possível perceber o que Louis-Dreyfus, vencedora de cinco Emmys consecutivos pelo papel, quis dizer. Nesta temporada, a protagonista Selina Meyer decide novamente se candidatar à presidência dos Estados Unidos, por motivações meramente egoístas, e inicia sua campanha pelo interior do país.

Ao chegar em uma pequena cidade, descobre que o palco onde faria o comício não foi montado por falta de pagamento aos fornecedores. A imprensa está chegando para o evento. Desesperada, Selina clama por um milagre. Um de seus assessores então diz: “Acaba de ocorrer um tiroteio em uma escola.” Ela vibra com a “graça alcançada”.

O público no Lincoln Center fica em silêncio. Muitos seguram o riso. Na tela, Selina vai em direção aos repórteres oferecer aquilo que os políticos americanos mais fazem quando um massacre acontece: pensamentos e orações. “Eu sei que vocês estão cansados de orações, mas acreditem, elas funcionam. Eu sou a prova.” O público então vem abaixo.

Durante entrevista ao GLOBO, a atriz foi questionada sobre a dificuldade de se fazer humor em tempos em que a realidade se torna a comédia da vida. Respondeu duramente:

“Exceto que não há comédia na vida real. É muito mais sério, vidas estão em risco, então não tem nada remotamente engraçado sobre o que está acontecendo na política mundial.”

Julia Louis-Dreyfus
Atriz

E em seguida faz outra reflexão sobre a ruptura dos limites entre realidade e ficção:

(A sátira) está se tornando real, mas ao mesmo tempo também não está. Por exemplo, tem um episódio em que a Selina está tentando fazer com que os edifícios federais fossem “verdes”, e tanto a deputada Nancy Pelosi quando a ex-senadora Barbara Boxer (ambas do Partido Democrata) tentaram a mesma coisa. E isso foi lá em 2012. E então começou esse ciclo bizarro de vida imitando a arte. Eu sei… Sinto muito pelo que está acontecendo no Brasil.

Sim, Louis-Dreyfus está acompanhando a política brasileira com o mesmo fastio com que acompanha o cenário nos EUA. Segundo ela, os dois países participam do renascimento de um “neofascismo muito assustador”.

Mas é da boca do ator Tom Hale, que na série interpreta Gary Walsh, o puxa-saco apaixonado por Selina, que vem a redenção para aqueles que se sentem desconfortáveis com os altos níveis de politicamente incorreto do programa.

— Eu acho que há coisas no mundo que não são risíveis, mas que são tão absurdas que você quase sente vontade de rir delas. Então, para mim, “Veep” é esse espaço de riso livre — diz ele.

Nesta temporada, o personagem mais irritante da série, o ex-funcionário da Casa Branca Jonah Ryan (Timothy Simmons), também decide se candidatar à presidência. Mas, sem papas na língua, é obrigado por seus assessores a passar por um media training antes de participar de um debate na televisão. Para não esquecer os palavrões que não pode pronunciar, faz uma cola na mão, não sem antes dizer em uma entrevista que reconhece ser totalmente despreparado para o cargo.

Quando informado pela reportagem de que o presidente brasileiro fez as duas coisas durante sua campanha, o ator riu incrédulo.

— Qualquer pessoa que volte ao início da série vai ver coisas que, naquela época, eram consideradas completamente inapropriadas; se fossem ditas ou feitas na vida real, acarretariam em seríssimas consequências aos políticos que interpretamos. Hoje, simplesmente, não significam nada mais — diz Simmons. —E, pior, hoje em dia você pode dizer que essas coisas não apenas não prejudicam a imagem de um político como ainda por cima o ajudam a ter mais popularidade. Então, quando você diz que no Brasil vocês estão vivendo isso, não é nada divertido. Na série, no entanto, é divertido.

This publicity image released by HBO shows Julia Louis-Dreyfus in the comedy series "Veep." Louis-Dreyfus was nominated for a Golden Globe for best actress in a comedy series for her role in "Veep" on Thursday, Dec. 12, 2013. The 71st annual Golden Globes will air on Sunday, Jan. 12. (AP Photo/HBO, Lacey Terrell) Foto: Lacey Terrell / AP
This publicity image released by HBO shows Julia Louis-Dreyfus in the comedy series "Veep." Louis-Dreyfus was nominated for a Golden Globe for best actress in a comedy series for her role in "Veep" on Thursday, Dec. 12, 2013. The 71st annual Golden Globes will air on Sunday, Jan. 12. (AP Photo/HBO, Lacey Terrell) Foto: Lacey Terrell / AP

A atriz Anna Chlumsky, alçada à fama com o filme “Meu primeiro amor” e que na série interpreta a assessora Amy Brookheimer, não apenas acompanha a política brasileira, mas também fala português — ela teve um namorado e tem vários amigos brasileiros. E diz que, como atriz, é difícil falar as barbaridades que saem da boca de sua personagem.

— É um enorme desafio de interpretação quando você está fazendo essas cenas e vê as pessoas rindo das coisas horríveis que esses personagens dizem — observa ela.

Mas as referências a políticos são intencionais? Julia Louis-Dreyfus, que também é produtora da série, é categórica ao dizer que não se trata de uma paródia. E que as eventuais críticas do presidente americano a este ou a outros programas que o ridicularizam a fazem pensar em apenas uma coisa:

— Por que ele está fazendo comentários sobre um programa de comédia em vez de governar o país?