RIO — Entre as melhores obras de não ficção do ano estão livros que abordaram a questão do racismo, os traumas longínquos e muito próximos da história brasileira e a vitalidade da cultura popular. Ainda houve espaço para o mundo dos sonhos.
Abaixo, a lista dos melhores livros de não ficção lançados em 2019. As escolhas foram feitas por Bolívar Torres, Emiliano Urbim, Mànya Millen e Ruan de Sousa Gabriel — confira também os destaques na ficção .
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‘Escravidão - Volume 1’
Laurentino Gomes
Por trás deste primeiro de três volumes a serem publicados pela Globo Livros estão seis anos de pesquisa, nos quais o autor da trilogia histórica “1808”, “1822” e “1889” visitou 12 países de três continentes. Laurentino revive, com linguagem acessível e dados chocantes, a “tragédia humana de proporções gigantescas” — com foco no Brasil, que recebeu 5 milhões de escravizados.
‘O oráculo da noite’
Sidarta Ribeiro
De onde vêm os sonhos? Para que servem? Como interpretá-los? Não é misticismo, é ciência. A partir de fontes históricas, antropológicas, psicanalíticas e até literárias, além das referências mais atualizadas da biologia molecular, da fisiologia e da medicina, o renomado neurocientista Sidarta Ribeiro compõe uma narrativa cativante e inspiradora neste título da Companhia das Letras.
‘O corpo encantado das ruas’
Luiz Antonio Simas
Coletânea de ensaios curtos, com referências que vão de João do Rio a Walter Benjamin, “O corpo encantado das ruas” (Record) celebra saberes da cultura popular carioca. Definindo-se como “um historiador cronista”, Simas diz que prefere não falar nem da Zona Sul nem da favela, mas da classe média baixa, suburbana: “Eu gosto de pensar a historicidade das pessoas comuns”.
‘Tornar-se palestina’
Lina Meruane
Em “Tornar-se palestina”, título de 2013 lançado este ano no Brasil pela Relicário, a escritora chilena vai da prática à teoria. Descendente de palestinos cristãos emigrados para o Chile, primeiro a autora narra a viagem que fez em 2012 à terra de seus antepassados. Em seguida, ela examina a linguagem usada para descrever o conflito com Israel — com direito a críticas às propostas de paz sugeridas por outros intelectuais.
‘Ideias para adiar o fim do mundo’
Ailton Krenak
Adaptação de duas palestras e uma entrevista realizadas em Portugal entre 2017 e 2019, a publicação da Companhia das Letras tem 72 páginas preenchidas com a lucidez do ambientalista descendente do povo Krenak, que vive no Vale do Rio Doce, em Minas Gerais. O livro enaltece a cultura indígena e prega uma humanidade mais diversa como antídoto para salvar o planeta.
‘Sobre lutas e lágrimas: Uma biografia de 2018’
Mário Magalhães
Autor de “Marighella: o guerrilheiro que incendiou o mundo”, Magalhães tomou para si o desafio de escrever à quente uma biografia do ano anterior — a Record lançou o título em maio de 2019. O resultado é um relato engajado que consegue dar a dimensão histórica de um ano que teve o assassinato de Marielle Franco, a prisão de Lula e a eleição de Jair Bolsonaro.
‘Sobre o autoritarismo brasileiro’
Lilia Moritz Schwarcz
A antropóloga e historiadora defende que, desde sua formação, a sociedade brasileira se caracterizou por ser hierarquizada, violenta, racista e frequentemente adepta de soluções antidemocráticas. O livro, publicado pela Companhia das Letras, tem linguagem clara e acessível, parte de um esforço de Lilia para levar informações coletadas com rigor acadêmico ao grande público.
‘A doença e o tempo: Aids, uma história de todos nós’
Eduardo Jardim
Neste título da Bazar do Tempo, o ensaísta e filósofo Eduardo Jardim investiga a viagem do vírus HIV desde a África até sua chegada ao Brasil, acompanhando seus efeitos pelo mundo. Em diálogo com autores que trataram do tema, como Susan Sontag, o livro analisa, de forma lúcida e sensível, como a Aids alterou a nossa perspectiva sobre a experiência humana e o próprio tempo.
‘Pequeno manual antirracista’
Djamila Ribeiro
Em onze capítulos curtos, contundentes e indispensáveis, a filósofa e ativista trata, nesta obra publicada pela Companhia das Letras, de temas como atualidade do racismo, negritude, branquitude, violência racial, cultura, desejos e afetos. Além disso, Djamila apresenta caminhos para o leitor que quiser assumir a responsabilidade pela transformação do seu entorno.
‘Memórias da plantação’
Grada Kilomba
Publicado originalmente em inglês em 2008 e lançado este ano no Brasil pela editora Cobogó, o livro mais vendido da Flip 2019 apresenta já no subtítulo sua proposta simples e poderosa. Ao elencar “episódios de racismo cotidiano”, a multiartista e escritora portuguesa busca desmontar a normalidade do preconceito.
Nascida em Lisboa, descendente de angolanos e são-tomenses, Grada, 51 anos, pinça histórias de seu dia a dia, das mais reflexivas às mais dolorosas, e as enriquece com elementos de teoria pós-colonial, estudos da branquitude, psicanálise, estudos de gênero, feminismo negro e trechos de prosa poética. Assim, um relato sobre insultos raciais pode passar por conceitos de Hegel, por mitologia grega ou pela biografia de Malcolm X, atualizando o discurso acadêmico sobre o tema.