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Nobel de Literatura sem diversidade: apenas três negros e 15 mulheres venceram o prêmio em 119 anos

Europa concentra mais de 77,5% dos vencedores; América Latina tem apenas seis
Premiada em 1993, a americana Toni Morrison ainda é a única mulher negra a vencer o Nobel de Literatura Foto: SARA KRULWICH / NYT
Premiada em 1993, a americana Toni Morrison ainda é a única mulher negra a vencer o Nobel de Literatura Foto: SARA KRULWICH / NYT

RIO — Desde que foi criado, em 1901, o Nobel de Literatura já contemplou 116 escritores dos quatro cantos do mundo, mas a falta de diversidade ainda é uma das marcas da premiação. Até hoje, apenas 15 mulheres receberam a láurea (ATUALIZAÇÃO: com o prêmio de 2020, o número subiu para 16 ), sendo Toni Morrison (1931-2019) a única autora negra contemplada, há 27 anos. A desigualdade se reflete também na origem dos nomes escolhidos: 77,5% deles são europeus.

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A primeira mulher a receber o Nobel de Literatura foi a sueca Selma Lagerlöf, em 1909. Cinco anos depois de ser premiada, a autora de “A saga de Gösta Berling” (não publicado no Brasil) também se tornaria a primeira mulher a entrar para a Academia Sueca, responsável por escolher os vencedores do prêmio.

Entretanto, o seleto grupo só voltaria a laurear uma mulher em 1926. A escolhida foi a italiana Grazia Deledda, “por seus escritos de inspiração idealista, que tratam dos problemas humanos em geral com profundidade e simpatia”, como justifica o site da premiação.

A maioria dos prêmios femininos se concentram nas últimas três décadas: de 1990 para cá, nove mulheres venceram o Nobel de Literatura. Antes da americana Toni Morrison, em 1993 , apenas dois negros haviam sido contemplados.

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O primeiro foi o nigeriano Wole Soyinka. O autor de "O leão e a joia" (publicado no Brasil pela Geração) foi também o primeiro africano a levar o prêmio, em 1986. Seis anos depois, foi a vez do escritor Derek Walcott, natural da ilha de Santa Lúcia, na América Central. O poeta, que escreveu o épico “Omeros” (Companhia das Letras) como uma espécie de “Odisseia” caribenha, foi laureado graças à sua “obra poética de grande luminosidade, sustentada numa visão histórica, fruto de um compromisso multicultural”, de acordo com o site da premiação.

Na avaliação da escritora e colunista do GLOBO Ana Paula Lisboa, a desigualdade no Nobel de Literatura reflete os elitismos estruturais da sociedade:

— Numa sociedade racista, classista, homofóbica, misógina, em que cabem todas as opressões, todas elas também cabem na literatura. Qual é o corpo que representa a imagem do escritor? Ele ainda é definido no masculino, como alguém que mora no norte do mundo, branco, de meia-idade, com doutorado — critica.

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90 dos 116 vencedores eram europeus

A disparidade geográfica também é presente na história do Nobel da Literatura. Dos 116 vencedores, 90 eram europeus — incluindo aqueles com dupla nacionalidade, como J. M. G. Le Clézio, vencedor em 2008 e cidadão da França e da República de Maurício, na África.

Além dele, somente outros quatro escritores africanos receberam a láurea. Já os Estados Unidos acumulam 12 prêmios até o momento.

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O primeiro asiático a vencer a premiação foi o indiano Rabindranath Tangore, em 1913, quando a Índia ainda fazia parte do Império Britânico. Depois dele, seriam necessários 31 anos para que outro nome fora do eixo Europa — Estados Unidos fosse contemplado: em 1945, a chilena Gabriela Mistral se tornou a primeira autora latino-americana a vencer o Nobel.

Além de Mistral, outros cinco escritores da América Latina já levaram o prêmio. A Austrália ganhou apenas uma vez, em 1973, com Patrick White. Entre os seis asiáticos, há dois japoneses (Yasunari Kawabata, vencedor da edição de 1968, e Kenzaburō Ōe, premiado em 1994) e um chinês (Mo Yan, de 2012).