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Autora mais vendida da Flip 2015, Matilde Campilho fala da dedicação à poesia

Portuguesa encerrou a série Encontros O GLOBO Pós-Flip nesta quarta-feira recitando vários poemas de seu livro de estreia, 'Jóquei'
A poeta portuguesa Matilde Campilho e a jornalista Mariana Filgueiras, mediadora do evento Foto: Ana Branco / Agência O Globo
A poeta portuguesa Matilde Campilho e a jornalista Mariana Filgueiras, mediadora do evento Foto: Ana Branco / Agência O Globo

RIO - Se a Festa Literária de Paraty foi uma "experiência fora do mundo" para a poeta portuguesa Matilde Campilho - informalmente, ela foi a musa do evento, e formalmente, a participante que mais vendeu livros -, os dias que se seguem também vêm se mostrando como versos imprevisíveis. No debate que encerrou a série Encontros O GLOBO Pós-Flip, nesta quarta-feira, na Livraria da Travessa do Leblon, ela foi surpreendida, pouco antes de subir ao tablado, pela notícia de que seu interlocutor da noite, o também poeta Carlito Azevedo, não poderia aparecer.

Nada que assustasse, mas um bom motivo para mudar o rumo da prosa. Subvertendo o formato mais comum dos debates literários, a jornalista do GLOBO Mariana Filgueiras, mediadora do evento, fez uma ou duas perguntas introdutórias e logo pediu para Matilde ler um dos poemas de seu livro de estreia, "Jóquei" (Editora 34) - o tal mais vendido em Paraty.

Logo veio de alguém do público um "é só isso que a gente quer", para risadas gerais. Primeira leitura feita - foram várias ao longo da noite -, a plateia tomada por gente de todas as idades pareceu ficar mais à vontade e não facilitou (no bom sentido) para Matilde.

— Poeta tem raiva? — perguntou um dos presentes.

— Claro que tem. E dor de barriga também.

— É mais difícil ser poeta no Brasil ou em Portugal? — indagou outra, depois de Matilde contar que passou uma temporada no Rio entre 2010 e 2013.

— É difícil ser poeta em qualquer lugar do mundo. É como falar da diferença entre emprego e trabalho. A poesia me persegue, estou sempre olhando o mundo. Viver de poesia não digo que vivo ainda, faço uns trabalhinhos por fora. Mas se me perguntam o que sou, sim, sou poeta.

Mariana lembrou que conheceu Matilde por um vídeo no YouTube.

— Ouvir Matilde ler seus versos faz a gente recuperar o prazer de ouvir a voz recitando — disse a mediadora, lembrando a habilidade da escritora em responder as perguntas com sotaque carioca e voltar ao português de Portugal sempre que recita. — Você começou em voz alta nos vídeos e só depois lançou o livro em Portugal. Qual é a diferença?

— Foi um formato que precisei naquela época — contou Matilde. — Morava no Brasil e queria contar o que estava descobrindo. No fim das contas aproveitei pouco daqueles versos no livro, mas foi fundamental para eu entender como a oralidade era importante para a escrita.

A oralidade ajudou, mas o processo de feitura do livro foi longo e doloroso. Ao responder a pergunta "poesia se aprende?", Matilde deu exemplos de como sua criatividade dependeu da disciplina.

— Tudo se aprende. Você tem que estudar todos os dias. Acordo todos os dias às 7h da manhã e escrevo até a hora do jantar. Entendo que só assim tenho a possibilidade de não me repetir.

A poesia também lhe deu a chance, contou, de aprender a dizer "não". Em um dos momentos mais delicados na noite, Matilde foi enfática ao responder se a poetisa portuguesa Florbela Espanca (1894-1930) era uma referência para ela.

— Gostar de poesia não significa necessariamente gostar de toda poesia. Sei da importância dela, mas nunca me bateu forte. O que não quer dizer que não possa acontecer um dia. Demorei a ver graça em David Bowie, e hoje tenho todos os discos dele.

Depois de passar pelos problemas sociais de Rio e Lisboa e até mesmo pela recente decisão da Academia Brasileira de Letras em não premiar obras de poesia neste ano - Matilde se limitou a responder que tem dificuldades com a palavra "academia" -, a conversa acabou com gente da plateia pedido para a autora recitar um poema específico, "o da página 116". Como quem pede um bis especial no fim de um show.