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Escritora argentina Selva Almada vem ao Brasil lançar novela ‘O vento que arrasa’

Elogiada por Beatriz Sarlo, autora participa de debate no Instituto Cervantes de São Paulo
A escritora Selva Almada Foto: Janaína Figueiredo
A escritora Selva Almada Foto: Janaína Figueiredo

BUENOS AIRES - Sua primeira novela nasceu como um conto, foi ganhando volume ao longo do processo de escrita e terminou se tornando um grande sucesso. Um sucesso que surpreendeu a jovem autora argentina Selva Almada, sobretudo pelo inesperado e generoso apoio de escritores de longa trajetória e prestígio internacional, como a conterrânea Beatriz Sarlo, que fizeram rasgados elogios a “O vento que arrasa”, que chega ao Brasil pela Cosac Naify. Na próxima quarta-feira, às 19h30m, Selva estará no Instituto Cervantes de São Paulo para apresentar sua novela ao público brasileiro, num bate-papo com o tradutor Samuel Titan Jr. A emoção é grande e ela, que já tem livros traduzidos na Europa, assegura, em entrevista ao GLOBO, que continua achando “um grande mistério saber por que um livro funciona tão bem e outros não”.

— “O vento” é quase como um sussurro, uma novela pequenina, bem curta, que fala, essencialmente, sobre a fé — conta Selva, na sala de seu simpático apartamento do bairro de Flores, na capital argentina.

A escritora nasceu em 1973 e morou até os 27 anos na província de Entre Rios, uma das mais próximas de Buenos Aires. Seu passado no interior do país tem enorme influência em seus livros. Selva resgata o ritmo da vida longe das grandes cidades e a linguagem provinciana também está muito presente em seu trabalho, principalmente em sua segunda novela, “Ladrilheiros”, que chegou às livrarias argentinas em 2013.

No “vento”, como se refere à sua novela, convivem apenas quatro personagens: o Reverendo Pearson, sua filha Leni, um mecânico chamado Gringo Bauer e seu filho, Tapioca. O encontro entre os quatro dura menos de 24 horas e ocorre no meio do nada. O Reverendo e Leni estão a caminho da inauguração de um templo quando o carro em que viajam enguiça e precisa ser consertado. Ambos terminam na oficina de Bauer, e ali começa uma convivência intensa entre os personagens.

— São pessoas que têm muito a ver entre elas, mesmo que não pareça. Leni e Tapioca são dois adolescentes criados sozinhos, sem mãe e com pouco contato com outros jovens.

Para Selva, o mecânico e o Reverendo são personagens que funcionam “como um espelho”.

— Ambos têm muita fé, mas acreditam em coisas diferentes. O Reverendo, em Deus, e o mecânico, na força da natureza — explica a autora, que, só após terminar o romance, percebeu ser a fé o leitmotiv de sua obra. — É uma coisa estranha, porque eu não acredito em nada, não sou uma pessoa de fé.

A novela chamou a atenção da ensaísta Beatriz Sarlo e de outros escritores argentinos, e chegou a ser escolhida como o melhor livro do ano em 2012 pela “Revista Ñ”, do grupo Clarín. Sarlo comprou vários exemplares de “O vento que arrasa” e presenteou alguns de seus amigos com eles, como contou a Selva quando ambas, finalmente, se conheceram. “Quando o li pela primeira vez, tive a certeza de que estava diante de uma narradora original”, escreve Sarlo na orelha da edição brasileira. “Nós, leitores, avançamos indecisos e fascinados, à espera de uma labareda de violência ou de desejo: talvez um vento arrasador”.

— A crítica de Beatriz Sarlo foi superimportante, ajudou muito — admite a escritora.

No ano passado, Selva lançou “Meninas mortas”, livro que, ao contrário dos dois anteriores, fala sobre fatos reais. A escritora investigou o assassinato de três jovens na década de 80 e, inspirada em “A sangue frio”, o clássico de Truman Capote, relatou o horror vivido pelas vítimas e suas famílias. Este ano, o livro foi relançado na esteira de uma onda de protestos em repúdio aos cada vez mais frequentes feminicídios que ocorrem na Argentina. Segundo estatísticas de ONGs locais, a cada 30 horas uma mulher é assassinada no país.

— Minha escrita já está muito atrelada à realidade, mas em “Meninas mortas” as histórias são totalmente verdadeiras, fiz um profundo trabalho de campo — afirma Selva.

Sua próxima novela está em suspense, já com 60 páginas escritas, o que é bastante para esta jovem escritora que ainda não se vê editando obras longas. Em determinado momento, Selva decidiu começar de novo.

— Voltei a ler tudo e não gostei do que encontrei.