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Leia poema de Nicanor Parra que vai compor antologia

'Só' é um dos 70 poemas que integram 'Antologia poética', a primeira do chileno no Brasil
O poeta chileno Nicanor Parra em Isla Negra, Chile, em julho de 2004 Foto: VICTOR ROJAS / AFP
O poeta chileno Nicanor Parra em Isla Negra, Chile, em julho de 2004 Foto: VICTOR ROJAS / AFP

RIO - Belo na estrutura e no lirismo, o poema “Só” é um dos cerca de 70 que vão compor “Antologia poética”, de Nicanor Parra, a ser lançada pela Editora 34 no segundo semestre deste ano. Será a primeira vez que o poeta chileno ganhará uma publicação no Brasil. A obra, com tradução de Joana Barossi, estava em gestação antes mesmo do anúncio de sua morte, aos 103 anos, no mês passado. “Só”, publicado aqui com exclusividade, é do livro “Canções russas”, de 1967. É o sexto da carreira de Parra, um matemático de formação que revolucionou a poesia hispano-americana nos anos 80 e criou a antipoesia. Seu primeiro livro foi “Cancioneiro sem nome”, de 1937, mais tarde renegado. Na antologia, só entrarão poemas escritos entre 1954 e 1972.

[ poeta Nicanor Parra | livro Canções Russas,
1967 | tradução Joana Barossi ]
Pouco
a
pouco
fui
ficando
Imperceptivelmente:
Pouco
a
pouco.
É triste a situação
De quem gozou de boa companhia
E por algum motivo a perdeu.
Não me queixo de nada: tive tudo
Mas
sem
me
dar
conta
Como uma árvore que perde uma a uma suas folhas
Fui
ficando
pouco
a
pouco.
[ poeta Nicanor Parra |
livro Canções Russas, 1967 |
tradução Joana Barossi ]
Pouco
a
pouco
fui
ficando
Imperceptivelmente:
Pouco
a
pouco.
É triste a situação
De quem gozou de boa companhia
E por algum motivo a perdeu.
Não me queixo de nada: tive tudo
Mas
sem
me
dar
conta
Como uma árvore que perde uma
a uma suas folhas
Fui
ficando
a
pouco
pouco.

UM CELEIRO DE GRANDES ESCRITORES

Com dois prêmios Nobel de Literatura na bagagem — Gabriela Mistral em 1945 e Pablo Neruda em 1971 — o Chile é um reconhecido celeiro de grandes escritores. Mas, para além dos nomes mais célebres, como Roberto Bolaño e Alejandro Zambra, há livros e autores menos conhecidos no Brasil, alguns esquecidos pelo tempo, como José Donoso, e outros eternamente obscuros, como Maria Luisa Bombal.

“A última névoa e a amortalhada” (Cosac Naify), de Maria Luisa Bombal

Escritora vanguardista, Maria Luisa Bombal teve uma vida turbulenta e curta. Amiga de Jack Kerouac, era admirada por Jorge Luis Borges e Juan Rulfo, além do cineasta John Huston. Apesar de ter marcado gerações com sua prosa enigmática, ela é pouco conhecida fora do Chile e são raros os seus livros publicados no Brasil. O mais recente, “A última névoa e A amortalhada”, de 2014, recupera duas novelas dos anos 1930 que refletem, em tramas surrealistas, sobre a condição feminina.

“Dez mulheres” (Alfaguara), de Marcela Serrano

Best-seller no Chile e lançado no Brasil em 2012, o livro de Marcela Serrano compõe um mosaico de sentimentos universais, como perda, velhice, amor e separação, através do olhar de dez vozes femininas, de diferentes gerações. Em comum, as narradoras arriscam alto em seus relacionamentos, sem medir consequências. Marcela começou a escrever aos 38 anos e só publicou o primeiro livro aos 40. Ganhou diversos prêmios literários em seu país, como o Sor Juana Inés de la Cruz.

“Jamais o fogo nunca” (Relicário), de Diamela Eltit

Considerado um dos 25 melhores livros em espanhol dos últimos 25 anos pelo “El País”, “Jamais o fogo nunca” é um exemplo do estilo experimental de sua autora, de 68 anos, que esteve na Festa Literária de Paraty em 2017. Crítica literária, ensaísta, vídeo-artista, romancista e ativista política, Diamela Eltit revê suas experiências pessoais para mergulhar nos traumas de uma sobrevivente do regime militar no Chile. Presa mentalmente às dores do passado, ela revê o cárcere e a perda do filho.

“O obsceno pássaro da noite”, de José Donoso

Após longa demora no processo de escrita, José Donoso lançou, em 1970, aquele que é considerado seu livro mais ambicioso. Sufocante e inclassificável, o romance o levou com destaque ao chamado “boom da literatura latino-americana” dos anos 1960, embora o autor seja hoje bem menos famoso que outros do grupo, como García Márquez e Julio Cortázar. Segundo seu conterrâneo Roberto Bolaño, a literatura de Donoso é “um quarto escuro onde lutam as feras”.