Cultura Livros Flip

Na Flip, Djaimilia Pereira de Almeida diz: 'a faculdade me tirou a vontade de escrever'

Angolana participou da terceira mesa ao lado de Natalia Borges Polesso e Carol Rodrigues
A escritora Djaimilia Pereira de Almeida participa de mesa na Flip Foto: Ana Branco / Agência O Globo
A escritora Djaimilia Pereira de Almeida participa de mesa na Flip Foto: Ana Branco / Agência O Globo

PARATY — Três autoras se reuniram na terceira mesa da programação oficial da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), realizada nesta quinta-feira. O debate, chamado “Ponto de fuga”, juntou a angolana Djaimilia Pereira de Almeida, a carioca Carol Rodrigues e a gaúcha Natalia Borges Polesso. O encontro, mediado pelo professor Leonardo Tonus, foi realizado em um esvaziado Auditório da Matriz.

Bastaram um pouco menos de 20 horas para que o primeiro assunto polêmico para os católicos fosse abordado no palco da Flip, que este ano acontece dentro da Igreja Matriz da cidade. Depois de ser perguntada pelo mediador sobre se representar negros e gays na literatura é suficiente para dar visibilidade a esses grupos, Carol leu um trecho de um conto de "Sem vista para o mar" (Edith, 2014) que fala de um romance entre dois rapazes. Ao fim da leitura, respondeu:

— É claro que só representar na literatura não é suficiente. O que a gente faz é abrir um espacinho para o aquilo que não é inferno. A gente faz um exercício de abrir espaço mental para esses assuntos. A contemporaneidade aparece porque ela esta aí. O que a gente faz é compartilhar isso — argumentou.

Em "Esse cabelo" (LeYa), lançado este ano no Brasil, Djamilia conta a história de Mila, uma imigrante africana em Portugal que reflete sobre sua identidade a partir do próprio cabelo e da reação que ele causa nas pessoas. O livro mistura ficção, ensaio e um pouco da experiência própria da autora.

— Muita gente diz que é um romance ensaístico. Outros dizem que é um ensaio com personagens. Passei muitos anos estudando literatura, entrei na universidade com o objetivo de ser escritora. Mas a faculdade me tirou a vontade de escrever — explicou ela, que doutorou-se em teoria da literatura na Universidade de Lisboa: — Por muitos anos não escrevi nada profissionalmente. Depois de algum tempo, tentei escrever de maneira criativa e percebi que estava tão habituada ao rigor acadêmico que não sabia o que fazer com a liberdade da ficção. Esse livro reúne as tentativas de uma pessoa que está a tentar se habituar com a ideia de ser livre.

Natalia, que tem o mesmo título pela PUC-RS, disse que lida com um problema oposto:

— O meu texto literário vaza para o texto acadêmico. É muito difícil para mim domar o texto e torná-lo formal.

SC Paraty (RJ) 27/07/2017 Mesa 'Pontos de fuga' na Igreja da Matriz, com Natalia Borges Polesso, Djaimilia Pereira de Almeida e Carol Rodrigues, mediada por Leonardo Tonus Foto: Ana Branco / Agência O Globo
SC Paraty (RJ) 27/07/2017 Mesa 'Pontos de fuga' na Igreja da Matriz, com Natalia Borges Polesso, Djaimilia Pereira de Almeida e Carol Rodrigues, mediada por Leonardo Tonus Foto: Ana Branco / Agência O Globo

Perguntada se a literatura produzida em português atinge todos os países lusófonos da mesma maneira, Djamilia disse que o cenário ainda não é o ideal. Para ela, no entanto, há muitas pessoas interessadas para que esse diálogo entre diferentes nações aconteça:

— O cenário ideal para mim é que o leitor português leia autores brasileiros e vice-versa sem qualquer preconceito ou ideia feita. Que seja uma coisa completamente natural. Ainda não chegamos ao momento em que temos um diálogo completamente harmonioso, mas algumas editoras estão fazendo um diálogo significativa para levar literatura brasileira a Portugal.

Natalia completou:

— Acho que não conseguimos mesmo fazer uma conexão com os outros países lusófonos além de Portugal. Fui a Macau recentemente e conheci escritores que sequer ouvi falar.

Antes da mesa, foi exibido o primeiro vídeo da série "Fruto estranho", que ficou a cargo da poeta e tradutora Josely Vianna Baptista.