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Por Talita Duvanel — Rio de Janeiro

Em dezembro de 1896, por um “inconveniente de saúde”, o escritor Valentim Magalhães teve que “ausentar-se da capital”, como explicou em carta, e não pôde comparecer a uma das sessões preparatórias para a fundação da Academia Brasileira de Letras. Para compensar a falta, deu ao colega Lúcio de Mendonça um exemplar de “Flor de sangue”, livro de sua autoria. O gesto marcou o início da coleção bibliográfica da ABL, que hoje tem mais de 180 mil volumes, divididos por duas bibliotecas, a Lúcio de Mendonça, batizada em homenagem a um dos fundadores, que ocupou a cadeira 11, e a Rodolfo Garcia, que leva o nome do quarto ocupante da cadeira 39.

Localizada no segundo andar do Petit Trianon, num espaço de 250m² dividido em três ambientes, a Lúcio de Mendonça (que guarda o tal exemplar de “Flor de sangue”) é a joia da coroa da ABL, com cerca de 33 mil volumes, a maioria deles pertencente a quem ocupou e ocupa as cadeiras da casa.

— A Biblioteca Acadêmica Lúcio de Mendonça tem por finalidade preservar a memória e a realização dos acadêmicos — diz Arno Wehling, cadeira 37, atual diretor das bibliotecas. — Ela busca ser uma importante fonte de pesquisa sobre a obra de cada um, permitindo que pesquisadores interessados nos temas, acadêmicos ou não, possam consultá-las. Além disso, promove ações culturais que divulgam o acervo, como exposições sobre a vida e a obra desses autores. É um dos dos mais significativos pontos de referência de pesquisa, não apenas do Rio de Janeiro, mas do Brasil.

Espaço de aconchego

As imensas estantes de madeira maciça que acolhem as publicações dos imortais guardam também bibliotecas particulares de alguns dos maiores nomes que por lá passaram. A começar pelo “dono da casa”, Machado de Assis. Em 1965, a herdeira do escritor, Laura Leitão de Carvalho (sobrinha-neta de Carolina Augusta Xavier de Novais, a mulher de Machado) e seu marido, marechal Leitão de Carvalho, doaram à Academia a biblioteca particular de Machado, com quase mil exemplares. Os temas são variados e os idiomas, também. Há obras em português, francês, inglês, alemão e espanhol, e todas, no momento, passam por um processo de digitalização.

—Nos livros, encontramos anotações do próprio Machado, assinaturas e dedicatórias, que constituem fontes de pesquisa sobre o homem, o escritor, seus interlocutores e a época — diz Wehling, que é historiador . — A digitalização é um dos projetos prioritários da Biblioteca Lúcio de Mendonça, pois protegerá os originais do manuseio intenso e, principalmente, permitirá a divulgação, propiciando a pesquisadores e demais interessados do mundo todo a consulta ao material.

Segundo Wehling, parte da coleção já estará na internet “a partir de setembro ou outubro”, e a ideia é, no futuro, fazer o mesmo com as bibliotecas pessoais de Olavo Bilac, Afrânio Peixoto e Manuel Bandeira.

A biblioteca de Bandeira, aliás, é a maior coleção particular de um acadêmico na casa: são 3.500 volumes, doados em vida pelo poeta, que morava perto do Petit Trianon, na Avenida Beira-mar, e costumava ir a pé para as sessões e circular pela Lúcio de Mendonça. Ainda hoje, o salão da biblioteca é um lugar de aconchego para os acadêmicos.

—Além de espaço de consulta para os pesquisadores, as salas tornaram-se um espaço de sociabilidade muito utilizado pelos acadêmicos, onde são discutidos assuntos de interesse comum e projetos a desenvolver — conta Wehling. —Aí se realizam também gravações de entrevistas e depoimentos e reuniões, eventualmente com participantes externos, sobre a programação acadêmica.

Além do papel

Um vasto acervo museológico, que conta capítulos da história de grandes nomes da literatura nacional, também pode ser visto por quem passeia pela Academia numa quarta-feira, quando acontecem as visitas guiadas, ou por quem agenda uma pesquisa. Estão expostos na Lúcio de Mendonça, por exemplo, a caneta-tinteiro de Euclides da Cunha, a escrivaninha, cadeiras e itens pessoais de Olavo Bilac, ou um ramo de carvalho de tasso, presente de Joaquim Nabuco para Machado de Assis. Chama atenção também uma estante lotada de bibelôs, todos com uma referência a livros, coleção do acadêmico Josué Montello, quarto ocupante da cadeira 29, que morreu em 2006.

— A biblioteca tem essas particularidades, esse registro da arte de colecionar — diz o coordenador das bibliotecas, Julio Cesar Mendonça, que trabalha ali há 20 anos e já encontrou, nos livros particulares, folhas, fotos, cartões. —Isso mostra o hábito de vida e das sociedades.

Enquanto a Lúcio de Mendonça ostenta um ar tradicional, a biblioteca Rodolfo Garcia, inaugurada em setembro de 2005 no segundo andar do Palácio Austregésilo de Athayde, vizinho ao Petit Trianon, traz uma brisa de contemporaneidade. O que não significa que seu acervo seja menos robusto: ali estão guardadas 150 mil obras.

— A Rodolfo Garcia é uma biblioteca de temática cultural ampla, voltada para a literatura, as humanidades e as ciências sociais — diz Wehling. — Atende a um público diversificado, como estudantes, profissionais de diferentes áreas e pesquisadores e cumpre assim papel relevante na aproximação da Academia com a sociedade.

Em seu enorme patrimônio bibliográfico espalhado pelas duas bibliotecas, a ABL orgulha-se também de guardar exemplares raros, como as primeiras edições de “Dom Casmurro” e “Memórias póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis, “Os sertões”, de Euclides da Cunha, e “As religiões do Rio”, de João do Rio, que foi diretor da biblioteca Lúcio de Mendonça entre 1909 e 1913. O acadêmico por mais tempo à frente da biblioteca foi Barbosa Lima Sobrinho, por 23 anos, entre 1956 e 1979.

Uma primeira edição de “Os Lusíadas”, de 1572, e uma publicação seiscentista das obras do Padre Antônio Vieira são outros tesouros da casa de Machado.

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