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Por Ruan de Sousa Gabriel — São Paulo

Nada tira o bom humor de José Simão, o Esculhambador Geral da República — nem mesmo o gato que lhe deu uma rasteira poucos dias antes do lançamento de “Definitivamente, Simão!”, seu novo livro. O jornalista quebrou o fêmur e precisou passar por uma cirurgia. Enquanto a médica aplicava a anestesia, ele denunciava: a culpa era do gato!

“Definitivamente, Simão!” é a biografia do autor e do país. Com seu inconfundível estilo exclamativo, e famoso por bordões como “Buemba! Buemba!” e “Nóis sofre mais nóis goza!”, o colunista da Folha de S. Paulo mistura suas memórias à história brasileira recente e fala sobre vedetes, futebol, novelas, o desbunde na ditadura.

Semanas após a cirurgia, o paulistano Simão, de 78 anos, conversou por telefone com o GLOBO. Detonou a classe política e revelou, em primeira mão, os planos eleitorais do Partido da Genitália Nacional, fundado por ele e pelo jornalista Ricardo Boechat (1952-2019), com quem dividia um programa de rádio.

Você diz que Bolsonaro transformou o Brasil no “pior lugar do mundo”, mas não dá ao presidente a satisfação de deixá-lo de mau humor. Como manter o bom humor?

Tenho uma amiga baiana que diz: “Eu não atravessei a caatinga para ficar de mau humor.” Esse gostinho eu não vou dar para o Bolsonaro, não! Uma psiquiatra me disse que é da indignação que nasce o humor. O que posso fazer quando fico indignado? Esculhambar. Mas esculhambar a sério. O humor é demolidor, é coisa séria. Nunca neste país o humor foi coisa tão séria.

Por quê?

O Brasil é o país da piada pronta. Temos a pior classe política do mundo. Gente de quinta categoria. A melhor definição para Bolsonaro é “O insepulto”. As pessoas ficam indignadas porque ele não lamenta 600 mil mortes, mas miliciano é assim: “Morreu? Foda-se.”

Você apelidou Geraldo Alckmin de “Picolé de Chuchu”. O que achou da apropriação bem-humorada do apelido pelos apoiadores da chapa Lula-Alckmin?

Alckmin é muito bem-humorado. Ele é do interior, do tipo que conta piada no cafezinho. Muita gente pensa que Picolé de Chuchu quer dizer fraco, frouxo. Não. Picolé de Chuchu é sem graça, sem carisma. Vamos combinar: Alckmin não tem carisma nenhum! O carisma dele é a falta de carisma. Realmente, Lula e Alckmin são um casal meio esdrúxulo.

Por que decidiu contar a História do Brasil a partir das memórias afetivas?

“Definitivamente, Simão!” não parece título de música da Anitta? Rarará! Meu editor, Matinas Suzuki, queria que eu escrevesse um livro sobre a história do Brasil. Tive ideia de contar essa história através das minhas experiências: carnaval, ditadura, anos 1980, novelas. Amo o Brasil. Quando viajo por 15 dias, já sinto saudade. Uma americana me disse: “Ai, as cidades do Brasil cheiram.” Respondi: “É por isso que eu gosto! E as cidades americanas, que cheiram a bacon?” Não vem que não tem!

No livro, você se diz apaixonado por Anitta e Pabllo Vittar.

Elas são empoderadas, desafiam a moral da nossa época! São como as vedetes dos anos 1950! Coitada da Anitta, não vai poder transar por 15 dias! (devido a uma cirurgia de endometriose) Vamos combinar que é uma eternidade? Admiro a posição política dela, que não é petista, mas vai votar em Lula pela liberdade e democracia. É uma posição lúcida.

Você diz que não vê mais novela porque viraram “água de salsicha”. E “Pantanal”?

Também não, mas vi no Instagram que o Caetano está assistindo e me interessei. Faz falta ver uma novela, né? Sou fã da Nazaré, nossa primeira vilã cômica! As novelas mudam o comportamento do brasileiro. Tinha um casal de amigos gays que só foram aceitos pela mãe de um deles quando passou uma novela com um casal gay! Foi mágico! Na época de “Caminho das Índias”, fui ao interior do Maranhão e todas as meninas tinha uma pinta vermelha na testa! Um dia, estava vendo uma novela, não lembro qual, e chegava um cara com carrinho de bebê e ele e a mulher começavam a falar de como o bebê era fofo! Desliguei! Eu gosto de novelas inventivas, como as da Glória Perez!

Você cobriu as Copas de 1994 e 1998. O hexa vem?

Não acompanho mais futebol. Torcia para o São Paulo, mas aí todos os jogadores foram para o Corinthians! Larguei o futebol! Rarará! Adorava Copa do Mundo para fazer piada com todos os países! Torço tanto que uma vez eu quebrei a testa numa porta e levei quatro pontos! Fui cobrir a Copa de 1994 com duas úlceras que apelidei de Romário e Bebeto. A Copa do Tetra foi eletrizante!

Você passou os anos da ditadura nas Dunas da Gal. Acredita que seu humor anárquico tenha alguma relação com ter vivido o desbunde dos anos 1970?

Sim! Na ditadura, você entrava ou na luta armada ou na contracultura. Eu fui parar em Arembepe, uma praia na Bahia que o pessoal da contracultura frequentava. A gente não queria nem a direita, nem a esquerda, mas uma coisa nova. Para você ter uma ideia, eu achava que Libelu (a organização trotskista Liberdade e Lula, influente na esquerda paulista à época) fosse uma boate do Nelson Mota! Rarará! Parece mesmo nome de boate, não acha?

Por falar nas Dunas da Gal. Cazuza tentava entrar na turma, mas vocês não deixavam. Por quê?

Ele era muito novinho! Nas Dunas da Gal, ficávamos o Jorge Mautner, o Waly Salomão, o Caetano... Era o desbunde mesmo! O Mautner cantava, o Caetano usava uma cuequinha cor-de-rosa... E o Cazuza ficava ali perto, sentadinho numa toalha. A gente via, mas nem ligava para ele! Quem diria que aquele menino ali sozinho viraria o que virou?

Como ter passado a ditadura entre o Rio e Arembepe contribuiu para a sua formação?

A Bahia é uma terra que me escolheu. Quando eu cheguei em Arembepe, parecia que já havia estado lá. Esse meu humor escrachado vem de lá. Coisas que eu falo, como “Vai indo que eu não vou” é humor baiano. O rio também foi muito importante para a minha formação, para o meu repertório. O humor carioca não é escrachado como o baiano, mas tem um elemento gozador.

E o humor de São Paulo?

Amo São Paulo. Não trocaria nem por Bali. São Paulo tem um humor judaico-cristão, muito sutil e sarcástico. Aqui, você acha até lugar para ouvir música indie às três da manhã de uma terça-feira! Não falta opção. E o que eu faço? Fico em casa e peço delivery! Rarará! Paulista tem mania de delivery. Brinco que São Paulo é onde todo mundo come todo mundo. Paulista come espaguete em silêncio! Sem chupar nem nada! Rarará!

Qual o programa do Partido da Genitália Nacional para as eleições deste ano?

A defesa de tudo o que é considerado obsceno e chulo. Como o topless.

"Definitivamente, Simão!", livro do jornalista José Simão — Foto: Reprodução
"Definitivamente, Simão!", livro do jornalista José Simão — Foto: Reprodução

Serviço:

“Definitivamente, Simão!”. Autor: José Simão. Editora: Objetiva. Páginas: 280. Preço: R$ 64,90.

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