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Por , Especial para O GLOBO

O acervo de Clarice Lispector (1920-1977) alojado no Instituto Moreira Salles, no Rio, conta com 896 livros que pertenceram à biblioteca pessoal da escritora. Um dos mais manuseados é uma edição de 1961 do chinês “I Ching, o Livro das Mutações”, texto clássico que, entre outras coisas, também serve de oráculo.

— Presumir como unicamente oracular o contato da autora com a obra chinesa limita a abertura de novas vias de acesso à complexidade de seu trabalho e as surpreendentes convergências entre Lispector e o campo das artes orientais, em especial a chinesa — afirma a pesquisadora Marília Malavolta, que lança agora o livro “Clarice Lispector e o clássico chinês I Ching” (Editora Unesp).

Ordem universal

A prática de consulta ao I Ching marcou a construção criativa de outros artistas, como Jorge Luis Borges, Octavio Paz, John Cage, Ricardo Piglia e, entre os brasileiros, Caio Fernando Abreu, Paulo Leminski e Cristóvão Tezza. “É, estritamente falando, uma teoria: é uma visão da ordem universal que estimula nossa imaginação, desde que não seja aplicada mecanicamente”, justificou Paz.

Ao analisar a obra clariceana, Marília não encontrou citação direta do I Ching em seus escritos, mas notou vários elementos referenciais. Como a presença dos números 7, 8 e 9 que, ao lado do 6, são os algarismos com os quais são identificadas as linhas positivas e negativas do I Ching.

Assim começa, por exemplo, um parágrafo de “Água viva” (1973): “Mas 9 e 7 e 8 são os meus números secretos. Sou uma iniciada sem seita. Ávida do mistério. Minha paixão pelo âmago dos números, nos quais adivinho o cerne de seu próprio destino rígido e fatal. E sonho com luxuriantes grandezas aprofundadas em trevas: alvoroço de abundância, onde as plantas aveludadas e carnívoras somos nós que acabamos de brotar, agudo amor — lento desmaio”.

A admiração de Clarice pelas ciências ocultas era motivo de graça e apreensão dos amigos. Lygia Fagundes Telles se divertia ao relembrar uma viagem que fizeram juntas para Cali, na Colômbia. “O avião balançava muito e eu estava preocupada. Clarice se voltou para mim e disse: ‘Não tenha medo porque o avião não vai cair. Minha cartomante disse que eu morreria deitada, portanto, fique tranquila’”, disse.

— O I Ching oferece o uso de signos representacionais, e portanto mais afins aos anseios de escrita da Clarice: traços, ideogramas e símbolos — observa Marília. — Entendendo o I Ching como uma fração de uma rede extensa e complexa de formação e de prática, eu diria que sua presença na obra de Clarice responde, de um lado, por uma certa continuidade criativa, de natureza, portanto, intuitiva, e, de outro, por uma apropriação estética.

Olga Borelli, que foi secretária de Clarice por mais de dez anos, não via o fascínio da escritora pelos chamados fenômenos ocultos como questão de fé ou crença.

— Para ela, essas coisas se articulavam como algo mágico, poético, ainda inexplicáveis pelo pensamento puramente racional ou científico. Havia nela, quanto a isso, uma mescla de sentimento lúdico, estético e religioso. Era assim, por exemplo, quando consultava o I Ching — comentava.

Marília também não acredita que Clarice escolheu o I Ching em detrimento de outras formas de consulta, como tarô e cartas:

— Além de um oráculo, a presença do I Ching em sua obra, como repositório singular de pensamento, sabedoria, simbologias e expressão orientais, não pode ser medida como busca objetiva e deliberada, nem mesmo quando são notórias as apropriações estéticas.

‘Qual o meu futuro?’

Clarice, porém, deixou provas de seu apreço pelo I Ching. O escritor Antônio Xerxenesky, no blog do Instituto Moreira Salles, publicou um artigo em que apresenta parte do acervo da autora e, além dos livros, ele informa que Clarice deixou vários papéis com rascunhos para cálculos de respostas fornecidas pelo I Ching. Algumas das perguntas estão rabiscadas, como “Qual é o meu futuro de um modo geral?”. Curiosamente, esse questionamento está em uma folha de agenda datada de 10 de dezembro de 1974, quando ela completou 54 anos.

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