Cultura

Maria Bethânia critica fala de Bolsonaro sobre desaparecido político: 'Barbaridade'

Presa durante a ditadura, cantora baiana, que estreia turnê nesta sexta, também não gostou da declaração do presidente sobre nordestinos: 'Somos nobres'
Maria Bethânia Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Maria Bethânia Foto: Leo Martins / Agência O Globo

RIO — Maria Bethânia está bem-humorada. Chega ao local da entrevista, um estúdio em São Conrado, festejando o sol que bate no jardim (“não imagina o frio que está em minha casa”, diz ela, que mora ali perto e evita se deslocar muito por causa do trânsito). A cantora usa um colar com a aliança de casamento dos pais e uma foto deles estampada num pingente. Diz “olá” para o cachorro Pepê, que circula por ali, antes de iniciar a conversa.

A cantora Maria Bethânia Foto: Leo Martins / Agência O Globo
A cantora Maria Bethânia Foto: Leo Martins / Agência O Globo

E o papo começa lembrando como julho foi um mês atípico para a cantora e cerca de 400 felizardos que conseguiram vê-la de perto, em quatro apresentações intimistas (100 pessoas em cada dia) no Clube Manouche, no Rio. Foi uma temporada concorridíssima — ingressos esgotados em cinco minutos, anônimos dividindo centímetros quadrados com personalidades como Chico Buarque, Cacá Diegues e Regina Casé —, que serviu como uma espécie de prévia de “Claros breus”: a turnê em casas de espetáculo começa amanhã no Credicard Hall, em São Paulo, chegando ao Rio em 4 e 5 de outubro (Km de Vantagens Hall) , para depois passar por Belo Horizonte, Recife e Salvador. Os ingressos já estão à venda pelo site Tickets for Fun.

ENTREVISTA: 'Enquanto minha voz ficar fortinha, vou cantar', diz Maria Bethânia

No Manouche, o público se sentava a poucos centímetros da artista. A ponto de ela alcançar o copo de um espectador, a quem pediu água. A cena aconteceu na estreia, mas fez tanto sucesso com a plateia que acabou se repetindo. Em outro momento, incomodada com um homem que não tirava os olhos do celular durante o show, Bethânia arrumou um jeito particular de dar o troco.

— Podia acontecer qualquer coisa no palco que ele não estava nem aí. Aquilo foi me dando tanta irritação que peguei o rabo da minha saia, passei em cima dele, e o telefone voou longe — conta a cantora, rindo da cena.

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Agora, Bethânia sabe que terá que encarar não um, mas uma barreira de celulares — desta vez, apontados para ela.

— Hoje, ninguém mais assiste nada ao vivo, todo mundo vê pela telinha — observa ela. — Minha irmã ( Mabe l) cansa de me telefonar da Bahia dizendo: “Bethânia, acabei de ver seu show, fulana estava aí e fez transmissão ao vivo”.

Maria Bethânia Foto: Divulgação / Jorge Bispo
Maria Bethânia Foto: Divulgação / Jorge Bispo

Nesta conversa, Maria Bethânia conta as novidades da turnê e fala da situação política do país, o que raramente faz publicamente ("não gosto de política, a minha tribuna é o palco"). Ela critica a fala de Bolsonaro sobre nordestinos ("Não gosto que falem mal da minha região, nós somos nobres"), e também a recente declaração do presidente sobre o desaparecimento de Fernando Santa Cruz, pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, durante a ditadura (Bolsonaro insinuou que ele teria sido morto por um grupo de esquerda).

— É uma barbaridade. Tive irmão exilado, milhares de amigos mortos, sumidos. Durante três anos, na ditadura, fui obrigada a me apresentar toda semana no DOI-CODI, por conta do livro “Maria Bethânia, guerreira guerrilha”, do Reynaldo Jardim. Não podia sair do país. Também fui presa — lembra. — Foi difícil, sofrido, Deus me livre, quero nem lembrar daquela época. Quase morri, meu irmão também. Aí me perguntam “você não quer morar em Portugal?”. Não! Eu sou brasileira, quero morar no Brasil. Não quero morar em lugar nenhum além daqui. A não ser que não deixem. Leia a entrevista completa aqui.