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Ícone da surf music, Hoodoo Gurus lança novo disco e vocalista revela: 'Nenhum de nós jamais subiu numa prancha'

Sucesso do rock australiano no Brasil nos anos 1980 e 1990, banda lança seu primeiro álbum em uma década
O grupo australiano Hoodoo Gurus, com o vocalista e guitarrista Dave Faulkner ao centro Foto: Christopher Ferguson / Divulgação
O grupo australiano Hoodoo Gurus, com o vocalista e guitarrista Dave Faulkner ao centro Foto: Christopher Ferguson / Divulgação

Na crista de uma onda que trouxe nomes como Spy v.Spy, Australian Crawl e GANGgajang, os Hoodoo Gurus se sagraram no Brasil como uma das bandas mais populares do rock australiano dos anos 1980 e 90. Em 1989, tiveram lançado no país o seu LP mais conhecido, “Magnum cum louder” (de hits como “Come anytime” e “Another world”) e, seis anos depois, aportaram para os primeiros shows por aqui. Em março de 1997, há exatos 25 anos, eles tiveram seu momento de glória ao encher o Metropolitan, no Rio, com seu rock sessentista e, por vezes, até um pouco punk.

— Fizemos a passagem de som à tarde e o lugar pareceu enorme. Na hora do show tinha muita gente, piramos com aquilo — recorda-se o cantor e guitarrista Dave Faulkner, de 64 anos, que na sexta volta com “Chariot of the gods”, primeiro álbum dos Hoodoo Gurus em uma década. — Os fãs brasileiros sempre apareciam para falar com a gente quando tocávamos nos Estados Unidos e diziam: “vocês têm que ir ao Brasil, vocês são muito populares lá!” Quando finalmente conseguimos ir, foi incrível. E o engraçado é que alguns fãs ficaram chocados com o quão rock n’roll éramos. Quando tocávamos coisas como “Axegrinder” ( faixa de “Magnum cum louder” ), eles se assustavam!

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Dave Faulkner ainda se diverte com a reputação de banda de surf music que os Hoodoo Gurus ganharam no Brasil.

— Nosso som se espalhou pelas praias brasileiras. Mas foi algo que aconteceu também na Califórnia, porque havia um filme de surfe que circulava em fitas VHS com três ou quatro músicas nossas, que todos viam e reviam. Por causa disso, até aqui na Austrália as pessoas acreditam que nós temos fortes conexões com o surfe — revela ele, que ostentava uma camisa florida na entrevista por Zoom. — O negócio é que nenhum de nós jamais subiu numa prancha, é terrível! E, ironicamente, hoje moro de frente para Bondi Beach, uma das melhores praias de Sidney.

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Gravado aos poucos, ao longo de dois anos, “Chariot of the gods” faz uma brincadeira, em seu título, com o livro do autor suíço Erich von Däniken, “Chariots of the gods?” (1968), traduzido no Brasil como “Eram os deuses astronautas?” – um hit entre os adolescentes brasileiros no começo dos anos 1980 com suas teorias de que civilizações da antiguidade teriam recebido de viajantes alienígenas a tecnologia que as possibilitou executar suas grandes obras arquitetônicas.

— A banda sempre gostou desses títulos bregas, como “Mars needs guitars” e “Stoneage Romeos”, que soam épicos, como se fossem de filmes de Hollywood. O próprio livro é bobo, nada daquilo é verdade, os astronautas não construíram as pirâmides! — protesta Dave. — E, para ser bem sincero, o título veio também pelo fato de nós quatro sermos deuses, e o Hoodoo Gurus, a nossa carruagem ( risos ). Mas a canção-título fala de algo mais sério, quase como um filme de terror, que é você se sentiria ao ser destruído por uma civilização com mais tecnologia que a sua. Ou seja: o que os povos indígenas passaram após a chegada dos europeus, ao enfrentar armas e doenças invencíveis.

Sério, Dave Faulkner também foi em “Get out of Dodge”, rock de “Chariot of the gods” no qual ele conta sobre uma cidade “de mentalidade estreita”, onde as pessoas estão “cegas pelo ódio”.

— Essa canção fala de como o mundo ficou polarizado, do algoritmo do YouTube que joga você para mais e mais teorias da conspiração... e de como é ser uma minoria, seja sexual ou racial, que não é aceita. O que você pode fazer numa situação dessas? Na canção eu digo: “saia logo daí, se puder, procure um lugar seguro para ser quem você é” — conta. — Usei o recurso cômico de ambientá-la num faroeste cheio de caubóis, mas é uma história que acontece nos dias de hoje, em todo lugar.

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Nos 10 anos em que os Hoodoo Gurus ficaram sem gravar, muito aconteceu. Por exemplo: Mark Kingsmill, baterista do grupo desde 1984, se cansou das turnês e decidiu se aposentar em 2015.

— Eu não tinha certeza se a banda ia continuar sem o Mark. E quando o Nik (Rieth, o atual baterista) entrou, não sabíamos se estávamos prontos para ele. Tivemos que experimentar outros bateristas para nos certificarmos de que ele era a pessoa certa. Nik mudou um pouco nosso estilo, ele tem mais suingue, o que trouxe um novo sabor para as nossas canções. Mas, ao mesmo tempo, é Hoodoo Gurus, ainda somos os mesmos caras! — festeja Dave Faulkner.

Capa do álbum "Chariot of the gods", do grupo australiano Hoodoo Gurus Foto: Reprodução
Capa do álbum "Chariot of the gods", do grupo australiano Hoodoo Gurus Foto: Reprodução

Na quinta-feira, às 17h do Brasil, “Chariot of the gods” terá um pré-lançamento feito em uma live, com show da banda, cujos ingressos estão sendo vendidos no site da eMusic Live . O disco chega ao streaming na sexta, mas ganha também uma versão em vinil, com três faixas adicionais.

— Eu coleciono LPs e mesmo que não haja um mercado enorme para esses discos hoje, ainda sim compensa editá-los. Fico feliz de que vamos ter um disco em formato físico, que podemos ter nas mãos e olhar a capa — alegra-se o cantor. — E o melhor é que, como gravamos muitas canções, deu para fazer um LP duplo e botar as faixas que ficariam fora na versão para o streaming. Essas faixas, por sinal, só estarão disponíveis apenas no vinil, você não vai achá-las em nenhum outro lugar.

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A previsão do australiano é voltar ao Brasil com os Hoodoo Gurus no ano que vem – as turnês mais longas ficam mais escassas até porque Nik, o baterista, trabalha em uma galeria de arte.

— Hoje em dia fazemos mais turnês nos fins de semana, tem sido bem mais difícil fazer com que as pessoas saiam de casa numa terça-feira à noite! — alega Dave, para quem a idade dos integrantes em nada afetou a disposição para fazer shows. — Até onde sabemos, não perdemos nada em termos de energia, intensidade e habilidade para tocar as nossas músicas!