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Cultura Música

'A música sempre falou muito sobre o que estava acontecendo no Brasil', diz historiador Luiz Antonio Simas

Professor elencou músicas menos conhecidas que retratam episódios específicos da História Brasileira; ouça a playlist
Jackson do Pandeiro gravou 'Ele disse', uma versão musicada do testamento de Getulio Vargas Foto: Sebastião Marinho / Acervo O Globo (16-09-1972)
Jackson do Pandeiro gravou 'Ele disse', uma versão musicada do testamento de Getulio Vargas Foto: Sebastião Marinho / Acervo O Globo (16-09-1972)

Da Proclamação da República ao Cangaço. Da morte de Getúlio Vargas ao confisco das poupanças no governo Fernando Collor. A História do Brasil está documentada na música popular brasileira. E as canções podem ser uma ferramenta de aprendizado.

É o que defende o professor e historiador carioca Luiz Antonio Simas . Nesta semana, ele publicou em suas redes sociais uma lista de canções ligadas a momentos específicos da História do Brasil.

— Muitos professores fazem isso. É algo que uso há muito anos na sala de aula. A música é como um documento da História do Brasil. Sempre falou muito sobre as coisas que estavam acontecendo no país. É um vestígio do tempo, assim como um discurso, um texto, uma notícia de jornal — diz Simas.

Ele explica que a lista disponibilizada no Twitter é pequena diante de todo o acervo que pode ser usado para esse fim. Nesta seleção, Simas optou por elencar títulos menos conhecidos. A vantagem, hoje, afirma, é que muito desse material está disponível gratuitamente na internet, especialmente no Youtube, o que facilita seu uso em sala de aula.

Ouça a playlist


Para Simas, usar a música em sala de aula não se trata apenas de escolher uma ferramenta mais lúdica de aprendizado.

—  É também mostrar que a História não é produzida apenas pelo documento oficial, mas que ela vai sendo produzida pela canção popular, pelo sambista, pela cantora. A música, assim como os filmes, os livros, são documentos sobre o tempo. É importante mostrar isso para essa geração que está mais fechada nas redes sociais — explica.

O historiador Luiz Antonio Simas Foto: Ana Branco / Agência O Globo
O historiador Luiz Antonio Simas Foto: Ana Branco / Agência O Globo

Simas destaca algumas canções da lista como suas favoritas. Entre elas, a gravação de Jackson do Pandeiro de "Ele Disse", "a carta testamento de Getulio Vargas transformada num forró", "De Teresina a São Luis",  de João do Vale e Helena Gonzaga, que fala da precariedade e do abandono das ferrovias nos anos de "rodoviarismo" de Juscelino Kubitschek, e  "Xingu, O Pássaro Guerreiro", samba-enredo da Tradição no desfile de 1985.

— A ditadura estava terminando e a questão indígena estava muito forte. O samba conversa com esse momento da luta indígena na Constituinte, fala da luta do indígena pela terra. É também uma música muito atual, que tem a ver com a discussão do marco temporal — afirma.

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Das canções mais recentes, Simas destaca o samba-enrendo da Mangueira em 2019, "História para ninar gente grande", que propõe uma discussão sobre as narrativas a respeito da História do Brasil e questiona a "História oficial", que consagrou a abolição da escravidão a partir da figura da Princesa Isabel.

O evento mais recente retratado na lista de Simas é o confisco das poupanças durante o governo Fernando Collor, no início da década de 1990, com "Não é Conselho", de Bezerra da Silva. Para o professor, o tempo dirá quais canções, no futuro, serão usadas para contar a história do Brasil contemporâneo.

— Certamente já deve ter gente produzindo coisas sobre a pandemia. O tempo que vai dizer o que ficará para história. Não tenho dúvida que a música vai continuar sendo uma ferramenta importante para pensar a História do Brasil — finaliza.