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Após protesto no Grammy Latino, Mon Laferte conta detalhes do premiado disco ‘Norma’

Com boleros 'futuristas', cantora e compositora chilena é a artista de seu país mais ouvida mundialmente no Spotify
A cantora chilena Mon Laferte Foto: Divulgação
A cantora chilena Mon Laferte Foto: Divulgação

Na quinta-feira da semana passada, no tapete vermelho, antes da cerimônia de entrega do Grammy Latino, em Las Vegas, os holofotes se voltaram para a cantora chilena Mon Laferte, de 36 anos. Seu peito desnudo trazia a inscrição “no Chile, torturam, estupram e matam”. O protesto reforçou as recentes manifestações populares no país contra a desigualdade social, mas, de certa forma, eclipsou os feitos da artista. Nome da música chilena mais ouvido mundialmente no Spotify, Mon saiu da noite com um Grammy de melhor álbum de música alternativa por “Norma” (2018). O disco, de cúmbias, boleros e salsa, a levou a excursionar este ano, com bastante sucesso, pelos EUA.

— Hoje, o idioma é cada vez menos importante na música, a tecnologia para traduzir as letras instantaneamente está cada vez mais à mão do público — diz Mon ao GLOBO, por telefone, em sua primeira entrevista ao Brasil. — Adoraria cantar em outras línguas, mas a minha é o espanhol, e é muito bom estar nesses tempos em que é possível se conectar com o mundo, não importa de que país você venha.

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“Norma” é o álbum mais pessoal de Mon Laferte (que nasceu em Viña del Mar e foi batizada de Norma Monserrat Bustamante Laferte), com canções que falam sobre vários estágios do amor em estilos musicais latinos que seus avós costumavam ouvir.

— Talvez eu tenha feito assim porque sou igual a uma avó! — graceja. — Gosto de bolero, cúmbia, salsa. São estilos muito ricos para um intérprete. “Norma” foi algo que fiz por causa de uma inquietação, para me divertir criando música, para trabalhar com algo que vem dos anos 1940 mas soa atual ou mesmo futurista.

A cantora chilena Mon Laferte mostra os seios com a mensagem "No Chile, torturam, estupram e matam", no tapete vermelho da festa do Grammy Latino, em Las Vegas, nos Estados Unidos. Foto: BRIDGET BENNETT / AFP
A cantora chilena Mon Laferte mostra os seios com a mensagem "No Chile, torturam, estupram e matam", no tapete vermelho da festa do Grammy Latino, em Las Vegas, nos Estados Unidos. Foto: BRIDGET BENNETT / AFP

A produção de “Norma” (que chegou ao primeiro lugar de álbuns latinos nas paradas americanas) ficou a cargo do portorriquenho Omar Rodriguez-López, guitarrista dos grupos americanos de pós-hardcore At The Drive-In e The Mars Volta.

— A conexão é importante, e temos química. Além de ser guitarrista dessas bandas, Omar produziu discos de salsa portorriquenha. Era justamente de quem eu precisava: alguém que conhecesse a música tropical, mas que tivesse uma linguagem muito distinta e ampla — diz a cantora, que gravou o disco em Los Angeles, no legendário estúdio A da Capitol (por onde passaram Frank Sinatra e Nat King Cole), com todos os músicos na sala, ao vivo e sem retoques. — Foi elétrico, produzimos muita adrenalina e energia naquela gravação. Tudo girou em torno da performance, não havia recursos para afinar minha voz.

Renascimento

Depois de percorrer EUA e Europa com “Norma”, Mon partiu para outra. Nas músicas que ela soltou este ano, a pegada é bem mais contemporânea e pop que antes. Basta conferir “Chilango blues”, “Canción de mierda”, “Paisaje japonés” e a mais recente, o reggaeton de protesto “Plata ta tá”, que tem os versos “esta geração tem a revolução / com o celular, ela tem mais poder que Donald Trump”.

— Sempre gosto de compor canções que reflitam meu momento. Coincidentemente, eu havia voltado à guitarra elétrica, e ela me levou para um outro lado, o do blues — conta. — Quero fazer agora um álbum conceitual, mas ainda faltam canções.

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Em 2019, Mon Laferte completa dez anos de um renascimento, que se deu quando venceu um câncer na tireoide. Para marcar o acontecido, adotou o nome artístico atual. No começo da carreira, quando cantou em bares e no reality “Rojo”, ela assinava Monserrat Bustamante.

— Isso é algo que você enfrenta simbolicamente, mudando de país ( desde 2007 ela mora no México ), trabalho, ou parceiro. É uma nova vida, e me sinto muito feliz — festeja ela, que passou a cobrir o corpo de tatuagens na nova fase.

Apesar de todo o sucesso internacional, o Brasil ainda continua distante das possibilidades atuais da cantora, que lista Chico Buarque, João Gilberto, Caetano Veloso e Maria Rita entre suas predileções de artistas da música popular brasileira. Mas ela avisa:

— Vou aí quando quiserem!