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Bala Desejo: conheça um supergrupo da música carioca nascido na pandemia

Formado por Lucas Nunes (braço direito de Caetano Veloso em seu novo disco), Zé Ibarra, Dora Morelenbaum e Julia Mestre, quarteto entra por 2022 lançando o álbum 'Sim, sim, sim' e se apresentando no Coala Festival
O grupo Bala Desejo, com Zé Ibarra (à esquerda), Julia Mestre, Dora Morelenbaum e Lucas Nunes Foto: Divulgação
O grupo Bala Desejo, com Zé Ibarra (à esquerda), Julia Mestre, Dora Morelenbaum e Lucas Nunes Foto: Divulgação

Ironicamente, graças a um festival paulistano – o Coala, que acontece nos dias 17 e 18 de setembro de 2022, no Memorial da América Latina – foi que surgiu um supergrupo da nova música carioca. Formado por Zé Ibarra (24 anos) e Lucas Nunes (26), da banda Dônica , mais Dora Morelenbaum e Julia Mestre (ambas de 25), o Bala Desejo começou durante a pandemia como uma comunidade hippie em Copacabana, viu a notoriedade crescer nas lives da cantora Teresa Cristina e ganhou força com o convite para a edição (cancelada) do Coala em 2021. Patrocinado pelo festival, o quarteto aproveitou o recesso para gravar um álbum: “Sim, sim, sim”, que sai em 2022.

— Já acompanhava o trabalho de cada um individualmente e sabia que eram amigos — conta Gabriel Andrade, sócio-fundador e curador do Coala e o grande entusiasta do investimento em uma banda que, a rigor, ainda nem existia. — Durante a pandemia, comecei a vê-los tocando juntos vez ou outra, no Instagram, e aquilo sempre me impressionava. O grupo estava pronto, só faltava um empurrãozinho. Daí, veio a ideia de convidá-los para o Coala.

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Afinadíssimos, seja nos corais ou nas intervenções solo, os quatro construíram canções libertárias, com sabor de MPB dos anos 1970 (mas como sonoridade atual) como o frevo “Recarnaval” (“era dia de folia e a gente não se via / era dia de maldade e a gente na saudade”), o samba “Dourado dourado”, o pop à la Rita Lee “Lambe lambe”, o soul “Muito só”, o reggae “Clama floresta” e a latina “Pasariña” (“sou uma passarinha / e quero voar / se tenho as minhas asinhas / não corta”). Parece até que já se conheciam há um bom tempo – o que não está longe da verdade.

—  A gente é amigo da forma mais natural possível, todo mundo estudou na mesma escola e daí cada um tinha começado os seus projetos musicais. Eu e Zé com a Dônica, Julia compondo as músicas dela, Dora com um grupo vocal... todo mundo já conhecia a Teresa Cristina, então acabamos entrando na live dela — conta Lucas Nunes, que foi o braço direito de Caetano Veloso na produção de seu mais recente álbum, “Meu coco” , cujo show ele também vai dirigir.

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Segundo Julia Mestre, foi na época das lives de Teresa que eles começaram a ser chamados de Comunidade Hippie. O que tem ver com o fato de que, por volta de junho do ano passado, ela ter aproveitado que os pais tinham saído de casa para convidar o casal Lucas e Dora, o então namorado João Gil e Zé Ibarra para morarem com ela em Copacabana.

— Quando a gente viu, já estava levando som — conta Julia. — Principalmente na escada de incêndio, onde o Zé descobriu um reverb [ eco ] e contagiou todo mundo.

— E aí a gente montou um estúdio no quarto do pai da Julia, porque o Lucas e o Zé estavam terminando o disco da Dônica — segue Dora, filha do violoncelista Jaques e da cantora Paula Morelenbaum.

— Tinha uns cinco, seis anos que a gente estava fazendo esse álbum — admite Lucas Nunes, informando que o disco está, sim, pronto. — A Julia dizia que a gente tinha que fazer algo os quatro, mas eu e Zé estávamos cegos, focados nesse disco. E as lives da Teresa foram fundamentais, porque logo depois surgiu o Festival Coala que nos convidou para participar.

Repertório a oito mãos

Uma vez que eles se entenderam como grupo e a edição 2021 do Coala foi cancelada, os quatro partiram para a criação de um repertório a oito mãos.

— Metade das músicas eram ideias que já existiam e que os quatro finalizaram, metade nós levantamos do zero por causa do disco — conta Dora, que passou a ir com o grupo todo fim de mês para um sítio em Barbacena (MG) para acelerar o processo de composição.

— A gente viu a reponsabilidade bater na porta e foi para Barbacena para um processo inédito para mim de sentar, pegar o violão e inventar — conta Zé Ibarra. — Isso nos tirou do lugar onírico da inspiração e nos colocou no labor.

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Em cinco meses, eles compuseram todo o repertório de “Sim, sim, sim” e gravaram as bases revezando-se nos violões, pianos, teclados, em um estúdio em Santa Teresa, sob a supervisão de Gabriel Andrade, do Coala. Coproduzido pelo Bala Desejo com Ana Frango Elétrico, o disco contou com a participação de Alberto Continentino (baixo), Daniel Conceição (percussão) e Thomas Harres (bateria). E ali já tinham o nome do grupo, tirado de um verso de “Lambe lambe”.

— Muitas das composições vieram de brincadeira, de jogar na roda qualquer coisa que vinha na cabeça. Saíram umas besteiras que a gente lapidou e viu que eram interessantes — diz Dora Morelenbaum.

— Mas confabulamos muito sobre o que queríamos passar com esse disco, tentamos convergir num negócio novo, pelo qual nenhum de nós tivesse passado — completa Zé. — “Recarnaval” é a faixa que aponta para as necessidades estéticas e conceituais e a subjetividade do disco: temos que encarnar a vibe.

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O lançamento de “Sim, sim, sim” será feito sem singles. Primeiro, eles lançam as seis músicas do que seria o lado A do LP, e um mês depois, as outras seis do lado B. Mas o Bala Desejo não espera o Coala para botar a bloco na rua: no começo de 2022, estão programadas temporadas de shows no Rio (no Espaço Sérgio Porto) e em São Paulo. Vai ser um recarnaval aberto e improvisos.

— Queremos voltar com o burburinho, com a possibilidade de viver o universo do disco muitas e muitas vezes, e também com a farra do circo e a performance do teatro — espera Julia Mestre.