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Cultura Música

BNegão celebra, nos palcos e no vinil, os 15 anos de 'Enxugando gelo'

Reedição em LP duplo e turnê com Seletores de Frequência marcam aniversário do disco 'louco' que consolidou a carreira do rapper e o levou ao exterior
'É um disco muito louco, totalmente diferente do que havia até então no Brasil, ainda mais de um cara vindo do rap', diz BNegão, nos 15 anos do lançamento de 'Enxugando gelo' Foto: Gustavo Miranda / Agência O Globo
'É um disco muito louco, totalmente diferente do que havia até então no Brasil, ainda mais de um cara vindo do rap', diz BNegão, nos 15 anos do lançamento de 'Enxugando gelo' Foto: Gustavo Miranda / Agência O Globo

RIO - Ao referir-se a “Enxugando gelo”, seu álbum de estreia com a banda Seletores de Frequência, o rapper BNegão costuma usar o termo “imperecível”. Lançado em 2003, encartado no número 1 da revista “Outracoisa” (editada por Lobão), o disco levou um bom tempo até acontecer. Mas deu bases sólidas à carreira do carioca Bernardo Gomes, integrante dos grupos Planet Hemp e Funk Fuckers, e passou a ser reconhecido como um dos mais importantes lançamentos da música independente brasileira.

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— É um disco muito louco, totalmente diferente do que havia até então no Brasil, ainda mais de um cara vindo do rap — defende BNegão, que vai comemorar os 15 anos de “Enxugando gelo” com uma reedição em vinil duplo e uma série de shows ao lado dos Seletores (no Rio, eles se apresentam dia 13 de julho no Fabrika, no Itanhangá). — Não é um disco de rap, não é um disco de dub, é um disco de tudo junto: dub com jazz, rap, punk e grindcore.

Jogado na internet como se fosse uma mensagem na garrafa, o álbum passou em branco nos primeiros anos de Brasil — mas fez com que, entre 2004 e 2006, BNegão e os Seletores se apresentassem em casas importantes em Londres, Barcelona e Amsterdã, além de participarem do festival Roskilde, na Dinamarca. Em 2010, o disco seria responsável pela consagração da banda no festival SWU, em Itu — e só em 2012 eles lançariam seu segundo álbum, “Sintoniza lá”.

No começo dos anos 2000, cansado da “putaria total” que dominava as músicas da primeira encarnação dos Funk Fuckers, BNegão tinha resolvido privilegiar o lado da combatividade política e chegou a gravar duas músicas novas com o grupo: “(Funk) até o caroço” e “A verdadeira dança do patinho” (futuramente, dois hits de “Enxugando gelo”). Com o fim do FF, ele se juntou ao baixista do grupo Cabeça, Fábio Kalunga (que morreu em 2017), num novo projeto, mais variado musicalmente e com letras que iriam também “para os lados psicológico e espiritual”.

Dos Funk Fuckers, o rapper levou o guitarrista Gabriel Muzak e o trumpetista Pedrão Selector para compor o que se tornaria os Seletores de Frequência. Aos poucos, outros nomes do underground carioca colaram na dele: Paulão (vocal gutural do Gangrena Gasosa), DJ Rodrigues (do Speed Freaks) e Pedro Garcia (baterista do Cabeça, que acabou gravando e produzindo em sua casa, boa parte de “Enxugando gelo”).

— Todo mundo se juntou na camaradagem, eu não tinha dinheiro algum — recorda BNegão, que ainda faria uma faixa em São Paulo, o “Dorobô”, com o rapper Sabotage (assassinado poucos dias depois) e o então emergente coletivo de produtores Instituto.

Agora, os Seletores 2018 estão de volta com Rodrigues. “Nós o tiramos da aposentadoria, tipo pistoleiro velho”, brinca o rapper. E contam também com os originais Paulão e Pedrão, mais Robson Riva (bateria), Nobru Pederneiras (baixo, outro que veio do Cabeça), Ulisses Cappelletti (guitarra, ex-Squaws) e Marco Serragrande (trombone, da Abayomy Afrobeat Orquestra). Eles acompanham BNegão até o meio do ano que vem nos shows de 15 anos de “Enxugando gelo” e em um disco, a ser gravado, de clássicos do funk dos anos 1970. Depois, incentivados pelo próprio Bernardo, seguem carreira como banda instrumental. O rapper pretende que a parceria acabe “no auge”:

— Hoje em dia, quero fazer outros tipos de som que não se encaixam nem no instrumental nem nos gostos dos Seletores.

BNegão tem apresentado periodicamente um show só com músicas de Dorival Caymmi.

— Era um negócio que eu queria fazer há décadas, acho que vou levar esse show até a idade a que o Caymmi chegou ( ele morreu com 94 anos, em 2008 ). Mas não é isso que impede a existência dos Seletores — diz. — O que eu quero agora é me dedicar a um novo projeto, misturando eletrônica e percussão. Estou nessa com o Pedrão Selector, o DJ Castro, o ( produtor ) Maga Bo e o ( percussionista ) Sandro Lustosa. De repente, ainda vai entrar mais gente.