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Cultura Música

Crítica: Drake sufoca a concorrência com álbum duplo

Aos longo de 25 faixas, rapper canadense versa sobre o próprio umbigo, responde a ataques e fustiga oponentes
O rapper canadense Drake, em foto de 2017 Foto: AARON M. SPRECHER / AFP
O rapper canadense Drake, em foto de 2017 Foto: AARON M. SPRECHER / AFP

RIO - O canadense Drake chegou lá. É o rapper de maior sucesso da atualidade, tendo passado por cima de um antigo ídolo, hoje desafeto (Kanye West, que tentou uma volta por cima mês passado com os álbuns “ye” e “Kids see ghosts”), e acabado de bater um recorde no streaming : com seus 170 milhões de reproduções, “Scorpion”, o álbum que ele lançou na última sexta-feira, tornou-se o mais ouvido da história do Spotify num período de 24 horas. Versátil, bom versador e craque das melodias, Drake conhece bem o jogo do rap: há que ser rápido e sufocar os oponentes. Com 25 faixas divididas em dois discos, “Scorpion” tem um pouco de tudo para todos — o que não significa que seja bom.

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Aos 31 anos de idade e 12 de carreira, o astro sabe que o melhor tema no rap milionário é sempre o próprio umbigo. Em “Scorpion” há a dose básica de letras sobre como é dura a vida para quem tem dinheiro, muitas mulheres e desperta a inveja do mundo (em “Survival”, que abre o disco, ele fala dos que tentam derrubá-lo, dos que o descredenciam por não ser negro o suficiente). Drake se compara a Cristiano Ronaldo, põe-se lado a lado com Michael Jackson (“Don’t matter to me” tem um sample de gravação inédita do cantor, cedida por seu espólio, mas o resultado não é nada demais), fustiga rappers e responde a ataques. Um deles, em diferentes faixas.

No rap “The story of Adidon”, o MC Pusha T acusou Drake de esconder o filho ilegítimo que teve com a atriz pornô Sophie Brussaux — logo ele, que em algumas letras tinha criticado o próprio pai por ser negligente em sua criação. Em “Emotionless”, faixa com sample de música de Mariah Carey, o canadense põe tudo em pratos limpos: “Eu não estava escondendo meu filho do mundo, mas escondendo o mundo do meu filho”. Já em “March 14”, que fecha a coleção de canções, ele se detém mais extensamente no tema, citando Michael Jackson: “Ela não é minha amante, como Billie Jean, mas o filho é meu”.

Longe de ser um artista musicalmente inovador, Drake prefere investir naquilo que funciona, nos campos que domina. “God’s plan”, faixa lançada em janeiro, segue de perto as linhas do seu próprio hit “Hotline bling”. Em “Mob ties”, ele se aproxima do trap das novas gerações, mas o faz com cautela. Bem melhor, ele se sai em “8 out of 10” (que tem alfinetadas em Pusha T e Kanye West e mais referências ao filho) e “Sandra’s rose”, sobre a mãe, sua grande referência na vida: são canções mais voltadas para o r&b romântico, que vai render boas faixas no disco 2, como “Jaded” e “Finesse”.

No fim das contas, “Scorpion” deve manter as atenções voltadas para Drake pelos próximos meses. Mesmo que não tenha uma ou outra faixa sensacional no meio da encheção de linguiça (caso do igualmente desigual “ye” de Kanye West), o disco é bem mais uma maneira de Drake ter faixas para diferentes playlists do que uma obra em si, com um conceito. Agora, é esperar também pelas respostas dos rappers às picadas do escorpião.

Cotação: Regular