Música
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Por Silvio Essinger

Os números de Marlon Brandon Coelho Couto Silva impressionam: 1,5 bilhões de streams de suas músicas e 9 milhões de seguidores no Instagram. Faixas suas como “Vida louca”, “A cara do crime – nós incomoda” e “Me sinto abençoado” ocupam os primeiros lugares das paradas das plataformas e fazem dele o maior sucesso do trap — variante do rap abraçada pelas favelas, que hoje disputa com o sertanejo a liderança comercial na música brasileira. Mas o que faz do MC Poze do Rodo esse astro todo?

A resposta está em “O sábio”, primeiro álbum do MC nascido há 23 anos na comunidade do Rodo em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Lançada esta quinta-feira, a coleção de nove faixas inéditas tem um propósito bem claro: contar, em forma de ópera-trap (com videoclipes para cada uma das faixas — os das quatro primeiras já foram lançados, os das seguintes serão liberados, um a um, às terças-feiras) a história de sobrevivência de um menino que, pelas estatísticas, já estaria morto.

Em “Talvez”, a faixa de abertura do disco, Poze (que, em depoimento à polícia, teria admitido uma atuação como vapor do tráfico na adolescência) expõe de maneira poética e quase didática o cotidiano de um povo da favela que vive “sem fugir da guerra, mas querendo paz”, assolado todos os dias pelo espectro da violência policial e da morte.

Como nos outros clipes do disco (que aparentemente se conectarão numa espécie de filme), o dessa música conta com o aviso de que “todo material usado na produção desse videoclipe é cinematográfico e foi feito por profissionais”. A intenção do MC não é exatamente apavorar ou chocar — as imagens de armas e de drogas foram pixeladas —, mas a de apresentar o personagem Poze do Rodo, aquele cuja valiosa sabedoria foi conquistada ao se desviar das balas dos inimigos.

Capa de "O sábio", álbum do MC Poze do Rodo — Foto: Reprodução
Capa de "O sábio", álbum do MC Poze do Rodo — Foto: Reprodução

E cada faixa de “O sábio” (que ele apresenta este domingo no Trap Festival, ao lado de Orochi, Borges, Bielzin, Oruam e outras atrações, na quadra da Mocidade Independente de Padre Miguel, na Avenida Brasil, no Rio) é um capítulo diferente da história de Poze do Rodo. “Pesadão”, com Bielzin e Cabelinho, é a crônica do passado de crime e dos amigos que não chegaram à idade adulta, feita com versos velozes e cortantes e flow invejável.

Na boa e seca “Tô de pé”, com Major RD e Borges, Poze brinca com a riqueza que o sucesso trouxe (“dois Cartier no pulso, mano, eu nem sei ver as horas”) e desabafa (“hoje nós é mídia, chefe de família, isso é que incomoda, alemão passa mal”). Já em “Tropa de mantém” (com Raffé e Orochi), o MC segue o baile da autoafirmação feroz (“hoje em dia os menor quer ser igual ao Poze”).

Mais lenta que as outras, “Mundo covarde”, com Oruam, é outra boa faixa do álbum, aquela em que Poze do Rodo deixa aflorar sentimentos (“afilhado grande, tu nem tá aqui pra ver / quando eu me esbarro com a tua mãe a gente chora”) e traça seus melhores versos (“Deus tem seus planos, mas meu peito é que sofre”). Ela faz bom par com a faixa de encerramento, “Não vou falhar”, de tom religioso, em que o rapper vai da confissão (“já errei, mas só eu sei / tudo que eu passei, fui fora da lei”) à redenção (“os que me criticavam hoje pagam pra me ver”).

No mais, “O sábio” diverte com a sensual e meio latina “Ai Calica” (com Vulgo FK) e “Frio e calculista”, um improvável trap de tiração de onda em dueto com o astro do piseiro João Gomes. O disco atesta que Poze do Rodo de fato nasceu para brilhar, mas carrega um dos problemas típicos e mais graves do gênero: um alto grau de machismo (a única menção feminina positiva no disco inteiro é aquela à mãe do MC), o que fica como um ruído incômodo numa história exemplar, que Poze claramente direcionou para o grande público, num disco com produção de mainstream, que no entanto não apaga sua essência de artista das vielas.

Cotação: Bom

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