Música
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Por Mari Teixeira

Final da década de 1970. Jorge Aragão é levado até a sede do bloco carnavalesco Cacique de Ramos, na Zona Norte do Rio de Janeiro, e ali, aos 27 anos, se apaixona de vez pelo samba e começa a compor sucesso atrás de sucesso (“Foi ‘Coisinha do pai’, ‘Vou festejar’... tudo de uma vez”). São esses tempos, em que ele e nomes como Zeca Pagodinho, Moacyr Luz e Almir Guineto se juntavam no local para improvisar letras, que Jorge, aos 73, revisita no lançamento de “Grande duelo final (a saga)”.

A faixa, já disponível nas plataformas digitais, é a primeira do próximo EP, “O samba ainda é raiz”, e faz uma homenagem aos companheiros de composição e ao ato de compor. Inspirada num clima de faroeste, a música conta a história de um duelo de rimas, em que as armas são canetas, e as balas, versos trocados. “Moa, de boa, sacou primeiro e disparou/ Verso que voa, foi de raspão, mas acertou/ Zeca saltou feito atleta e esquentou mais o clima”, diz um trecho que faz referência a Moacyr Luz e a Zeca Pagodinho. Sambistas que já partiram também estão no enredo. Almir Guineto é retratado como o xerife, e Cláudio Camunguelo, Beto Sem Braço, Geraldo Babão e Deni de Lima aparecem como caubóis.

Jorge Aragão se coloca como possível perdedor diante dos colegas:

— Nunca fui bom de versar — admite o compositor, contando que às vezes demora até um ano para escrever uma música.

Dos improvisos no Cacique saíram gravações como “Mole que nem manteiga”, interpretada por Beth Carvalho.

— Como as pessoas brincavam umas com as outras ali isso ficou muito dentro desses pagodes — lembra o cantor e compositor, que soma mais de 20 álbuns e participou da fundação do grupo Fundo de Quintal.

‘Velha novidade’

Lá se vão mais de 40 anos desde que Jorge Aragão pisou no samba pela primeira vez e que teve seu primeiro hit, “Malandro”, lançado e eternizado na voz de Elza Soares. E, mesmo todo esse tempo depois, difícil é encontrar roda de samba que não cante as músicas dele:

— Sabe o que eu me considero? A velha novidade. Não sei explicar. Fiz para um pessoal mais cascudo e, de repente, vejo jovens cantando. Fico sorrindo por dentro.

Aos 73 anos, diz que continua porque sente que tem espaço. Este ano, por exemplo, cantou no Rock in Rio ao lado do trio Gilsons:

— Eu tinha preocupação de cantar em lugares assim, tinha medo de o público não entender, mas começaram a me chamar e pensei que talvez estivessem enxergando algo que eu não estava.

Ele confessa que também já se sentiu inseguro em outros momentos, principalmente com relação às letras. Existe um porquê para essa hesitação. Jorge foi por um caminho diferente do que se fazia na época em que começou, gostava de criar histórias mais subjetivas, não queria colocar a mulher como traidora ou culpada pelo fracasso de um homem, o que era comum. Dava para falar de traição ou de um relacionamento proibido sem expor nenhum dos lados, como fez em “Lucidez” (“Nosso caso não pode vazar/É tão bom se querer/ Sem saber como vai terminar”).

— Eu adoro deixar uma letra inteira dúbia, fiz pensando em uma coisa, mas sei que quem está escutando pode estar pensando em outra, diferente. Não tenho obrigação de ser totalmente claro nas letras — diz ele, que, para isso, investe nas metáforas.

Como um exemplo, ele cita “Eu e você sempre” (“Aí foi que o barraco desabou/ Nessa que meu barco se perdeu”), escrita em 2000 para um Exaltasamba que dava seus primeiros passos. É que, além de metáforas, Jorge está sempre atento aos novos talentos.

— Gosto de ficar em casa, mas vou para a internet saber quem é a garotada que está cantando. Não compactuo com essa história de que tem só os sambistas antigos. Hoje, as pessoas têm uma outra forma de se comunicar através do samba — diz Jorge, que além de cantar foi um dos compositores mais tocados em vários palcos do Rock in Rio.

Desde 2020, o cantor e compositor decidiu olhar a vida com outros olhos, como ele diz, em “estado de êxtase”. Isso aconteceu depois de ficar mais de duas semanas internado na UTI em consequência da Covid-19. Jorge faz parte do grupo de risco, tem diabetes e 26 stents no coração.

— Não achei que fosse viver. Quando saí (do hospital), tudo ganhou outro significado. Até beber um copo d’água não é a mesma coisa de antes — ressalta.

Bamba digital

A paixão pelas pequenas coisas e pela música ele divide com a tecnologia. Jorge tem fascínio pelas novidades do mundo digital. Trouxe para o Brasil o primeiro iPhone, dirige um carro elétrico e seu perfil no Instagram, com mais de 600 mil seguidores, era gerenciado por ele mesmo, que tirava as fotos, filmava e editava tudo:

— Já fiz reunião sobre metaverso. Passo o tempo que for para entender o que está acontecendo e tenho um monte de olheiro que me avisa dos lançamentos. As pessoas já me mandam até o link. Fico doidão (risos).

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