Música
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Por Silvio Essinger — Rio de Janeiro

Com roupas coloridas e cabelos longos, queimado de praia, em boa forma física e cercado de jovens, o carioca Marcos Valle desmistifica os 80 anos — aos quais chegará, e em plena atividade, em 14 de setembro. Várias são as celebrações previstas em 2023 — shows no Brasil (um deles o do aniversário, com convidados), turnês pela Europa e pelos Estados Unidos, documentário de Charles Gavin, álbum de inéditas para o selo inglês Far Out (com letras de Céu, Joyce, Moreno e o irmão Paulo Sérgio) e, quem sabe ainda, a gravação de suas composições recentes com Nando Reis (“tomara que dê, são músicas muito fortes”).

— Preciso do novo, gosto do novo. O que eu já fiz está ali, tudo bem, mas quero sempre um parceiro novo, um disco novo, uma viagem nova... Isso é o que mexe comigo — diz Marcos, que este ano, como se fosse pouco, completa ainda 60 anos de carreira, 50 do seu disco divisor de águas (“Previsão do tempo”), 40 do sucesso tardio de “Estrelar” e 30 desde que a sua música foi descoberta pela juventude inglesa do acid jazz e voltou às pistas de dança e abriu caminho para turnês pelo mundo inteiro (que costumam ocupar cinco meses de seu ano).

Parceiros de todas as idades

Hoje em dia, Marcos Valle conta com parceiros de todas as idades. Alguns até mais velhos que ele, como João Donato e Roberto Menescal. Outros, bem mais jovens, como Leoni, Henrique Portugal (tecladista do Skank), Marcelo D2, Emicida (no hit “Pequenas alegrias da vida adulta”), Liniker e até o grupo Jovem Dionisio (com quem fez “Melhor do mundo”, lançada ano passado). Do grupo Glue Trip, também em 2022, ele ganhou a música “Marcos Valle” — que muito o envaideceu, apesar da letra brincalhona. E ainda não faltaram colaborações com o inglês Tom Misch e o americano Adrian Younge (do projeto Jazz is Dead).

Colega de adolescência de Dori Caymmi e Edu Lobo (que também completam 80 este ano) no Rio do começo dos anos 1960, Marcos teve suas primeiras músicas gravadas pelo Tamba Trio e pelos Cariocas quando mal tinha completado 19 anos. E foi chamado por Milton Miranda, executivo da gravadora Odeon, para apresentar suas composições.

— Quando acabei de tocar minhas seis músicas, ele disse: “Ninguém vai gravar música tua aqui não. Você é que vai gravar!” — conta ele, que iria gravar o LP de estreia, “Samba demais”, com arranjos de Tom Jobim, mas, como o maestro demorou, Milton Miranda passou a tarefa para um garoto da idade do cantor, Eumir Deodato. — A gente pensava da mesma maneira harmonicamente. As ideias que começaram a surgir eram maravilhosas.

Depois de ele gravar o LP, num dia em que pegava onda num daqueles velhos pranchões de surfe no Arpoador, veio para Marcos a melodia da bossa “Samba de verão”, que seu irmão (e parceiro mais constante) Paulo Sérgio prontamente letrou. Os Catedráticos, grupo de Eumir, lançaram a música numa versão instrumental, que estourou no Brasil.

O cantor e compositor Marcos Valle, em 1965 — Foto: Arquivo/Agência o Globo
O cantor e compositor Marcos Valle, em 1965 — Foto: Arquivo/Agência o Globo

Outra gravação instrumental, do organista Walter Wanderley, ganhou os EUA logo depois. E aí Norman Gimbel pôs nela uma letra em inglês (“So nice”), que abriu para Marcos o caminho das gravadoras americanas (e até sondagens de Hollywood) que o levaram, aos 21 anos, a morar naquele país.

— Mas eu não consegui ficar lá, talvez por ser muito garoto ainda. Disse que queria voltar para o Brasil — conta ele, que também chegou a ser procurado pelo recrutamento para ir lutar no Vietnã e voltou ao Brasil em 1968. — Eumir me mostrou um cara para quem estava fazendo arranjos, o Milton Nascimento. Adorei as músicas dele. E aí veio a melodia de “Viola enluarada”. Quando toquei essa música no Rio, entre os músicos, foi sucesso.

Retomado o contrato com a Odeon, Marcos faria LPs cultuados, como “Mustang cor de sangue” (1969), Garra” (1971) e “Previsão do tempo” (1973), seu disco de ruptura, gravado com o grupo Azymuth.

— Começou a aparecer esse meu lado muito do groove, do balanço... Um dos primeiros instrumentos que eu toquei foi bateria, gostava muito das batidas de carnaval — conta ele, que pôs nesse disco algumas de suas músicas mais políticas, como “Flamengo até morrer” e “Mentira” (que, segundo ele, tinha uma letra mais extensa, censurada). — “Mentira” era o governo, era o que estava sendo falado. Tanto que acabei saindo do país de novo em 1975, por causa da Censura. Eumir estava em Nova York e disse: “Vem pra cá!”

Mas Marcos ficou pouco na Big Apple (“comecei a procurar meu Rio de Janeiro na Califórnia”) e foi para Los Angeles, onde foi acolhido pela diva do jazz Sarah Vaughan (com quem fez um duo em “Something”, dos Beatles) e pelo grupo Chicago, cujo tecladista Robert Lamm o apresentou a Leon Ware, estrela do soul com músicas gravadas por Marvin Gaye e Michael Jackson. O brasileiro passou cinco anos em Los Angeles, e a abertura política o trouxe de volta ao Brasil, trazendo na mala uma composição com Leon que o americano não gravara:

— Nós fizemos uma fita demo com o pessoal da black music e ela ficou muito boa. O Max (Pierre, produtor) sugeriu que eu fizesse uns arranjos com o Lincoln Olivetti. Nos entendemos muito bem, e regravamos aquela base tal qual ela tinha sido feita, só acrescentamos os metais do Lincoln. Mas não saía a letra e a música.

O cantor e compositor Marcos Valle, em 1983 — Foto: José Vasco
O cantor e compositor Marcos Valle, em 1983 — Foto: José Vasco

Marcos foi então para o estúdio com o arranjador e o irmão Paulo Sérgio, e aí eles botaram o som a mil para “entender o que a música estava dizendo”.

— Aí que veio a ideia de energia, de exercícios... Eu fazia ginástica na época e falei “tem que correr!” e a música saiu. “Estrelar” pegou uma outra geração, e teve gente que passou a me conhecer ali. Havia também um público que estava acostumado com a minha música e que se chocou. Só que aos poucos as coisas foram se ajustando — diz ele, que terá o LP da música relançado este ano pela Três Selos. — “Estrelar” é uma música da alegria, não só da ginástica. Estava acabando de ditadura e eu pensava: “Agos para o sol, vamos nos alegrar!” Mas nunca pensei que ela fosse atravessar décadas.

O sucesso na Inglaterra, no começo dos anos 1990, de antigas faixas suas, como “Os grilos”, o levou ao selo Far Out (pelo qual, há 25 anos, lançou seu primeiro álbum inglês, “Nova bossa nova”) e ao circuito internacional dos festivais de música. Que até hoje ele percorre ao lado da quinta (“e definitiva”) mulher, a cantora Patrícia Alví. Tudo isso, movido por sorte, alegria, musculação, caminhadas aceleradas no calçadão do Recreio — mas pouco glúten ou álcool.

Uma vida em datas redondas

Para um artista que chega aos 80 anos beneficiado tanto pelos cuidados com a saúde quanto pela sorte, Marcos Valle acumula feitos que (coincidentemente ou não) se repetem em intervalos regulares de 10, 20 ou 30 anos — e que serão festejados em 2023.

1943

Nasce, em 14 de setembro, no Rio de Janeiro, Marcos Kostenbader Valle. Um menino que, aos 6 anos de idade, começou a estudar piano clássico, vindo a se formar pelo Conservatório Haydeé Lázaro Brandt. Depois, estudou acordeão e violão. Aos 12 anos, Marcos encontraria nas carteiras do colégio Santo Inácio aqueles que viriam a ser os seus primeiros comparsas na música, Dori Caymmi e Edu Lobo.

1963

Aos 19 anos, já fazendo música com o irmão letrista, Paulo Sérgio, Marcos Valle teve a canção “Sonho de Maria” gravada pelo Tamba Trio. O seu nome correu de boca em boca e ainda naquele ano ele gravou o LP “Samba demais”, registrando “Sonho”, “Amor de nada”, “Razão do amor”, “Tudo de você” (todas feitas com o irmão) e outras como “Vivo sonhando” (Tom Jobim) e “Ilusão à toa" (Johnny Alf).

1973

Capa do LP "Previsão do tempo" (1973), de Marcos Valle — Foto: Reprodução
Capa do LP "Previsão do tempo" (1973), de Marcos Valle — Foto: Reprodução

Encantado com o som elétrico do grupo Azymuth, com quem trabalhara na gravação da trilha composta por ele para o filme “O fabuloso Fittipaldi”, Marcos resolveu experimentar a banda no seu LP de carreira daquele ano, “Previsão do tempo”. Os músicos apimentaram a mistura de samba, rock, funk, soul e jazz preparada pelo cantor, em canções como “Mentira”, “Os ossos do barão” e “Flamengo até morrer”. Cheio de suingue (da dupla de baixo e bateria de Alex Malheiros e Mamão), com os órgãos Hammond de Marcos e o sintetizador ARP de José Roberto Bertrami, o disco teve suas músicas cultuadas por músicos no Brasil e no exterior.

1983

De volta ao Brasil depois de cinco anos em Los Angeles, trabalhando com a nata do soul e do jazz, Marcos Valle preparava seu segundo LP para a gravadora Som Livre. Era a época em que uma nova turma do rock começava a dar as cartas nas paradas, mas ele tinha seu trunfo: uma base de balanço irresistível feita com o americano Leon Ware. Com letra do irmão, inspirada na onda da malhação, e arranjos de metais de Lincoln Olivetti, nasceu então “Estrelar”, um clássico da dance music made in Brazil.

1993

Marcos Valle batalhava pela sobrevivência como compositor de faixas para Roberto Carlos quando a cantora Joyce avisou que suas velhas músicas estavam fazendo sucesso nas pistas de dança da Inglaterra. E tudo mudou mais uma vez para ele.

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