Música
PUBLICIDADE

Por Silvio Essinger — Rio de Janeiro

É o próprio Alceu Valença quem diz: “Fazer uma história comigo é muito difícil!” Quem conseguiu levar a cabo a complicada tarefa foi o jornalista Julio Moura, 54 anos, assessor de imprensa do artista desde 2009. Ele acaba de lançar “Pelas ruas que andei — Uma biografia de Alceu Valença” (Cepe Editora), que terá noites de autógrafos em Recife (dia 27, no Paço do Frevo), Rio de Janeiro (25 de julho, na Livraria da Travessa do Leblon) e São Paulo (27 de julho, no Itaú Cultural). Segundo Alceu — que ainda está começando a ler o livro —, não havia ninguém mais indicado do que Julio para escrever sua biografia.

— Eu não quis me meter, ele sabe tudo — assegura o cantor de 76 anos, um dos mais populares de toda a MPB. — Julio participou um filme que eu dirigi, chamado “A luneta do tempo”, e, para isso, viajou pra minha terra, São Bento do Una. Ele conheceu parentes meus, veio para a Fazenda Riachão, viu o Cine Rex da minha infância, que foi derrubado e virou um supermercado... Ele conhece os meus amigos todos de Olinda, todos os meus amigos do Recife. E como viaja sempre com a gente, e eu sou um contador de causos, ele sabia de cor vários desses causos. Não gravei nada, o Julio tem uma memória do caralho e tudo foi acontecendo naturalmente. Antes de fazer o livro, ele já conhecia a minha biografia.

Autor de “Por trás da luneta” (2015), um diário das filmagens de “A luneta do tempo”, que Alceu escreveu e dirigiu, Julio Moura iniciou o projeto da biografia em 2019. Além da memória, do acesso privilegiado à intimidade do artista (ou seja, “às coisas que ele contou como amigo”) e de conversas informais com figuras fundamentais para a história (como o cantor e compositor Sérgio Ricardo, morto em 2020, que chamou Alceu para estrelar o filme “A noite do espantalho”), Julio contou com um acervo de fotos e recortes de jornais e revistas, organizada por Adelma, mãe do cantor (“eu não guardo nada, tudo que saía, eu lia e mandava para ela”, diz Alceu), que morreu em 2018, aos 104 anos.

Na pandemia, Julio aproveitou para ir aprofundando-se ainda mais no universo de Alceu. De forma alguma, logo avisa, ele queria fazer “um livro de memórias”.

— Queria ter algum tipo de distanciamento. E isso foi possível quando eu fiquei enfurnado em casa, na imersão total, sem ver o Alceu, sem viajar com ele. E aí me chamou atenção a quantidade de entrevistas grandes contundentes e expressivas que ele concedeu desde o início dos anos 1970. Pela primeira vez eu tive acesso a várias delas e, durante o processo da escrita, vi que eu poderia fazer também uma espécie de tributo ao jornalismo cultural. O livro passa muito pelo diálogo do Alceu com a imprensa, daí ser mais uma obra de pesquisa que de entrevistas.

Capa do livro "Pelas ruas que andei: uma biografia de Alceu Valença", de Julio Moura — Foto: Reprodução
Capa do livro "Pelas ruas que andei: uma biografia de Alceu Valença", de Julio Moura — Foto: Reprodução

Julio Moura admite ter feito “uma biografia autorizada”, mas assegura que o relato “tem momentos em que ele se incomoda, histórias que ele não gostaria de revisitar” — como a de quando Alceu recebeu críticas, em 1990, por apoiar Joaquim Francisco, candidato do PFL do governo de Pernambuco.

— A questão é que eu não suportava a ditadura militar, mas nunca na minha vida eu tive partido, sempre fui muito questionador. Eu estava com todo mundo no momento das Diretas, andei por Ulysses Guimarães, por Brizola, fiz campanha para mil pessoas, só que depois eu resolvi deixar que a democracia seguisse em frente (sem mim). Claro que eu tenho as minhas posições e voto em quem eu quiser, mas eu não fico militando por partido — explica o cantor.

Mesmo tendo convivido intensamente com Alceu por muitos anos, ainda assim Julio Moura se viu na situação de ter que procurá-lo durante a pandemia, por telefone, para esclarecer eventuais incongruências nos relatos.

— Alceu sempre renegou a sua própria presença na psicodelia pernambucana, dizia que já estava no Rio quando tudo aconteceu, que não tinha nada ver com aquilo, que aquilo era rock... — conta Julio. —Mas encontrei registros, por exemplo, de que ele cantava “Georgia, a carniceira” (música do Ave Sangria, o grande grupo psicodélico pernambucano) no show “O ovo e a galinha”. Contei isso e ele me disse: “Nunca cantei , está errado!” E eu: “Está bom.” Só que não estava. Dois dias depois ele fala: “Rapaz, sabe que eu acho que cantei ‘Georgia, a carniceira’? (risos)”

Das páginas de “Pelas ruas que andei” emerge uma das figuras mais singulares da MPB. Com um som que Luiz Gonzaga certa vez definiu como “uma banda de pífanos elétrica”, o irreverente Alceu Valença conquistou público de todas as idades, no Brasil e no exterior. E conseguiu elogios até do temido crítico musical José Ramos Tinhorão: “Embora sujeito às ilusões da modernidade pelo rock, que é a doença infantil de todos os seus contemporâneos de descida para o Sul, Alceu Valença conseguiu ser o único a não deixar suas perspectivas de ascensão abafarem inteiramente suas características regionais”.

— Eu primei pela música popular brasileira. É uma questão minha muito natural. Eu não ia ser cantor, mas tinha na gaveta da minha memória a minha relação com a feira de São Bento do Una, e com meu vovô Orestes que tocava viola e violão e era cordelista — discorre o artista. — Eu venho da cultura do sertão profundo, por isso é que eu faço baião, xote e xaxado.

Mudança após infarto

O cantor Alceu Valença, no Rock in Rio de 2022 — Foto: Brenno Carvalho
O cantor Alceu Valença, no Rock in Rio de 2022 — Foto: Brenno Carvalho

Aos 76 anos, Alceu Valença é um homem em paz. Com cinco pontes de safena desde o infarto que sofreu em 1999, o artista hoje esbanja saúde: não bebe, não fuma, alimenta-se moderadamente e não passa dia sem dar a sua caminhada de 10 mil passos. Só assim para encarar uma agenda que, no passado, foi de 110 shows. É tanto trabalho que ele até se vê no futuro sendo auxiliado pela inteligência artificial.

— O computador pode pegar uma coisa de cada música do Alceu, fazer uma análise e depois criar algo igual, com o meu timbre em uma voz artificial. Mas evidentemente tem que ter uma legislação para saber que ele está me copiando! — reivindica Alceu.

‘Pelas ruas que andei’

Autor: Julio Moura. Editora: Cepe. Páginas: 590. Preço: R$ 70.

Mais recente Próxima Conheça DJ Anna, a brasileira que fez parceria com Depeche Mode
Mais do Globo

Um dos envolvidos já havia sido preso e confessou ter entrado em uma briga com as vítimas

Chacina da sinuca: o que se sabe sobre briga após campeonato em Sergipe que terminou com seis mortos, um preso e dois foragidos

Num deles, Alexandre de Moraes é sugerido como sendo 'advogado do PCC'

Eleições SP: campanha digital de Nunes lança série de vídeos de ataques a Marçal

A decisão é da 4ª Câmara de Direito Privado do TJ do Rio

Vendedora ambulante será indenizada após ser abordada com violência no Metrô do Rio

Como francês Stephan Dunoyer de Segonzac deu pontapé inicial do esporte no país ao decolar dos pés do Cristo Redentor, em setembro de 1974

'Homem-pipa': O voo que inaugurou a asa-delta no Brasil, há 50 anos

Neurocirurgião Jacinto Lay sofreu queda em março do ano passado, quando pilotava sozinho uma aeronave de pequeno porte

Estado de saúde de médico que pilotava avião que caiu em Teresina é grave; piloto já tinha caído outra vez

BepiColombo, uma missão conjunta europeia e japonesa, concluiu seu último sobrevoo por Mercúrio, enviando uma prévia do planeta cheio de crateras que começará a orbitar em 2026

Novas imagens mostram a superfície de Mercúrio como nunca vista antes;  veja com detalhes nítidos

Supremo Tribunal Federal reservou três semanas para ouvir 85 testemunhas de defesa de cinco réus, sendo que algumas são as mesmas, como os delegados Giniton Lages e Daniel Rosa, que investigaram o caso

Caso Marielle: audiência da ação penal contra irmãos Brazão e Rivaldo Barbosa será retomada hoje pelo STF

A decisão do candidato da oposição de deixar a Venezuela por temer pela sua vida e pela da sua família ocorreu depois de ter sido processado pelo Ministério Público por cinco crimes relacionados com a sua função eleitoral

Saiba como foi a fuga de Edmundo González, candidato de oposição da Venezuela ameaçado por Nicolás Maduro

Cidade contabiliza 21 casos desde 2022; prefeitura destaca cuidados necessários

Mpox em Niterói: secretária de Saúde diz que doença está sob controle